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Guias e Dicas
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Análise sociológica da música popular de Manaus, Provas de Música

Este documento dá voz a músicos de manaus, evidenciando suas impressões sobre os significados da música produzida na cidade e analisando suas obras a partir das letras das músicas e da relação entre arte, identidade e mercantilização da música. Além disso, explora as origens da música manauense e sua relação com a música ocidental e indígena.

O que você vai aprender

  • Como a música popular de Manaus expressa as significações sociais?
  • Como a música manauense se relaciona com a música ocidental e indígena?
  • Quais são as impressões dos músicos de Manaus sobre os significados da música produzida na cidade?
  • Quais são os riscos e benefícios de participar do estudo sobre a música popular de Manaus?

Tipologia: Provas

2022

Compartilhado em 07/11/2022

Salome_di_Bahia
Salome_di_Bahia 🇧🇷

4.5

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO AMAZONAS
INSTITUTO DE FILOSOFIA CIÊNCIAS HUMANAS E SOCIAIS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO SOCIEDADE E CULTURA NA AMAZÔNIA
UMA INTERPRETAÇÃO SOCIOLÓGICA DA MÚSICA MANAUENSE
FABIANO SANTOS DE SOUZA
MANAUS
2018
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UNIVERSIDADE FEDERAL DO AMAZONAS

INSTITUTO DE FILOSOFIA CIÊNCIAS HUMANAS E SOCIAIS

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO SOCIEDADE E CULTURA NA AMAZÔNIA

UMA INTERPRETAÇÃO SOCIOLÓGICA DA MÚSICA MANAUENSE

FABIANO SANTOS DE SOUZA

MANAUS

FABIANO SANTOS DE SOUZA

UMA INTERPRETAÇÃO SOCIOLÓGICA DA MÚSICA MANAUENSE

ORIENTADORA: MARILENE CORRÊA DA SILVA FREITAS

MANAUS

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Sociedade e Cultura na Amazônia da Universidade Federal do Amazonas, como exigência parcial para a obtenção de título de Mestre. Área de Concentração: Processos Socioculturais na Amazônia. Linha de pesquisa: Redes, Processos e Formas de Conhecimentos. Orientadora: Profª. Dra. Marilene Corrêia da Silva Freitas.

FABIANO SANTOS DE SOUZA

UMA INTERPRETAÇÃO SOCIOLÓGICA DA MÚSICA MANAUENSE

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Sociedade e Cultura na Amazônia da Universidade Federal do Amazonas como exigência parcial para a obtenção de título de Mestre. Área de Concentração: Processos Socioculturais na Amazônia. Linha de pesquisa: Redes, Processos e Formas de Conhecimentos. Orientadora: Marilene Corrêia da Silva Freitas. Aprovado em: 12 / 09 / 18 BANCA EXAMINADORA: ________________________________________________ Dra. Marilene Corrêa da Silva Freitas Presidente da Banca ________________________________________________ Dr. Marcelo Bastos Seráfico de Assis Carvalho Membro da Banca _________________________________________________ Dr. Odenei de Souza Ribeiro Membro da Banca

Dedico este trabalho à minha querida avó Francisca Maria (In memorian) por todo amor incondicional durante sua vida. A meus pais, Iracema e Antônio por todo o amor e dedicação na minha criação, e a minha amada Juliane, por me amar em todos os momentos.

Aos meus colegas da turma de mestrado 2016, por ser a melhor turma de todos os tempos, por dividir o conhecimento e os sonhos, por apoiar e se alegrar com as vitórias. Foi um prazer imenso compartilhar o conhecimento com vocês. Aos amigos e amigas, que ao longo da caminhada se tornaram igualmente importantes, Gabriela, Samira, Lettícia, Nadinny, Hélio, Alzanira, João Alexandre, Daniela, Júnior, André, Ítalo, Jéssica, Pâmela e Manu pela força de sempre, pelas conversas nos corredores da Ufam, por momentos familiares e muitos felizes. Obrigado. Aos professores e professoras que dividem essa profissão que amo tanto e sempre me incentivaram, Pedro Paulo, Everton, Ednilda, Daniela, Ana Paula, Rosália, Ivanete, Monik, Clícia, Natasha, Jerusa, Zé Carlos, Jaqueline e Laura. Obrigado pelo apoio. As minhas queridas alunas Thalita, Lauanny, Alexandra da escola Antogildo Pascoal Viana e Isabele Gabrielly, Alice, Ângela Clara, Vanessa, Larissa Castro da escola CMPM 3 por me terem como referência, dividir as dores do dia-a-dia, e com isso sempre me incentivar a melhorar como profissional e como pessoa. Obrigado. Aos meus professores Dr. Marcelo Seráfico, Dr. Odenei Souza, Dr. Sérgio Ivan Braga, Dra. Rosemara Staub, Dra. Heloísa Helena da Silva, Dr. Raimundo Nonato da Silva, Dr. Marco Aurélio Paiva, por transmitirem seus conhecimentos de forma tão comprometida e corroborarem com meus conhecimentos. Obrigado. Aos músicos amigos que colaboram com esse trabalho, Clóvis Rodrigues, Nicolas Júnior, Cileno Conceição, Filipe Correia, Agenor Vasconcelos, Elias Farias, Eliberto Silva, e todos que por dividiram um pouco de suas vidas e sua arte, muito obrigado. A todas e todos que colaboraram direta ou indiretamente para a construção desse trabalho, é possível que me furtei em alguns nomes, mas gostaria de agradecer com todo meu coração. Obrigado a todos e todas! Esse trabalho é de todos nós!

RESUMO

A música sempre acompanhou o desenvolvimento da humanidade desde tempos imemoriáveis, e seu sentido foi se modificando ao longo do tempo. Por muito foi utilizada com sentido restritamente religioso, ao passar dos séculos muda para o sentido de entretenimento das elites, sendo profissionalizada e recebendo valorações das culturas a qual estava inserida. No que se refere ao contexto amazônico, a música acompanha todas as transformações culturais e sociais das sociedades que compõem o território conhecido como Amazônia, carregando todas as suas particularidades. O presente trabalho busca compreender os sentidos e significados da música produzida na cidade de Manaus, na perspectiva da construção do conhecimento em torno dos fenômenos sociais locais expressos através da música como o modo de vida caboclo, a relação com a natureza e suas peculiaridades, considerando também a produção cultural frente ao mercado. Para isso utilizaremos um apanhado teórico para compreender a música como fenômeno social e como expressão desses fenômenos, entrevistas com os músicos produtores da música na cidade de Manaus, e como essa música pode ser utilizada intelectualmente para a construção de um pensamento social em relação a Amazônia, caracterizando uma pesquisa de cunho qualitativo exploratório. Os resultados obtidos nos levam a perceber que a música manauense possui múltiplos sentidos e significados, dentre estes salientamos a expressão cultural local, a relação de identidade com os elementos do modo de vida evidenciados nas canções e as relações mercadológicas, todavia, a música produzida na cidade de Manaus, por ser expressões de fenômenos sociais específicos, podem ser consideradas criações intelectuais que corroboram com entendimento do pensamento social na Amazônia. Palavras-Chave: Música, Amazônia, Fenômenos sociais, Pensamento Social.

SUMÁRIO

  • INTRODUÇÃO...............................................................................................
  • UMA ANÁLISE SOCIOLÓGICA DA MÚSICA.............................................. SEÇÃO I
  • 1.1 A sacralidade da música amazonense
  • 1.2 A música a partir de Max Weber
  • 1.3 Aspectos da música manauense
  • O SENTIDOS E SIGNIFICADOS DA MÚSICA MANAUENSE..................... SEÇÃO II
  • 2.1 A construção da música urbana de Manaus
  • 2.2 A música na percepção dos músicos
  • 2.3 As relações mercadológicas da música
  • A MUSICA E O PENSAMENTO SOCIAL..................................................... SEÇÃO III
  • 3.1 A canção e o pensamento social da Amazônia
  • 3.2 Considerações finais
  • REFERÊNCIAS..............................................................................................
  • APÊNDICES...................................................................................................
  • ANEXOS

10 INTRODUÇÃO A música sempre exerceu fascínio sobre a humanidade desde tempos imemoriáveis. Inicialmente possuía a função de ambientar uma proximidade com o divino e de adoração, seja em qualquer forma de culto para qualquer deus que já tenha sido reverenciado. Ao longo do tempo acompanhou os avanços da humanidade, de sacra se tornou clássica, em vários momentos profana, e hoje, além de todos esses sentidos, está ligada ao entretenimento nas sociedades ocidentais. O poder da arte em transportar o apreciador por diversas dimensões se faz muito presente na música, esta tem o poder de embalar as vitórias e alegrias e de sonorizar os sentimentos mais íntimos como a solidão e sentimentalidades oriundas de relacionamentos. Todavia, a música também pode expressar temporalidades e fenômenos sociais diversos. A partir dos processos de racionalização que se intensificaram nas sociedades modernas capitalistas, a música adota um sentido técnico profissional, passando a incorporar sistemas de notação, execução, aliadas ao desenvolvimento de instrumentos mais elaborados, com sonoridades diversas e que atendem a um mercado de consumo. A ciência também passou a perceber a música como objeto para compreender os mais variados problemas e auxiliar na compreensão de diversos fenômenos sendo utilizada pela Sociologia, Psicologia, História, Antropologia, Estudos técnicos da Arte dentre outros. Neste sentido, o presente estudo tem como objetivo compreender os sentidos e significados dos fenômenos sociais contidos na música manauense. Para atingir essa finalidade realizamos entrevistas com de músicos profissionais, que são representantes da produção musical na cidade de Manaus, em excursões de campo nos eventos musicais da cidade, além de literaturas especializadas que corroboraram para a interpretação da música como fenômeno social e como pensamento social. A pesquisa teve como metodologia uma abordagem qualitativa, sendo esta bibliográfica e de campo, tipificada como observacional transversal dividida em três momentos: O estudo bibliográfico da música como fenômeno sociológico; O trabalho de campo realizando as entrevistas e o cenário musical em Manaus; E a síntese das análises obtidas para estabelecer a dinâmica adotada na composição da música em

12 SEÇÃO I

1. UMA ANÁLISE SOCIOLÓGICA DA MÚSICA A música é um sistema de comunicação através da organização de sons e posteriormente de estruturas e símbolos dotados de significados objetivos e subjetivos, que agem proporcionando diversas experiências e efeitos, onde somente uma abordagem que considere múltiplas perspectivas poderá compreendê-la com totalidade. Desde a antes da antiguidade a música tem permeado as formas de expressão da humanidade. Os primeiros contatos segundo a paleontologia surgem na pré- história, ou seja, caminha lado a lado com a humanidade. Aproximadamente em 5. a.C. é que surgem formas musicais mais sofisticadas. Segundo Candé “os testemunhos mais antigos de civilizações musicais refinadas remontam a mais de seis mil anos e temos razão de pensar que as origens da música são mais remotas” (CANDÉ, 2001, p. 21). Em todas as sociedades e em todas as épocas a música é uma das manifestações do pensamento e da cultura humana. Essas manifestações possuem significados distintos que se modificam conforme as relações sociais se transformam ao longo da história. A música surge então como uma manifestação coletiva de culto as divindades. Na sacralidade é baseia-se os sentidos significados de sons e instrumentos criados em uma infinidade de sociedades e crenças. Em determinadas sociedades, a exemplo das sociedades indígenas do Alto Rio Negro, a cosmologia desses povos está intrinsecamente ligada aos sons desenvolvidos pelos índios nos rituais. Nesse contexto, o caráter individual da música não existia, todos os ouvintes participavam da construção da mesma, sem existir a figura de um compositor. Com o desenvolvimento dos grupos sociais, das culturas e das relações sociais mais complexas, consequentemente a música também adotou uma vasta complexidade nos seus sentidos e significados, sendo empregada em diversas dimensões da vida. Todavia, nas sociedades mais remotas não se tem conhecimento de sistemas de notação musical. O primeiro sistema musical foi criado pelos gregos. O matemático Pitágoras estabeleceu um sistema polifônico de baseado em sete notas musicais, sistema que é utilizado até os dias atuais.

13 “... nenhum sistema pode ter sido de uso corrente na Antiguidade. Músicos lendo só aparecem na icnografia no início do século XV de nossa era, quando, na civilização ocidental, a notação se tornou prática indispensável. ” (CANDRÉ, 2001, p. 23). Esse processo de transformação cultural com o emprego de uma linguagem típica musical surge apenas no século XI, através de monges que estudavam música para empregá-la nos cultos cristãos. Nesse período a música ainda possuía um sentido restritamente sagrado. A disseminação da cultura musical aconteceu de maneira lenta, apenas no século XV as partituras musicais eram utilizadas pelos músicos. A necessidade da incorporação de um sistema de escrita musical que pressupõe uma inteligibilidade é segundo Weber um “traço específico da modernidade”. Para ele são os reflexos de um processo de racionalização da cultura ocidental. A partir das transformações sofridas pelas sociedades ocidentais ao longo do tempo, das mudanças características das sociedades modernas capitalistas, a cultura, como todas as esferas da dimensão da vida humana, é impactada pelo processo de racionalização. Ao sentido sagrado são atribuídas outras subjetividades, e com o desenvolvimento social a música passa a adotar o sentido artístico, político, econômico, possuindo múltiplos sentidos e significados. O desenvolvimento das relações hierárquicas e de poder dentro dos grupos sociais foi refletida na música ao longo do tempo. Porém é sabido que durante a antiguidade clássica a música foi resinificada como expressão da arte, rompendo com o sentido meramente religioso que lhe era atribuída. É no apogeu da civilização grega que os estudos musicais são incorporados a formação educacional dos filhos da aristocracia helênica. “A música deixa de ser um privilégio; ela se torna indispensável a educação de todo homem livre, é a fonte da sabedoria” (CANDÉ, 2001, p. 71). A partir da idade média, a música estava ligada a erudição da sociedade, principalmente nas sociedades de cortes típicas na Europa até o século XIX. Nesse contexto os músicos eram praticamente artesãos serviçais dos nobres aristocratas. Segundo Elias, que é um seguidor da escola weberiana “os músicos eram tão indispensáveis nestes grandes palácios quanto os pasteleiros, os cozinheiros e os criados, e normalmente tinham o mesmo status na hierarquia da corte. ” (ELIAS, 1995, p. 18). Apesar de viverem nas cortes, possuírem uma educação e cultura cortesã,

15 um expoente da cultura das elites do Rio de Janeiro. A partir da Bossa Nova a Música Popular Brasileira (MPB) se consolida no jovem no mercado fonográfico nacional, ganhando visibilidade mundial. Apesar do contexto diferenciado, a Bossa Nova se compara a música erudita do século XVIII quando esta é uma forma de representação de uma classe aristocrática, criando uma cultura musical erudita e elitista em relação a diversos outros estilos produzidos no Brasil, apesar da mistura de vários elementos musicais. Desta forma estabeleceu-se no Brasil uma elite musical que, apesar de pertencer ao mesmo grupo da música popular brasileira, era visto como erudita, como uma música intelectualizada destinada aos deleites da aristocracia e que por sua vez até reproduzia as diversas relações sociais da establishment nacional. Entendemos essa necessidade dos músicos brasileiros da Bossa Nova, como reflexo das sociedades de corte como Elias coloca: “... eram obrigadas, por sua posição inferior, a adotar os padrões cortesãos de comportamento e de sentimento, não apenas no gosto musical, mas no vestuário e em toda a sua caracterização enquanto pessoas. Em nossos dias, tal necessidade de adaptar-se às demandas do establishment , seguindo a distribuição de poder, é mais ou menos dada como óbvia pelas pessoas socialmente dependentes. ” (ELIAS, 1995, p. 20). Diversos outros estilos musicais eram vistos pela sociedade e de certa forma pela elite musical como inferiores. Esses estilos possuíam uma abordagem musical regional, sendo estigmatizadas por atingirem um público pertencente às camadas mais pobres da população. Esses gostos das grandes massas possuíam a conotação de música brega, vulgar, que eram executadas e difundidas nas regiões mais afastadas dos centros urbanos ou em espaços marcados pela pobreza nas periferias das grandes cidades. Essa relação na música popular brasileira indica uma espécie relação de estabelecidos e outsiders, onde percebemos as divisões de classe entre os músicos, com a constituição de uma elite musical estabelecida e outros músicos sendo estigmatizados. O fator determinante não é o talento, as técnicas musicais, mas a questão da regionalidade, condições econômicas e sociais. A sociologia da música surge então como um campo para estudar a música como um fenômeno social. Não buscaremos produzir um trabalho em torno do objeto música como eixo central, considerando tecnicidades musicais, ou estruturas de formação da música, pouco se considerará uma estratificação social da música. Este

16 trabalho concentra-se em compreender a música num sentido amplo e abstrato, de como esta incorpora elementos provenientes das transformações das sociedades ocidentais em um contexto especifico. Essa tendência por sinal já é adotada por diversos estudiosos das relações como o sociólogo brasileiro José de Souza Martins que propõe uma “sociologia de relações sociais que têm a música como instrumento de mediação ou como resultado” (MARTINS, 1975), porém considera fatores que são incorporados pela música como religiosidade, estética e economia. Dada à diversidade de fatores, os estudos que possuem por objeto a música, podem adotar uma vertente interdisciplinar, como a que nós propusemos, todavia, partimos de uma abordagem específica, com metodologia específica, sendo que a interdisciplinaridade se caracteriza como uma postura do pesquisador em relação às análises do seu objeto, não propondo um método específico. A música por estar ligada a abstração, sendo permeada por vários fatores, naturalmente pressupõe uma abordagem que considere suas múltiplas representações, práticas e valores, dentro de uma temporalidade. Existe uma série de impasses ao tomar a música como objeto, dada a sua subjetividade. Nesse sentido, concentramos nossos esforços em compreender os fenômenos sociais que corroboram com a formação da sociedade a qual os indivíduos estão inseridos, nesse contexto, a sociedade manauense. É um debruçar-se a entender a fatores do comportamento humanos vivendo em sociedade, através da manifestação musical. Adorno observa as complicações metodológicas para a construção de uma sociologia da música, em consonância do que fora citado anteriormente, que para um método eficaz, deve-se concentrar-se na compreensão da humanidade e suas complexidades através da música, e não simplesmente da música em si. Adorno explica: A dificuldade de apreender cientificamente o conteúdo subjetivo da experiência musical, para além dos índices intrínsecos, é quase proibitiva. O experimento pode atingir os graus de intensidade da reação, mas dificilmente os de qualidade. Os efeitos literais, fisiológicos e mensuráveis que uma música exerce – abriu-se mão, inclusive, das acelerações da pulsação – não são, em absoluto, idênticos à experiência estética de uma obra de arte considerada como tal. A introspecção musical é extremamente incerta. A verbalização do vivido musical depara-se, para a maioria dos seres humanos, como obstáculos intransponíveis, na medida em que não se dispõe da termologia técnica; além disso, a expressão verbal já se acha pré-filtrada, sendo que, para as reações primárias, seu valor cognitivo é duplamente questionável. Por isso, no que diz respeito à constituição específica do objeto a partir do qual podemos apreender uma atitude, a diferenciação da

18 Weber alerta que podem ser percebidas diversos tipos de racionalização, em diversas esferas da vida, e que estas racionalizações se apresentam através de uma grande diversidade. Ao analisarmos a valoração adotada nas composições dos artistas atuantes na cidade de Manaus, utilizamos o conceito de racionalização como uma organização sistemática e técnica da cultura, que sofre influência de diversos processos históricos, dentre eles o desenvolvimento da cidade de Manaus na esfera econômica e a necessidade da cultura local expressar uma identidade, que dialogue com o meio a qual está inserido, além da participação em um mercado audiovisual que se consolida. Weber busca de forma singular “o conhecimento da realidade concreta segundo o seu significado cultural” (WEBER, 2001). 1.1 A SACRALIDADE DA MÚSICA AMAZONENSE A música se constitui nas sociedades através do sentido religioso, a partir da utilização de melodias nos rituais, que expressavam ligação com deuses, levavam a uma interação com as divindades e induziam aos estados de transe. Ainda hoje, a música possui uma função significativa nos cultos religiosos de todas as ordens. Para Weber as ações sociais dos sujeitos no que se refere aos seus sentidos e significados, isso inclui a cultura, a partir da modernidade são orientadas pelo processo de racionalização. Todavia, anterior ao processo de racionalização, as ações possuem significados coletivos. Dentro de determinadas comunidades, é esse caráter coletivo que lhe atribui sentido. Cleber Sanches em seu estudo sobre a formação da cultura brasileira e sua relação com a formação da sociedade diz: Nos primeiros contatos entre portugueses e índios, nos idos de 1500, ou quem sabe antes, já foram percebidas a existência de uma musicalidade muito forte entre os nativos e a terra – o ser humano é prenhe de arte, mas nessa dimensão, a do ser artista, só é alcançada entre os seres urbanos. Os índios pareciam conhecer música. Pareciam não! Conheciam! Obviamente que não a música europeia na sua complexidade e erudição, mas a expressão de seus sentimentos traduzidos por cânticos improvisados em saudação a um visitante ou estrangeiro, pelo compasso de pés batendo no chão e de movimentos de corpos ornados com sementes que, a cada movimento, produzem sons que se vão misturando com suas vozes e com a vibração de seus rústicos instrumentos criando um clima musical contagiante. (SANCHES, 2009, p. 123-124). No que diz respeito à formação musical amazonense, está sofre bastante influência da tradição dos povos indígenas nativos do território que viria a se tornar o

19 estado do Amazonas. Segundo Weber, os cantos e repertórios indígenas são uma ação social tradicional, que estabelecem relações sociais de comunalização, haja vista o sentido subjetivo para os pertencentes à comunidade e também estabelece uma relação social de socialização, pois apresenta motivações racional (no que refere a valores) motivados da mesma maneira, nesse caso, a significação atribuída a música no universo cosmológico dos povos indígenas. Para os povos tradicionais do Amazonas, adotaremos como parâmetro de análise as pesquisas referentes àqueles pertencentes à região conhecida como Alto Rio Negro, sua cosmologia possui uma íntima relação com a música. Essa relação está baseada na associação entre os mitos, os ritos e as práticas musicais, que os povos indígenas daquela região denominam com diferentes nomes, porém que possuem o mesmo sentido, classificados em cantos individuais de caráter xamânico e os cantos coletivos, acompanhados os não de instrumentos próprios e sagrados, executados pelos homens da comunidade, sendo a participação feminina delimitada em determinados momentos. “Os mitos de criação e transformação da humanidade apontam para uma necessidade constante em busca da condição de humanidade. Este processo de construção de pessoa representa o pilar sobre o qual estão assentadas as relações de sociabilidade representadas pelos ritos, em cujo bojo estão os repertórios musicais”. (BARROS, 2010, p. 07). A música possui raízes profundas com o sagrado, essa característica não se apresenta apenas nos povos tradicionais, mas em praticamente todas as sociedades humanas, principalmente as sociedades ocidentais, onde o cristianismo sacralizou a música durante toda a idade média. No contexto local, a música perpassa pela influência da sacralidade em várias temporalidades. Os festejos católicos típicos em todos os municípios do Estado datam do período de colonização, onde os sujeitos sempre utilizaram da música como uma forma de expressar sua fé. Durante o longo período da colonização, as missões religiosas intermediaram o contato entre as culturas índias e ocidentais. O estudo produzido por Vicente Salles em 1962 traz referências a padres jesuítas que ensinavam os índios a tocarem instrumentos ocidentais como a gaita e viola. Salles descreve: