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Revista Brasileira de História da Educação.
Tipologia: Notas de estudo
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Conselho Diretor Dermeval Saviani (UNICAMP ); Marta Maria Chagas de Carvalho (PUC-SP); Ana Waleska Pollo Campos Men- donça (PUC-Rio); Libânia Nacif Xavier (UFRJ).
Comissão Editorial José Gonçalves Gondra (UERJ); Marcos Cezar de Freitas (PUC-SP); Maria Lúcia Spedo Hilsdorf (USP); Maurilane de Sousa Biccas (USP). Secretaria – Maria Cristina Moreira da Silva
Conselho Consultivo Membros nacionais: Álvaro Albuquerque (U FAC); Ana Chrystina Venâncio Mignot (U ERJ); Ana Maria Casassanta Peixoto (SED- MG); Clarice Nunes (UFF e UNESA); Décio Gatti Jr. (UFU e Centro Universitário do Triângulo); Denice B. Catani (USP); Ester Buffa (UFSCAR); Gilberto Luiz Alves (UEMS); Jane Soares de Almeida (UNESP); José Silvério Baia Horta (UFRJ); Luciano Mendes de Faria Filho (UFMG); Lúcio Kreutz (U NISINOS ); Maria Arisnete Câmara de Moraes (UFRN); Maria de Lourdes de A. Fávero (UFRJ); Maria do Amparo Borges Ferro (UFPI); Maria Helena Camara Bastos (UFRGS); Maria Stephanou (UFRGS); Marta Maria de Araújo (UFRN); Paolo Nosella (UFSCAR).
Membros internacionais: Anne-Marie Chartier (França); António Nóvoa (Portu- gal); Antonio Viñao Frago (Espanha); Dario Ragazzini (Itália); David Hamilton (Suécia); Nicolás Cruz (Chile); Roberto Rodriguez (México); Rogério Fernandes (Por- tugal); Silvina Gvirtz (Argentina); Thérèse Hamel (Ca- nadá).
Revista Brasileira de História da Educação Publicação semestral da Sociedade Brasileira de História da Educação – SBHE
A Sociedade Brasileira de História da Educação (SBHE), fundada em 28 de setembro de 1999, é uma socieda- de civil sem fins lucrativos, pessoa jurídica de direito privado. Tem como objetivos congregar profissio- nais brasileiros que realizam atividades de pesquisa e/ ou docência em História da Educação e estimular es- tudos interdisciplinares, promovendo intercâmbios com entidades congêneres nacionais e internacionais e especialistas de áreas afins. É filiada à ISCHE (International Standing Conference for the History of Education), a Associação Internacional de História da Educação. Diretoria Nacional Presidente: Diana Gonçalves Vidal (USP) Vice-presidente: Luciano Mendes de Faria Filho (UFMG) Secretária: Libânia Xavier (UFRJ) Tesoureiro: Jorge Luiz da Cunha (UFSM) Diretores Regionais Norte: Titular: Maria das Graças Sá Peixoto Pinheiro (UFAM), Suplente: Andréa Lopes Dantas (UFAC) Nordeste: Titular: Ana Maria de Oliveira Galvão (UFPE) Suplente: Jorge Carvalho do Nascimento (UFSE) Centro-Oeste: Titular: Maria de Araújo Nepomuceno (UCG) Suplente: Regina Tereza Cestari de Oliveira (UFMS) Sudeste: Titular: José Carlos de Souza Araújo (UFU) Suplente: Rosa Fátima de Souza (UNESP ) Sul: Titular: Maria Elisabeth Blanck Miguel (PUC-PR) Suplente: Flávia Werle (UNISINOS ) Secretaria Centro de Memória da Educação Faculdade de Educação Universidade de São Paulo Av. da Universidade, 308 – Bloco B Terceira Fase – Sala 40 CEP 05508-900 – São Paulo-SP Tel.: (11) 3091- E-mail: cmemoria@fe.usp.br
Revista Sociedade Brasileira de História da Educação – SBHE
COMERCIALIZAÇÃO Editora Autores Associados Av. Albino J. B. de Oliveira, 901 CEP 13084-008 – Barão Geraldo Campinas (SP) Pabx/Fax: (19) 3289- e-mail : editora@autoresassociados.com.br www.autoresassociados.com.br
EDITORA AUTORES ASSOCIADOS LTDA. Uma editora educativa a serviço da cultura brasileira
Av. Albino J. B. de Oliveira, 901 Barão Geraldo – CEP 13084- Campinas-SP – Pabx/Fax: (19) 3289- e-mail : editora@autoresassociados.com.br Catálogo on-line : www.autoresassociados.com.br
Conselho Editorial “Prof. Casemiro dos Reis Filho” Bernardete A. Gatti Carlos Roberto Jamil Cury Dermeval Saviani Gilberta S. de M. Jannuzzi Maria Aparecida Motta Walter E. Garcia
Diretor Executivo Flávio Baldy dos Reis
Coordenadora Editorial Érica Bombardi
Assistente Editorial Aline Marques
Revisão Ademar Lopes Junior Fernando Ramos de Carvalho
Diagramação e Composição DPG Ltda.
Projeto Gráfico e Capa Érica Bombardi
Impressão e Acabamento Gráfica Paym
Revista Brasileira de História da Educação ISSN 1519- 1º NÚMERO – 2001 Editora Autores Associados – Campinas-SP
Sumário
EDITORIAL 7
ARTIGOS
Celebração e visibilidade: o Dia do Professor e as diferentes imagens da profissão docente no Brasil (1933-1963) 9 Paula Perin Vicentini
A lei da escola: sentidos da construção da escolaridade popular através de textos legislativos em Portugal e Santa Catarina – Brasil (1880-1920) 43 António Carlos Luz Correia e Vera Lucia Gaspar da Silva
Feios, sujos e malvados: os aprendizes marinheiros no Paraná oitocentista 85 Vera Regina Beltrão Marques e Sílvia Pandini
Entre a história cultural e a teoria literária: rumo a uma história dos cânones escolares no Brasil 105 Luiz Eduardo M. de Oliveira
Entre biografias e autobiografias pedagógicas: os diários de infância 125 Egle Becchi
A constituição dos saberes escolares e as representações de infância na Reforma Fernando de Azevedo de 1927 a 1930 159 Sônia Camara
DOSSIÊ: TEMPOS SOCIAIS, TEMPOS ESCOLARES
Apresentação 181 Maria Cristina Gouveia
El aula al exterior: el tiempo de las excursiones escolares en México, 1904-1908 183 Lucía Martínez Moctezuma
Editorial
A Revista Brasileira de História da Educação finaliza seu oitavo número, reafirmando-se como uma publicação consolidada e que tem ampliado de maneira significativa sua circulação dentro e fora do Brasil. É relevante destacar que o nosso investimento em assegurar a manu- tenção da periodicidade da revista tem sido amplamente correspondido pela nossa comunidade de pesquisadores de história da educação, que tem encaminhado de maneira contínua e sistemática artigos, propostas de traduções, e participado da organização de dossiês temáticos. Nosso de- sejo é que este engajamento e comprometimento com o nosso projeto de publicação continuem cada vez maiores, espelhando assim o amadureci- mento de um campo de conhecimento. A regularidade e a excelência do nosso periódico têm sido reconheci- das por toda a comunidade científica, repercutindo não apenas na avalia- ção A (nacional) do Qualis/C APES , como na concessão de recursos por agências financeiras. Este é o primeiro número de muitos, esperamos, que conta com apoio do CNPq. No sumário, comparecem seis artigos bastante significativos e insti- gantes – (um deles tradução) – e o dossiê “Tempos sociais, tempos esco- lares”, composto por textos de pesquisadores latino-americanos e brasileiros, trazendo uma importante contribuição ao abordar um mesmo tema com diferentes e variados aportes teóricos metodológicos. Acom- panham ainda esta edição uma resenha e uma nota de leitura. No sentido de continuarmos privilegiando a publicação de artigos tanto relacionados à memória da educação quanto à historiografia da edu- cação brasileira, reiteramos nosso convite para que continuem propondo traduções, reedição de textos do campo da história da educação, resenhas e notas de leitura.
Comissão Editorial
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Em 1933, a Associação dos Professores Católicos do Distrito Fede- ral (APC-DF) tomou a iniciativa de festejar, no Brasil, o Dia do Primei- ro Mestre em 15 de outubro, dando origem à comemoração do Dia do Professor que acabou por se consolidar como uma forma de dar visibili- dade à categoria. A data passou a ocupar um lugar de destaque no movi- mento do magistério em prol de uma melhor remuneração e de maior reconhecimento social, tornando-se objeto das lutas travadas no campo educacional brasileiro para definir os valores e os comportamentos que lhes eram próprios. Diversas entidades e diferentes esferas do poder público procuraram atribuir à celebração um significado específico, quer seja através da natureza das atividades promovidas (missas, sessões so- lenes, entregas de medalhas, protestos, greves etc.), quer seja pelo con- teúdo dos discursos proferidos, nos quais tanto os aspectos exaltados quanto os omitidos eram relevantes para identificar as concepções so- bre a docência que estavam em jogo, quer seja ainda pela discussão sobre a pertinência desse tipo de celebração que colocava em evidência a controvérsia existente entre a recompensa simbólica e a financeira da profissão. Neste texto, reconstitui-se o processo por meio do qual a co- memoração se institucionalizou no Brasil analisando as diferentes ima- gens do magistério que ganharam visibilidade nas múltiplas formas de celebrar a data, desde o seu surgimento, em 1933, sob o predomínio de uma visão fortemente idealizada da docência que exaltava o sacrifício e a abnegação daqueles que a exerciam e eram relegados ao esquecimen- to a despeito da nobreza de sua missão – até a deflagração da primeira greve do magistério paulista em 1963, justamente em 15 de outubro, a qual, além de procurar legitimar a idéia do docente como um profissio- nal que necessitava ser remunerado condignamente, provocou uma mu- dança sobretudo na imagem tradicional da professora primária, pois in- corporou às representações já consolidadas a seu respeito elementos relativos à sua participação em manifestações de rua 1.
celebração e visibilidade 11
Tal análise integra a pesquisa sobre a imagem social do magistério brasileiro entre 1933 e 1963, que realizou um contraponto entre as re- presentações veiculadas acerca da docência por órgãos da grande im- prensa – tomados como indicativos de uma visão externa da profissão – e as divulgadas por periódicos de entidades representativas de diferen- tes segmentos da categoria, numa tentativa de apreender a sua “hetero- geneidade” (Enguita, 1991). Esta pretensão levou à escolha dos locais investigados, pois o movimento docente no antigo Distrito Federal (trans- formado no estado da Guanabara em 1960) e em São Paulo assumiu configurações distintas durante o período investigado em razão das di- ferenças quanto à presença da iniciativa oficial e privada em seus siste- mas de ensino. No caso carioca, o Sindicato dos Professores do Rio de Janeiro, fundado em 1931 por iniciativa do magistério secundário parti- cular, tinha um lugar de destaque na grande imprensa, sobressaindo-se pela sua atuação contra os baixos salários e as péssimas condições de trabalho da categoria. Em São Paulo, diferentemente, o CPP (Centro do Professorado Paulista), fundado em 1930 e vinculado ao professorado primário oficial, foi durante um período significativo a principal asso- ciação docente do estado. Nos anos 1940, com o crescimento da rede de ensino público, surgiram outras associações que alcançaram expressão no campo educacional, dentre as quais se destacou a APESNOESP (Asso- ciação dos Professores do Ensino Secundário e Normal Oficial do Esta- do de São Paulo), que deu origem à APEOESP (Associação dos Professo- res do Ensino Oficial do Estado de São Paulo), atualmente o sindicato da categoria^2.
ções em decorrência do reconhecimento alcançado mediante as lutas pela legitimi- dade travadas no interior do próprio campo.
celebração e visibilidade 13
tidade social, a exibir uma maneira própria de ser no mundo, a significar simbolicamente um estatuto, uma posição, um poder; enfim, as formas insti- tucionalizadas pelas quais os representantes encarnam de modo visível [...] a força de uma identidade [Chartier, 1998, pp. 178-179].
Desse modo, para o autor, não há “prática ou estrutura que não seja produzida pelas representações, contraditórias e em confronto, pelas quais os indivíduos e os grupos dão sentido ao [seu] mundo” (Chartier, 1991, p. 177). É nessa perspectiva que se consideraram as representações veicula- das acerca da docência pelos periódicos das entidades representativas de diferentes segmentos do magistério que, numa tentativa de definir a identidade do grupo, articulavam os embates e as negociações entre valores e concepções que se pretendiam generalizar para a totalidade da categoria e acabavam por forjar a sua imagem, procurando difundi-la junto a diversos setores sociais em busca de uma melhor remuneração e de um maior prestígio. Evidentemente, tais entidades procuravam ga- nhar voz e visibilidade nos órgãos da grande imprensa, importantes não só para atrair a atenção da opinião pública para os problemas enfrenta- dos pela categoria, mas também para divulgar a sua atuação em prol dos professores. Por outro lado, os jornais também tinham interesse em in- cluir (e manter) os professores entre os seus leitores através de seções especializadas em educação, cujo principal exemplo é a coluna “Edu- cação e Ensino” , escrita por um professor (Elisiário Rodrigues de Sousa) por mais de 20 anos para o Diário de S. Paulo. A importância desse gênero de produção pode ser avaliada pela moção apresentada durante o X Congresso da APESNOESP reivindicando que os jornais mantivessem seções educacionais sob a responsabilidade de docentes para que divul- gassem “informação das entidades de classe”, a fim de evitar que se disseminassem “falsas idéias sobre a realidade da Escola Pública” ( Re- vista APESNOESP , ano I, n. 1, p. 15, 1961). A esse respeito, convém observar que as relações que os agentes do campo educacional estabeleciam com o campo jornalístico dependiam não só de sua posição na hierarquia do sistema de ensino ou nas esferas de representação do movimento docente, mas também da orientação
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política e ideológica dos jornais. Desse modo, o Sindicato dos Professo- res do Rio de Janeiro tinha como o seu principal porta-voz o jornal Última Hora , cuja vinculação com o trabalhismo é amplamente conhe- cida, ao passo que o CPP – que exercia uma posição de liderança no movimento de organização do magistério paulista e cujos dirigentes ocupavam postos de comando no sistema de ensino – tinha amplo des- taque nos jornais diários, gerando, após a greve de 1963, a crítica de alguns leitores da Folha de S.Paulo contra a sua predileção pelo profes- sorado primário. É importante assinalar aqui que esta situação se inver- teu a partir do final dos anos 1970, quando a configuração do movimen- to docente paulista alterou-se com a ascensão da APEOESP após as greves de 1978 e 1979, fazendo com que o CPP reclamasse da sua exclusão do noticiário da Folha (Lugli, 1997). Assim, a grande imprensa, além de fornecer indícios sobre o prestígio da categoria (ou melhor, de seus seg- mentos) junto aos grupos responsáveis pelos jornais examinados, cons- tituía um veículo importante na produção da imagem pública dos do- centes por se tratar de uma mídia externa ao campo educacional e de ampla circulação. A fim de obter uma visão multifacetada acerca das formas de repre- sentação do magistério na grande imprensa, examinaram-se três jornais de perfis distintos de São Paulo e três do Rio de Janeiro, no período relativo ao Dia do Professor (de 10 a 17 de outubro de cada ano). No caso paulista, escolheram-se os dois principais jornais do estado na atua- lidade: O Estado de S.Paulo (fundado em 1875 com o nome de A Pro- víncia de S. Paulo ) – no dizer de Capelato e Prado, “defensor dos postu- lados liberais” e tido como “órgão modelar da opinião pública” (1980, p. XIX) – e a Folha da Manhã (1925-1960) / Folha de S.Paulo – voltada para as camadas médias. Além disso, examinou-se o matutino da em- presa de Assis Chateaubriand – o Diário de S.Paulo (1929-1979) – que publicava a coluna “Educação e Ensino” , mencionada anteriormente. No caso do Rio de Janeiro analisou-se um dos seus principais jornais atualmente, O Globo (1925), pertencente à família Marinho, pois o Jor- nal do Brasil (1891) já havia sido estudado por Ferreira (1998), embora sem a intenção de historiar a origem da comemoração e de analisar as suas significações. Por isso, optou-se pelo Correio da Manhã (1901-
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Ao se tornar objeto do noticiário da grande imprensa, merecendo muitas vezes o destaque da primeira página, da representação fotográfi- ca e dos editoriais, a celebração do Dia do Professor afirmou-se como um modo de dar visibilidade ao magistério, assegurando-lhe um espaço não só para divulgar os festejos da data, mas também para explicitar os problemas enfrentados pela categoria e os embates travados para legiti- mar diferentes concepções sobre a profissão. Sem a pretensão de esgo- tar as possibilidades de comparação entre o caso português e o brasilei- ro, convém observar que, em Portugal, o Dia do Professor – segundo Nóvoa – foi instituído durante o Estado Novo como uma forma de solu- cionar a ambigüidade da política adotada com relação ao magistério, marcada pela aparente contradição entre a “desvalorização do estatuto da profissão docente e [...] [a] dignificação da imagem social do profes- sor” (1992, p. 496). Já no Brasil tal iniciativa partiu de uma associação docente católica e o seu reconhecimento oficial se deu durante a vigên- cia do regime democrático no país. Apesar de diferentes esferas do Es- tado procurarem se apropriar da comemoração, tal medida – no caso paulista – foi fruto de um movimento empreendido por entidades repre- sentativas do magistério secundário e particular que a consideravam uma forma de tornar a atividade docente reconhecida socialmente, mas que, a partir do final dos anos 1950, passaram a utilizar a data como um marco nos protestos contra a baixa remuneração. Antes de analisar a pluralidade de significados que caracterizou o Dia do Professor no Brasil, convém evocar a reflexão de Mona Ozouf (1976) sobre as possibilidades de interpretação advindas da incorpora- ção da festa como objeto da história, sem deixar de chamar a atenção para os equívocos aos quais esta incorporação está sujeita. Ao seu ver, “não existe festa sem reminiscência; repetição do passado, freqüente- mente anual, a festa traz consigo uma memória que é tentador tomar como tal. Prenúncio do futuro, a festa fornece, por outro lado, como que uma aproximação deste. Suscita uma simulação do futuro que o histo- riador tem a boa fortuna de poder comparar com o futuro real”. Tal vinculação com o tempo pode levar ao equívoco de se considerar a re- petição presente na festa como “uma repetição consciente de si própria em que o passado celebrado seria reconhecido por aquilo que é, manti-
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do à distância e analisado”. Também se corre o risco de “tomar como tal o ensaio de futuro” que a festa inclui, sem se levar em conta que “o princípio representado pela festa é muito freqüentemente apenas uma novidade ilusória, o reinício de um gesto exemplar; é na repetição que se fundamenta a esperança” (Ozouf, 1976, p. 217). Embora a autora prossiga a sua reflexão tendo em vista as interpretações existentes sobre as festas revolucionárias francesas, cujas circunstâncias históricas que as fizeram emergir, bem como a sua amplitude sejam extremamente diferentes dos festejos do Dia do Professor no Brasil, penso que as suas observações são de grande relevância para a presente análise, pois as relações da comemoração examinada aqui com o tempo mostraram-se fundamentais para a compreensão dos seus diferentes significados e das representações veiculadas acerca da profissão docente. Nesse sentido, foi possível constatar que a relação com o tempo poderia dividi-las en- tre as que constituíam uma imagem de professor (ou melhor, de profes- sora), cuja forte idealização fazia com que ela parecesse ultrapassar os limites temporais do período estudado e as que procuravam romper com a imagem tradicional da docência, introduzindo elementos novos que eram as marcas de um momento em que se deu visibilidade à participa- ção da categoria em atos públicos contra a desvalorização salarial, cujo ápice foi a primeira greve geral do magistério paulista em 1963^4.
Em 1933, a Associação dos Professores Católicos do Distrito Fede- ral (APC-DF) festejou o Dia do Primeiro Mestre com uma missa e uma sessão cívica realizada no Instituto de Educação do Rio de Janeiro, ten-
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se em todo o Brasil e a população expressasse a sua gratidão ao primeiro professor, visitando-lhe, enviando-lhe flores ou um cartão de felicita- ções e, no caso de ele estar morto, depositando flores em seu túmulo. Em São Paulo, o Centro de Cultura Intelectual divulgou tais instruções e promoveu uma série de atividades nesse sentido: missa, concentração de estudantes em frente à Escola Normal, festival em homenagem aos mes- tres mais velhos da cidade e visitas aos professores doentes. Também atendeu ao apelo da APC-DF a Liga do Professorado Católico de São Paulo que, desde 1920, festejava no mesmo dia Santa Teresa d’Ávila – patrona da entidade por ser “a grande doutora da Igreja” – que, a partir de 1949, começou a ser designada nos jornais paulistas “padroeira do ma- gistério”. Em 1933, além da missa na igreja de São Bento em sua home- nagem, a Liga convocou toda a população do estado de São Paulo a procurar quem lhe “ensinou a ler” para homenageá-lo e, com a autoriza- ção do Diretor Geral do Ensino, promoveu um concurso sobre o primei- ro mestre entre os diretores de grupos escolares, professores de escolas isoladas e particulares e também entre alunos do terceiros e quartos anos, cujos melhores trabalhos seriam publicados em seu órgão informativo: a revista Anchieta (1933–1934). Ao contrário da Liga, cujos festejos con- tinuaram a figurar na grande imprensa paulista, a APC-DF apareceu ape- nas mais uma única vez no noticiário carioca sobre a data. A partir dos anos 1940, outras entidades representativas do magistério começaram a celebrar a data e, em São Paulo, organizaram um movimento pela sua oficialização^6.
Nos anos 1940, a comemoração do Dia do Professor voltou à cena em 1947, com as atividades da “comissão [...] pró-oficialização do Dia do Professor” que procurou divulgar a comemoração junto à grande
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imprensa, à rádio, às autoridades escolares e aos parlamentares e rece- beu a adesão do Sindicato do Ensino Primário e Secundário, do Sindica- to do Ensino Comercial, da APESNOESP , da União Paulista de Educação (UPE) – presidida à época por Sólon Borges dos Reis – e da Sociedade Beneficente de Professores e Auxiliares de Administração, sem nenhu- ma menção ao CPP. O Sindicato dos Professores Secundários de Cam- pinas, particularmente, realizou uma missa, um almoço, uma romaria ao Cemitério da Saudade para reverenciar os professores falecidos – o que passou a ser uma tradição para a entidade nos anos subseqüentes. Sem nenhuma referência à iniciativa da APC-DF, a UPE, na ocasião, veiculou instruções bastante semelhantes às divulgadas pela associação carioca em 1933, fazendo um “apelo ao povo”
no sentido de que cada cidadão dedique um instante desse Dia do Mestre, ao professor ou professora, que lhe ensinou as primeiras letras, ou que maior influência haja exercido na formação de sua personalidade. Aqueles que de- sejam atender este apelo da União Paulista de Educação, prestigiando o tra- balho de educadores [...], deverão fazer uma visita ou escrever uma carta ao seu antigo mestre. No caso do professor já ter falecido, a homenagem poderá ser prestada através de uma prece em sua memória 7.
Em 1948, o governador Adhemar de Barros declarou feriado esco- lar “a data de 15 de outubro, considerada o Dia do Professor” (lei n. 174, de 13/10/48) e, a partir de então, começaram a surgir notícias sobre as solenidades organizadas por grupos escolares, escolas normais, ginási- os e colégios, que contavam com “sessões lítero-musicais”, missas, con- ferências, homenagens a velhos mestres ou mediante a entrega de medalhas e de “diplomas de honra”. Ao noticiar os festejos que pela primeira vez tiveram caráter oficial em São Paulo, a Folha destacou a cerimônia organizada pela Liga do Professorado Católico em homena-