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Experiências Privadas e a Corda em Seu Pescoço: Análise Postcolonial e Tradução, Notas de estudo de Tradução

Este texto explora as teorias e teóricos postcolonais, como said, spivak, tymoczko e bassnett, em relação à alteridade, subalternidade, tradução e outros temas. O texto apresenta a história de chika e a violência étnica e religiosa em um contexto de conflito, onde a comunicação e a tradução desempenham papéis cruciales. A texto questiona se a subalterno pode falar e destaca a invisibilidade do tradutor.

Tipologia: Notas de estudo

2022

Compartilhado em 07/11/2022

Sel_Brasileira
Sel_Brasileira 🇧🇷

4.7

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UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA
DEPARTAMENTO DE LÍNGUAS ESTRANGEIRAS E TRADUÇÃO LET
CURSO DE GRADUAÇÃO EM LETRAS TRADUÇÃO INGLÊS
HISLLA SUELLEN MOREIRA RAMALHO
TRADUÇÃO E ANÁLISE DE A PRIVATE EXPERIENCE E THE THING
AROUND YOUR NECK DE CHIMAMANDA NGOZI ADICHIE
Brasília DF
2017
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UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA

DEPARTAMENTO DE LÍNGUAS ESTRANGEIRAS E TRADUÇÃO – LET

CURSO DE GRADUAÇÃO EM LETRAS – TRADUÇÃO INGLÊS

HISLLA SUELLEN MOREIRA RAMALHO

TRADUÇÃO E ANÁLISE DE A PRIVATE EXPERIENCE E THE THING

AROUND YOUR NECK DE CHIMAMANDA NGOZI ADICHIE

Brasília – DF

HISLLA SUELLEN MOREIRA RAMALHO

TRADUÇÃO E ANÁLISE DE A PRIVATE EXPERIENCE E THE THING

AROUND YOUR NECK DE CHIMAMANDA NGOZI ADICHIE

Trabalho apresentado como requisito à obtenção de menção na disciplina Projeto Final do Curso de Letras

  • Tradução Inglês, sob orientação do Prof. Bruno Carlucci da Universidade de Brasília (UnB).

Brasília – DF

AGRADECIMENTOS

Agradeço primeiramente a Deus; sem Ele não poderia ter chegado aqui. Aos meus pais, João Ramalho e Eridan Moreira de Azevedo Ramalho, pelo amor, compreensão, paciência e apoio. A minha irmã, Hallana Moreira, pelos conselhos e chatices. À minha família, em geral, pelo amor e carinho. A todos os meus amigos queridos por compartilharem momentos tão inusitados. Aos meus professores, que me orientaram em cada disciplina e que tiveram paciência comigo. Ao meu orientador Bruno Carlucci, pelo auxílio. A todos que de qualquer forma me ajudaram, em algum momento, nessa caminhada.

Muito Obrigada! Hislla S. M. Ramalho

RESUMO

Este projeto tem como escopo a tradução e análise de dois contos do livro The Thing Around Neck de Chimamanda Ngozi Adichie que são A Private Experience e The Thing Around Your Neck de acordo com algumas teorias e teóricos dos estudos pós-coloniais e da tradução. Entre eles estão: Said com a temática da alteridade; Spivak com a da posição do subalterno e da mulher; Tymoczko com a da tradução de textos pós-coloniais; Bassnett com a da tradução, Benjamim com a da conservação da forma e outros. O foco real desta pesquisa é a tradução estrangeirizadora, conservadora de uma forma original, como forma de resistência, que também é uma característica dos textos pós-coloniais. Para além disso, este trabalho visa a saída de um foco eurocêntrico na academia e uma singela contribuição para os estudos da tradução.

Palavras- chave: Literatura Africana; Tradução; Estrangeirização.

SUMÁRIO

    1. Introdução ………………………………………………………………………………..
    1. Procedimentos Metodológicos ………………………………………………………….. - 2.1. A obra…………………………………………………………………………...... - 2.2. A autora e seu projeto de escritura……………………………………………….
    1. Referencial Teórico …………………………………………………………...……...… - 3.1. Análise de A Private Experience ……………………………………………….... - 3.2. A estrangeirização na tradução de A Private Experience ……………………....... - 3.3. Relatório e Justificativa de Tradução - A Private Experience ………………........ - 3.4. Análise de The Thing Around Your Neck ………………………………………... - 3.5. A tradução como criação e original…………………………………………........ - 3.6. Relatório e Justificativa de Tradução - The Thing Around Your Neck ………...…
        1. Considerações Finais ……………………………………………………………….....
        • Referências ……………………………………………...…………….……………....
        • Anexos ……....……………………………………………….………………………... - Anexo A 1º Versão de Tradução de A Private Experience ……………………….... - Anexo B 2º Versão de Tradução de A Private Experience …………...………..….. - Anexo C 1º Versão de Tradução de The Thing Around Your Neck ……………..…. - Anexo D 2º Versão de Tradução de The Thing Around Your Neck ……………..….

1. INTRODUÇÃO

Este trabalho diz respeito à tradução e análise de dois contos do livro “ The Thing Around Your Neck ” intitulados A Private Experience e The Thing Around Your Neck. Esses, trazem à tona (em seu original) o contexto linguístico e sociocultural nigeriano; em outras palavras, os usos do igbo juntamente com o inglês; as situações interacionais de assimilação e choque cultural entre um ou mais personagens; as críticas ao governo e ao sistema colonialista Ocidental. Ambos os contos tratam essencialmente da questão do deslocamento e das diferenças culturais, da situação de vulnerabilidade em que a mulher negra africana está em relação ao processo imigratório, a própria sociedade etc.

Apesar de hoje as literaturas africanas serem mais conhecidas pelo público brasileiro do que eram há algum tempo, ainda existe uma carência de produção de análise nesse campo. Por essa razão, considero importante a saída do foco literário eurocêntrico e a partida para outras perspectivas literárias ainda não tão pesquisadas no campo da tradução. A autora do livro, Chimamanda, é nigeriana e trabalha em suas obras várias questões sociais como a lógica colonialista, o feminismo, a religião, as classes sociais e as estruturas e instituições políticas e sociais em geral. Nos contos traduzidos a escrita original é marcada pela utilização do narrador onisciente, com mistura de tempo cronológico e psicológico; utilização de marcas de oralidade e marcas culturais do Igbo com Inglês e utilização de descrição detalhada de ambientes sendo notada a adjetivação constante de objetos, lugares e pessoas.

Estando estas características presentes na obra da autora, é essencial a conservação desses pontos ao se realizar a tradução, uma vez que esta pesquisa objetiva não só a preservação do original, mas também a oportunidade de apresentar literaturas africanas, que de certa forma fogem de um padrão eurocêntrico, a um público que precisa de outras perspectivas e de aumentar a produção acadêmica nessa área de estudos que se seguiram logo após a colonização.

2. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

O presente trabalho foi realizado a partir das seguintes etapas: seleção, tradução, análise e teorização dos contos escolhidos - A Private Experience e The Thing Around Your Neck. A seleção

mulher negra africana no processo de imigração, num contexto diferença cultural e étnica; é a descrição do sentimento preso no fundo do peito e do nó na garganta quando há um choque cultural que é sexista e racista e que causa danos na pessoa que o sofre.

2.2. A AUTORA E SEU PROJETO DE ESCRITURA

Chimamanda Ngozi Adichie nasceu em 15 de setembro de 1977 em Abba, na Nigéria. É uma escritora reconhecida e popular por escrever sobre temas polêmicos como por exemplo: diferenças culturais, religiosas, sociais e principalmente sobre a sua visão feminista que fomenta quase todas as suas narrativas. Adichie quebra a tradição, traz um discurso moderno com temáticas dicotômicas, além disso, escreve em inglês com usos do Igbo.

Seu primeiro romance, Purple Hibiscus ( Hibisco roxo) foi publicado em 2003 e fez muito sucesso sendo premiado como melhor Primeiro Livro em 2005. O segundo romance, Half of a Yellow Sun ( Meio sol amarelo ), foi assim intitulado em homenagem à bandeira do Biafra, foi publicado pela editora Knopf/Anchor em 2006 , e ganhou o Orange Prize para ficção em 2007. The Thing Around Your Neck foi o seu terceiro livro, sendo este uma coletânea de doze contos lançados pela Knopf/Anchor em 2009 e este ano foi publicado no Brasil.

Adichie possui uma forma de escrita e de construção gramatical bem estruturada e que põe em questão os preconceitos e estereótipos sobre a mulher negra africana, a imigrante, sobre as mulheres em geral. A escrita de dela é híbrida, crítica e, de certa forma, resistente. Nos contos escolhidos, ela utiliza traços de tempo cronológico juntamente com o psicológico. A descrição detalhista de situações, olhares, cores, climas e fatos, que muito provavelmente aconteceram com a própria autora, trazem certa consistência aos contos.

3. REFERENCIAL TEÓRICO

Antes do período colonial, a tradução era vista como uma atividade importante para a comunicação, para a difusão de obras, como por exemplo, a bíblia, e/ou como uma atividade etnocêntrica. Durante o período colonial, sabe-se, claramente, que as colônias eram vistas como

inferiores em relação aos seus colonizadores e assim também eram (e muitas vezes são ainda) consideradas as traduções em relação aos seus originais.

Os originais eram vistos como a “ fonte pura ” do texto, como a verdade sagrada e as suas traduções eram apenas réplicas que, por maiores e grandiosas que fossem, seriam apenas réplicas de um original. Essa noção de tradução colocava e ainda coloca um peso em vários tradutores ao realizarem um processo tradutório focado na fidelidade ao original. Devo confessar que, o mesmo ocorreu na realização deste trabalho, involuntariamente, inicialmente.

No período do processo de descolonização latino e africano que aconteceu de um a dois séculos atrás, essa idéia de tradução como sendo inferior ao original foi se tornando obsoleta, em uma visão mais moderna do mundo, nos campos científicos também tradutórios e outros mais. Cada tradução é única, é uma criação, uma vez que toma toda uma forma de um texto que já possui em si a intertextualidade e o reflexo de uma cultura exterior, e transpõe para uma língua e cultura diferentes, criando assim um novo texto transposto, tecido, traduzido.

Sendo assim, quando, neste trabalho, se propõe a tradução de contos nigerianos pode-se pensar na complexidade que há em traduzir contos pós-coloniais. Simplesmente, agora, The Empire Writes Back e a escrita pós-colonial já é e deve ser considerada em si uma tradução. De acordo com Tymoczko (1999), escritora, teórica de tradução e professora na Universidade de Massachusetts, escritores pós coloniais estão transpondo uma cultura para ser entendida como uma língua, um sistema cognitivo, uma literatura, uma cultura material, um sistema social e uma estrutura legal, uma história e assim por diante.

Essa escrita não deve ser considerada inferior ou menos relevante pela sua densidade e complexidade. Pelo contrário, essa escrita é legítima e reflete, como um espelho embaçado, uma realidade histórica, cultural etc. Segundo Ndongo (2013) que é escritor, jornalista e político da Guiné Equatorial, as literaturas africanas são legítimas mesmo essas sendo expressadas em línguas ocidentais; o idioma antes imposto agora é parte própria e autônoma dos africanos e por esta razão uma grande parte dos escritores negro-africanos não se consideram, de forma alguma, “ladrões” de línguas”. As línguas utilizadas na escrita da literatura são vivificadas e enriquecidas servindo como valorosos instrumentos de comunicação uma vez que carregam as emoções, as histórias, as culturas e as línguas africanas.

através da subjetivação de saberes e de poderes, nesse caso, da literatura, da cultura negra e africana. A partir desse conceito pode-se pensar e analisar o que é traduzido, como foi traduzido, as causas e efeitos da tradução, as posições tomadas pelo tradutor etc. A tradução envolve muito mais que língua, ela está mergulhada em sistemas políticos, culturais e históricos e é em si uma realidade histórica. Até os dias de hoje, ela é um meio de conter as realizações artísticas de escritores em outras línguas consideradas não relevantes, e de garantir a supremacia da cultura europeia dominante. De acordo com Tymoczko (1999, p.31) “Patrons determine the parameters of what is translated just as they determine parameters of what is published [...] Studies of translation are increasingly alert to the circumstances under which books are chosen for translation and translations are published …”

É importante saber então que apesar de Chimamanda poder representar uma literatura pós- colonial que possui certa resistência e logo barreiras de acesso ao leitor estrangeiro, ela não representa o todo em sua totalidade nem todas as vozes a serem ouvidas. Ela também faz parte de um cânone literário cuja raiz enfatiza estranhamente a hegemonia eurocêntrica. Felizmente, nos últimos anos o fluxo de obras de autores e autoras negros (as) e africanos (as) traduzidos e publicados no Brasil tem crescido, mas ainda não foi nem é suficiente para que haja enfim um equilíbrio de produções e uma saída de um foco ocidental. A escolha de traduzir

contos nigerianos diz respeito a utilização da tradução como criação e a conservação da forma como resistência e não como maneira de propagar o conceito do “Outro Exótico” que segundo Gentzler (2009 p. 218) “teve um impacto dramático não só sobre a compreensão por parte do Ocidente das chamadas culturas do” “Terceiro Mundo”, mas também sobre a compreensão que muitas nações emergentes teriam de suas próprias culturas” Ainda segundo ele, as relações de poder colonial se perpetuam e as estruturas sociais imperiais se verificam ainda no período pós-colonial. A tradução é uma atividade manipuladora e também serviu ( e ainda serve), ao longo da história, como instrumento de perpetuação e manutenção da hegemonia. De acordo com Bassnett e Trivedi em sua introdução no livro Post-Colonial Translation – Theory and Practice (Tradução Pós-Colonial – Teoria e Prática – tradução minha )

Translation does not happen in a vacuum, but in a continuum; it is not an isolated act, it is part of an ongoing process of intercultural transfer. Moreover, translation is a highly manipulative activity that involves all

kinds of stages in that process of transfer across linguistic and cultural boundaries. Translation is not an innocent, transparent activity but is highly charged with significance at every stage, it rarely, if ever, involves a relationship of equality between texts, authors or systems.(BASSNETT, TRIVEDI, 1999, p.2) Tendo a tradução como algo que atinge estruturas profundas sendo elas linguísticas ou culturais as manipulando de forma estrangeirizadora ou domesticadora, neste trabalho, busca-se não somente a tradução do sentido, mas a conservação de toda uma forma do texto original que resulta em uma nova criação. Segundo Benjamin o que é essencial na tradução não é a comunicação nem o enunciado. Ou seja, “…a tradução que pretendesse transmitir algo não poderia transmitir nada que não fosse comunicação, portanto, algo de inessencial.”( p.102, 2008). A tradução que preserva a forma do texto original e, que estrangeiriza é a mais coerente na tradução destes contos nigerianos de Adichie. Pois o projeto dela é de uma escrita híbrida e resistente (possui barreiras de acesso) onde o leitor consegue perceber um pouco da cultura nigeriana, entender a utilização do Igbo misturado ao inglês; sentir a insegurança, a agonia, a vulnerabilidade da mulher africana deslocada culturalmente por uma necessidade maior; resgatar, nos recessos de sua memória, lembranças, sensações e emoções que são despertadas apenas quando trata-se da própria pessoa, do indivíduo. De acordo com Sommer (1994) textos inflexíveis levantam questões, que são como “perguntas de acesso”, e que produzem um tipo de “incompetência” no leitor. E a resistência não é necessariamente um sinal de um impasse epistemológico, que em uma estratégia ético estética posiciona o leitor dentro de limites. A questão do texto não é o que os “críticos” ou os “leitores” podem saber e sim como essas posições se constroem sendo incomensuráveis e conflitivas.

3.1. ANÁLISE DE A PRIVATE EXPERIENCE

A Private Experience narra uma experiência privada que uma jovem cristã, Igbo e de classe social privilegiada tem com uma mulher muçulmana e pobre justamente quando uma revolta entre ambas religiões acontece e essa é a temática principal da trama. Na cidade de Kano, Nigéria, um homem cristão é decapitado depois de ter passado por cima do Alcorão sagrado. O enfoque do

conflitante, uma dicotomia que alimenta todo o enredo. Quando o motim está acontecendo se inicia uma experiência privada entre ambas mulheres e é exatamente nesta ocasião em que há o reconhecimento das diferenças e das similaridades dessas. No conto, os pensamentos de Chika sobre a mulher, sobre aquele ser estranho, são o do “ Eu ” e o “ Outro ” que são tão diferentes, e, ao mesmo tempo tão iguais.

Os tempos verbais no presente e no presente contínuo trazem um aspecto real à trama e fazem o leitor ser, de certa forma, construtor ativo e participante da história, ou seja, ter um olhar crítico sobre a corrente situação. A descrição e o detalhamento dos fatos também contribuem para tal. A utilização da repetição como mecanismo oral enfático das adjetivações são outra característica marcante e presente como por exemplo: big-big ou small-small. Outro fato crucial na narrativa, já citado, é o registro da língua utilizado quando a mulher fala, que no caso é uma marca identitária do inglês hauçá presente na Nigéria. Por exemplo: “ I am trader ” ao invés de “ I am a trader ” A reprodução proposital dessas marcas na tradução são e foram em si um duplo desafio.

A leitura desse conto tira o leitor da zona de conforto, pelo tempo verbal utilizado, pelo narrador onisciente, pela adjetivação, pela revolta, pelas diferenças e similaridades, sim. Todavia, gostaria de chamar atenção para o fato de a mulher muçulmana não ter nome, não ser de classe privilegiada, não utilizar registros padrões. A reprodução, no conto, desses estereótipos são um risco e por vezes soam um tanto racistas, por que a partir daí pode-se analisar o lugar de fala de uma mulher que não tem voz no conto. O narrador vai tratar de falar, mais detalhadamente, dos sentimentos e das sensações de Chika, que é um tanto arrogante e preconceituosa, do que dos da mulher.

Adichie usa esse mecanismo para criticar a sociedade e dizer que o outro lado não está sendo ouvido; ou ela está reforçando em certo nível um preconceito já existente em relação às muçulmanas? Por que Chika não tem a fala marcada e sim a mulher? Por que não uma inversão de papéis? De certa forma, a importância é dada a menina que é rica, jovem, colonizada, estuda medicina e tem um final concreto. A mulher passa pela trama como algo um tanto abstrato.

Uma das grandes questões dos contos vem de um questionamento complexo – Pode o subalterno falar? Segundo Spivak (1988) a mulher não é suficientemente representada nem representável, não tem uma voz e é utilizada como modo de exploração e capital. Se, num contexto pós-colonial e atual, o subalterno não tem história e não pode falar, a mulher está em uma sombra

ainda mais profunda. E justamente, acredita-se que, esse é o objetivo de Chimamanda, criticar uma sociedade que não ouve as suas minorias.

3.2. A ESTRANGEIRIZAÇÃO NA TRADUÇÃO DE A PRIVATE EXPERIENCE

Como já afirmado, a tradução envolve um processo de escolhas e estas essas colocam, de certa forma, o tradutor em uma situação de desconforto até o fim da prática tradutória. Um universo de possibilidades e criações é a tradução, sendo assim pode-se dizer que não existe uma linearidade em seu processo. Inicialmente, ao escolher as obras pensei em duas possibilidades de tradução: uma em que o texto fosse fluente na língua meta ao ponto de não haver um reconhecimento de que o texto traduzido fosse uma tradução; e outra em que o texto traduzido transparecesse que é uma tradução pelas estruturas, pelos estranhamentos presentes e pelos indicadores dessa transposição. Para Venuti (1995) que é um teórico da tradução e tradutor americano, o método domesticador é uma redução etnocêntrica do texto estrangeiro para os valores culturais da língua alvo, trazendo o autor de volta para casa, para sua língua; e a estrangeirização é um certo desvio dos valores da cultura padrão para outras, para registrar a diferença linguística e cultural do texto estrangeiro, enviando o leitor para o “exterior”. Observando essas vertentes, pude considerar que um texto pós-colonial que é em si resistente requer uma tradução coerente com seu propósito. Sendo assim, a estrangeirização, a preservação de uma forma que se deixa transparecer no texto traduzido foi proposta, aqui, reafirmando assim uma barreira de acesso no ato da leitura, uma resistência. Venuti diz I want to suggest that insofar as foreignizing translation seeks to restrain the ethnocentric violence of translation, it is highly desirable today, a strategic cultural intervention in the current state of world affairs, pitched against the hegemonic English-language nations and the unequal cultural exchanges in which they engage their global others. Foreignizing translation in English can be a form of resistance against ethnocentrism and racism, cultural narcissism and imperialism, in the interests of democratic geopolitical relations. (VENUTI 1995, p. 20)

indicação de que algo passado aconteceu anteriormente ao passado simples. No exemplo a seguir, a loja estava deserta antes das revoltas começarem. Observe:

“The store looks as if it was deserted long before the riots started;”

“A loja parece que estivera deserta muito antes que os motins começassem;”

Na primeira versão traduzi a palavra “ riot ” por “ motim ” porém, ao consultar o dicionário, pude observar que essa tem um significado um tanto político, o que não é o caso do conto que trata de uma manifestação coletiva não organizada; de uma grande agitação. Por essa razão, na segunda versão preferi a palavra “ revolta ” que traz um sentido mais literal em relação ao original; uma revolta entre cristãos e muçulmanos aconteceu por que um homem que “por acaso” era cristão passou em cima do Alcorão sagrado e em seguida foi decapitado. Outros desafios encontrados foram as adjetivações utilizadas pela autora na descrição dos elementos; essas são um tanto exacerbadas e trazem certa dificuldade de coerência e coesão porque é necessário conectá-las ao nome principal para não causar ambiguidade no leitor. Por exemplo:

the empty rows of wooden shelves are covered in yellow dust”

as fileiras vazias das prateleiras de madeira estão cobertas de poeira amarela

Decidi, como se pode observar acima, manter a sentença da mesma forma do original, porém traduzi a palavra wooden por de madeira em vez de amadeiradas. A utilização da primeira forma soa mais fluida e traz a impressão que as prateleiras eram totalmente de madeira e não apenas amadeiradas. Em outras adjetivações, não tive muitas opções a não ser tentar organizar uma estrutura em que o leitor conseguisse entender qual é o núcleo da adjetivação. No caso a seguir, troquei a ordem sintática da frase e a mulher é citada depois de relatadas as características de seu sotaque.

“woman’s strong Hausa accent o forte sotaque Hauçá da mulher

Gostaria, aqui, de chamar atenção para as adjetivações narradas, e que estão no pensamento de Chika, sobre as coisas e o jeito da mulher. Exótico, esquisito. Essas marcam um estereótipo um tanto inferior na mulher e distanciam ambas as mulheres de uma possível situação de “igualdade”. Observa-se claramente Chika e a Outra, o Outro exótico que serve como uma construção do Eu hegemônico. Observe:

The woman sighs and Chika imagines that she is thinking of her necklace , probably plastic beads threaded on a piece of string.

A mulher suspira e Chika imagina que ela está pensando no colar dela, provavelmente miçangas de plástico enfiadas num pedaço de corda. It hangs around the woman’s neck now, but it was probably wound loosely round her face before, covering her ears. A long flimsy pink and black scarf , with the garish prettiness of cheap things.

Está pendurado em volta do pescoço da mulher agora, mas, estava enrolado provavelmente em torno de sua face antes, de modo folgado , cobrindo as suas orelhas. Um comprido e leve lenço preto e rosa, com a beleza espalhafatosa das coisas baratas.

Esse é o relato inicial de Chika depois do contato de ambos universos diferentes (representados pelas mulheres) colocados juntos por uma revolta. Os adornos da mulher, o colar, o lenço e seu próprio rosto são marcados no conto como sendo diferentes. O primeiro é apenas miçangas de plástico enfiadas numa corda; o segundo possui a beleza espalhafatosa de coisas baratas e a face é fina; a mulher é do norte. É interessante também observar a utilização e a tradução da palavra “ scarf ” que é um marcador cultural e étnico da mulher e que para Chika é apenas um “lenço”. Numa tradução que procura seguir o projeto do original, traduzi “ scarf” por “ lenço ” porque a própria autora não considerou relevante dar o nome exato da vestimenta da mulher como Hijab ou até mesmo Burca. A marcação proposital da fala da mulher entra em contraposição com toda a narrativa quando o narrador onisciente relata que Chika não pode concordar ou discordar com a mulher quando essa afirma:

Them got going to small-small shop, only big-big shop and market .”

Pequena-pequena loja não, só grande- grande loja e mercado eles foi indo.

Chika não sabe nada sobre revoltas, infere-se que a mulher saiba, a única coisa que