
























Estude fácil! Tem muito documento disponível na Docsity
Ganhe pontos ajudando outros esrudantes ou compre um plano Premium
Prepare-se para as provas
Estude fácil! Tem muito documento disponível na Docsity
Prepare-se para as provas com trabalhos de outros alunos como você, aqui na Docsity
Os melhores documentos à venda: Trabalhos de alunos formados
Prepare-se com as videoaulas e exercícios resolvidos criados a partir da grade da sua Universidade
Responda perguntas de provas passadas e avalie sua preparação.
Ganhe pontos para baixar
Ganhe pontos ajudando outros esrudantes ou compre um plano Premium
Comunidade
Peça ajuda à comunidade e tire suas dúvidas relacionadas ao estudo
Descubra as melhores universidades em seu país de acordo com os usuários da Docsity
Guias grátis
Baixe gratuitamente nossos guias de estudo, métodos para diminuir a ansiedade, dicas de TCC preparadas pelos professores da Docsity
Relatório final do Trabalho de Conclusão de Curso
Tipologia: Teses (TCC)
1 / 32
Esta página não é visível na pré-visualização
Não perca as partes importantes!
Universidade de Ribeirão Preto Jornalismo
Memorial apresentado à Universidade de Ribeirão Preto – Unaerp, como requisito final para obtenção do título de Jornalista. Orientadora: Profa. Me. Elivanete Aparecida Zuppolini
Agradeço primeiramente a Deus, por ter me dado capacidade e força para chegar até o final dessa jornada e realizar um sonho que era dEle para a minha vida. Nada disso seria possível sem Ele.
À minha orientadora, Elivanete Zuppolini, e à professora, Daniela Tincani, pela competência e confiança a qual me possibilitou na conclusão deste trabalho, muito obrigada!
Aos meus pais, Washington e Lucia Morelli, e à minha irmã mais nova, Bárbara Morelli, por me acompanharem, incentivarem e apoiarem durante todo o caminho, eu os amo demais e sou muito grata!
Não posso deixar de agradecer a alguns amigos, que durante todo o ano estiveram ao meu lado para me amparar nas horas que achei que não conseguiria continuar. Marina Pacheco, Bruna Fonseca, Laís Castro, Julia Soriani, Nicole Yamada, Isabela Vechiato, Isabella Garcia, Bella Rocxane, Lara Sproesser, Anna Laura Pozzetti, Nathália Tiem e João Vitor Reis. Eu só tenho a agradecer a vocês!
Felipe Fernandes, Luana Vasco, Joice Soares, Thainan Honorato, Flávia Coltri, Kleberson Rodrigues, Artur Moresca, Gustavo Simões e Lorena Vieira, muito obrigada por não soltarem a minha mão e por me permitirem fazer parte da trajetória de vocês!
Às amigas, que ao longo do caminho receberam mensagens minhas com a paciência por um fio e conseguiram me acalmar e tranquilizar e enxergar novos caminhos. Sabrina Anjos, Amanda Guerra e Samara Fontenele, vocês foram essenciais.
Felipe Todero, obrigada por sempre ter a coisa certa para me falar e me aconselhar com as melhores citações de séries, filmes, Daniel Sloss, Sr. K e principalmente, Nelson Rodrigues.
Por fim, mas não menos importante, obrigada Fernanda Silva, por desde que nossa amizade nasceu você ter acreditado em mim e no meu potencial. Obrigada por ter me amparado nos momentos de angústia, brigado ao meu lado nos momentos de raiva e comemorado pelos meus momentos de vitória. Você é muito importante!
Obrigada a todos!
Este trabalho de conclusão de curso discorre sobre cinco personagens femininas da teledramaturgia brasileira que influenciaram o empoderamento feminino nas últimas cinco décadas. Personagens femininas fortes, feministas, com objetivos maiores que os impostos à mulher e dispostas a lutarem pelo que querem e acreditam são cada vez mais presentes. Mas também já existiam nas décadas passadas, quando o assunto ainda era considerado tabu. Personagens femininas à frente do seu tempo e que influenciavam as jovens espectadoras com suas histórias, diariamente na TV. Através de um canal no Youtube, com uma série de vídeos, o trabalho apresentou cinco personagens que ao longo das últimas cinco décadas influenciaram o público feminino a se empoderar com as suas histórias e maneira de ser, cada uma dentro da sua época. O objeto foi um grupo composto por uma personagem feminina escolhida em uma telenovela de cada uma das décadas de 1970, 1980, 1990, 2000 e 2010. Neste contexto, a pesquisa para esse trabalho foi dividida em três partes, sendo elas: pesquisa documental que identificou e recolheu reportagens jornalísticas de cada época falando das novelas, das mulheres e das personagens selecionadas para o trabalho; pesquisa bibliográfica, com o levantamento de artigos e livros sobre o tema empoderamento feminino, feminismo, youtube, a era digital e formação de opinião pública pela teledramaturgia; e pesquisa de campo quantitativa, com a realização de entrevista com 30 mulheres por meio de um questionário fechado sobre a novela referida na época em que cada entrevistada tinha 20 anos de idade. Como resultado das pesquisas, pode-se comprovar que essas personagens realmente tiveram e ainda têm um papel importante no que diz respeito à influência no empoderamento feminino. Na pesquisa de campo realizado com as espectadoras que assistiram às novelas, mais de 50 por cento das respostas foi “Sim”, quando questionadas se as protagonistas estudadas as tinham influenciado em relação à emancipação da mulher.
Palavras-chave: telenovela brasileira, mulheres, feminismo, empoderamento feminino, década.
7
Segundo Figueiredo (2003), por volta dos anos 1960 e 1970, a telenovela passa a ser um elemento bastante presente na vida do brasileiro. Na época, junto com os programas de auditório, as novelas estavam entre os programas de maior audiência. Partindo da perspectiva de que cultura “é toda produção global de um povo, envolvendo não só a produção que abrange ideias, mas também a produção material, resultado da práxis humana” (FIGUEIREDO, 2003, p.17) pode-se considerar que a teledramaturgia está dentro da cultura brasileira. A partir de 1968/1969, a telenovela entra diariamente na casa do cidadão brasileiro, e sempre trazendo novos temas e situações que permeiam a sociedade, e aproximam o telespectador dos personagens e suas histórias. Dessa forma, ao integrar o cotidiano das pessoas nas suas práticas culturais, as novelas estabelecem relações estreitas e contínuas com seu público. Isso estabelece uma troca simbólica entre o receptor e o emissor, o que justifica seu sucesso. Nesse cotidiano, a televisão, e mais precisamente a telenovela, enquanto veículo de cultura de massa, sempre destaca alguma personagem que influencia o público nos diversos campos que compõem o imaginário social. Pode ser pelo seu estilo de se vestir, seu cabelo, o jeito de falar, ou sua história. A inspiração nasce nas atitudes da personagem e influência quem assiste e acompanha diariamente.
[...] consiste na produção industrial de um universo muito grande de produtos que abrange setores como a moda, o lazer, [...] que influenciam e caracterizam o atual estilo de vida do homem [...] (CALDAS, 1986, p. 16).
Gerando esse forte impacto no comportamento do público, desde seu primórdio, as telenovelas apresentam debates sobre os temas tabus da sociedade, como sexo, racismo, assuntos políticos, entre outros. Com o tempo, questões contemporâneas foram sendo acrescentadas aos roteiros, levando para as telas debates e ampliando a discussão. Dessa forma, apresentou outros olhares sobre assuntos polêmicos e controversos, entre eles, a emancipação da mulher, o feminismo e o empoderamento feminino. Desde a década de 1970, a maioria das novelas contém uma personagem que enfrenta o ideal machista e patriarcal no qual está inserida. Caso esse poder feminino não surja logo no início da trama, ele ganha força ao longo da história.
9
influenciam o empoderamento feminino. Além disso, teve como objetivo destacar essas personagens, relacioná-las com o cenário social brasileiro em cada época, e apresentar como a telenovela é um componente que faz parte da cultura da sociedade brasileira. O cenário político e social do Brasil na época de cada novela mencionada foi contextualizado e abordado em comparação com o comportamento das referidas personagens. O tema é especialmente relevante no momento, pois, quando se fala em direitos e segurança da mulher, ainda há muito a ser conquistado. Ainda que a luta das mulheres e seu empoderamento vêm promovendo uma importantíssima e progressiva mudança de mentalidade na sociedade, de modo geral, observa-se, neste final da década de 2010, por meio de reportagens, pesquisas e indicadores sociais de órgãos de defesa dos direitos humanos, um crescimento dos índices de violência contra a mulher e um recrudescimento nas conquistas já alcançadas. Portanto, ao trazer para essa série de vídeos no Youtube personagens empoderadas à frente das telenovelas, objetivou-se também evidenciar as possibilidades de resistência e registrar que, já na década de 1960, portanto há 50 anos, mulheres lutavam por seus direitos e a cultura popular brasileira incorpora ícones dessa luta criados pelos enredos da teledramaturgia nacional. A escolha do canal no Youtube como produto dessa pesquisa justifica-se pela sua importância na atualidade em relação à forma como a sociedade vem mudando a maneira de consumir mídias. Hoje, o consumo de conteúdos em forma de vídeos vem crescendo de tal maneira que, nos Estados Unidos, o Youtube atinge mais adultos de 18 a 34 anos e de 18 a 49 anos que qualquer canal de TV a cabo nos EUA. A plataforma foi oficialmente lançada em 2005 e, segundo estatísticas disponibilizadas pelo próprio Youtube, em 2018 chegou a mais de um bilhão de usuários – cerca de um terço da internet – distribuídos em 88 países do mundo. Estes usuários assistem aproximadamente a um bilhão de horas de vídeos por dia, comprovando a força que a plataforma tem na sociedade. Na atualidade, utilizam-se pesquisas em diversas situações, tanto para alcançar resultados esperados, provar um objetivo estabelecido e mensurar metas, bem como para simplesmente obter um direcionamento na execução do trabalho. Neste contexto, a pesquisa para esse trabalho foi dividida em três partes. Na primeira foi feito levantamento bibliográfico por meio de livros sobre o tema empoderamento feminino, feminismo, youtube e a era digital e formação de opinião pública
10
pela teledramaturgia. Levantamento bibliográfico é um “conjunto de procedimentos para identificar, selecionar, localizar e obter documentos de interesse” (STUMPF, 2009, p.24). Na segunda etapa, foi realizada uma pesquisa documental com reportagens jornalísticas de cada época abordando as novelas, as mulheres e as personagens selecionadas para o trabalho. Pesquisa de campo quantitativa é a terceira e última etapa do processo de pesquisa. Foram entrevistadas trinta mulheres (para cada época), por meio de um questionário fechado sobre a novela referente à época em que tinham 20 anos de idade. Além disso, um questionário também foi enviado para os autores das novelas. Por fim, esse relatório está estruturado em três capítulos. Além da introdução, o capítulo um trata da emancipação e o empoderamento feminino, dividido em três partes; a primeira contando a história do feminismo e da emancipação feminina; a segunda, sobre a mulher nos meios de comunicação e na cultura; a terceira parte do primeiro capítulo, fala sobre o empoderamento feminino nos dias de hoje. O capítulo dois é sobre os conceitos de um canal no Youtube e o terceiro capítulo é um relato de toda a pesquisa que foi desenvolvida ao longo do projeto e também conta com o planejamento completo dos vídeos realizados.
12
2016, p. 94). As feministas da primeira onda questionavam a imposição de papéis submissos e passivos às mulheres. Dentro da primeira onda, é possível encontrar o Feminismo Liberal, que prevê a igualdade de gêneros, isto é, pretende igualar através de reformas políticas e sociais, o acesso e os direitos entre homens e mulheres. Dessa forma, essa vertente do feminismo, pensa nos direitos individuais antes de pensar em categorias sociais. No Brasil, não foi diferente, em 1922 foi criada a Federação Brasileira pelo Progresso Feminino que deu forma e vida a essa luta, cuja primeira conquista – o voto – aconteceria uma década depois.
[...] as principais táticas utilizadas pela Federação são a do lobbying (pressão sobre os membros do Congresso) e a divulgação de suas atividades pela imprensa, para a mobilização da opinião pública. (ALVES; PITANGUY, 1981, p. 48) No entanto, simultaneamente às ideias liberais, também havia mulheres incorporando a questão feminina às ideias e teorias marxistas. A maior diferença dessas mulheres para as outras de seu momento histórico é a análise que leva em consideração a classe social. O foco das marxistas era em torno das mulheres operárias, portanto. É dessa época também as primeiras insurgências do movimento feminista anarquista que trazia pautas muito fortes em relação à sexualidade e à decisão acerca do próprio corpo. A segunda onda feminista tem início em meados dos anos 1950 e se estende até a década de 1990. Foi nessa época que se iniciou uma série de estudos focados na condição da mulher, em que se começou a construir uma teoria-base, uma teoria raiz sobre a opressão feminina. Muito por isso, geralmente, quando se refere ao feminismo de segunda onda, costuma querer dizer mais especificamente do que é chamado de feminismo radical (de raiz), um movimento que teve seu início (e sua fase mais ativa) na década de 1960, mais precisamente no pós-68, e continuou por toda década 1970, pois toda a movimentação feminista daquela época foi pautada na teoria radical que versa sobre a nossa condição de exploradas por conta do nosso sexo e das nossas funções reprodutivas.
O Feminismo Radical aponta sempre para a importância de se falar no termo “radical”, considerando na sua etimologia, ligado ao conceito “de raiz, de origem” e não extremista, com algumas pessoas, por maldade ou pura ignorância, insistem em afirmar. (ROSA, 2016, p. 101)
13
Isso pautou as discussões da segunda onda que se caracterizou por uma fase de luta por direitos reprodutivos e discussões acerca da sexualidade, conquistada, aos poucos, com o surgimento da pílula anticoncepcional e da possibilidade de a mulher escolher quando e se engravidaria. É mais ou menos aqui que começa a distinção entre sexo e gênero, sendo que aquele passa a ser entendido como uma característica biológica; e este, como uma construção social, um conjunto de características e de papéis imposto à pessoa dependendo de seu sexo. “Em terras brasileiras, vale lembrar que vivíamos a ditadura militar, época nada favorável à liberdade de expressão, especialmente a feminina” (ROSA, 2016, p. 97). É nesse contexto que, em 1975, formou-se o Movimento Feminino pela Anistia. Esse primeiro feminismo tem uma predominância de mulheres de classe média alta. Isso mudou mais nitidamente na década de 1980, com o surgimento do feminismo negro no Brasil. A segunda onda é marcada por protestos contra os concursos de Miss Estados Unidos nos anos de 1968 e 1969. Vários grupos bastante significativos protestaram para demonstrar que os concursos de beleza tratavam as mulheres como objetos, perpetuando a noção de que a aparência tem mais valor do que o que a mulher pensa. Em termos de teoria, as feministas de segunda onda buscaram identificar a origem da condição feminina — por que as mulheres são oprimidas, e o que todas têm em comum que justifique estarem, coletivamente, em situação pior do que a dos homens, de forma geral?
A resposta é o próprio sexo, a própria capacidade reprodutiva. A mulher desde sempre esteve atrelada, social e economicamente, à sua função reprodutiva, e o patriarcado, assim como o capitalismo, consiste essencialmente, também, na exploração dessa capacidade [...] (QG FEMINISTA, 2018) Assim, as feministas da segunda onda foram as primeiras a apontar que, apesar de todas as diferenças entre todas as mulheres do mundo, ainda há algo que as une, indiscriminadamente: a opressão com base no sexo. Por conta dessa visão, essas mulheres são as pioneiras na crítica à pornografia, e dão continuidade à crítica à prostituição. Também não economizam palavras sobre a exploração da mulher via maternidade e via casamento, e o uso do estupro e da violência sexual enquanto ferramenta de manutenção do poder masculino. Mas, mesmo dentro do feminismo radical, há, ainda, autoras que se enviesaram por caminhos mais específicos, como, sobre a lesbianidade e sobre como a heterossexualidade foi moldada para ser um sistema de opressão das mulheres para perpetuar o poder social masculino nas esferas de classe e raça também.
15
do “faça você mesmo” (do it yourself). Apesar de as pautas e as reivindicações dessas garotas rebeldes ainda serem muito similares àquelas da segunda onda, delas em diante a terceira onda começou a se afastar cada vez mais de sua precursora imediata.
O grande diferencial da terceira onda foi evidenciar a imensa opressão que atinge as mulheres, mas essa opressão em suas diferenças, marcando a necessidade de um recorte de classe e raça, além de propor uma desconstrução do modo de vista binária de separar a humanidade – entre homem e mulher. (ROSA, 2016, p. 97) Em 1989, foi introduzido o conceito de interseccionalidade enquanto uma ferramenta para que mulheres atingidas por vários tipos diferentes de opressão (raça, classe, sexualidade) pudessem analisar sua condição. Se, no final da segunda onda foi quando o feminismo identitário começou a se fortalecer, pois agora, as feministas de terceira onda continuariam a desenvolver a ideia inicial, de forma a evitar universalizar o conceito de mulher e reconhecer as diferentes variedades de identidades e experiências de mulheres. “A interseccionalidade é vista como uma das formas de combater as opressões múltiplas e imbricadas e, portanto, como um instrumento de luta política.” (HIRATA, 2016) Termos e conceitos como sisterhood (irmandade entre mulheres) eram evitados, quando não problematizados e desconstruídos, justamente porque eram considerados excludentes com a imensa variedade de mulheres que existe. A terceira onda é pós-estruturalista e não acredita em significados fixos ou internos a palavras, símbolos ou instituições, buscando, antes, estudar performances dentro de contingências. O grande denominador comum aos movimentos de terceira onda é a busca pela destruição de pensamentos categóricos e a crítica às prévias narrativas de liberação e de vitimização, características da segunda e da primeira onda. É importante ressaltar que a terceira onda, de forma geral, rejeita quaisquer tentativas de identificação de objetivos comuns, gerais, padronizados, e sequer se reconhece enquanto um movimento coletivo, ou seja, o conceito de feminismo aqui se individualiza. Ao contrário de suas precursoras da segunda onda, que lutavam para quebrar estereótipos associados à mulher, as feministas de terceira onda se apropriaram desses estereótipos, de condutas e de símbolos de feminilidade. Em outras palavras, elas pegaram os sutiãs, os batons e os saltos que suas precursoras haviam abandonado e os colocaram de volta, em defesa da liberdade individual de cada mulher. A “liberdade de escolha” de cada mulher começa a ser defendida indiscriminadamente, com a luta contra a pornografia e contra a prostituição. Essas, inclusive,
16
saíram do espectro da violência para serem estudadas no espectro da sexualidade, enquanto possibilidades de libertação. Outro grande foco da terceira onda foi a tentativa de apropriação de termos misóginos e pejorativos contra mulheres. O maior exemplo é a palavra “vadia”. A terceira onda entende que “vadia” e seus sinônimos são utilizadas pelos homens como forma de reprimir e de repreender mulheres que vivem como querem (inclusive sexualmente); e surge a infrutífera tentativa de se ressignificar, portanto, a palavra “vadia”, retirando-lhe a conotação negativa.
[...] é a estilização repetida do corpo, um conjunto de atos repetidos no interior de uma estrutura reguladora altamente rígida, a qual se cristaliza no tempo para produzir a aparência de uma substância, de uma classe natural de ser (BUTLER, 2003, p. 59).
Finalmente, é importante mencionar também o surgimento da ideia de transversalismo enquanto oposição ao universalismo e ao particularismo, característicos, respectivamente, da segunda e da primeira onda feminista. Quando se fala em “políticas transversais”, fala da possibilidade de diálogo entre todas as possíveis condições enfrentadas por mulheres no mundo, levando em consideração não só raça/etnia, classe e sexualidade, mas também nacionalidade, idade e religião, por exemplo. A ideia é fazer o exercício de se colocar no lugar da outra para tentar melhor perceber suas demandas, suas necessidades e seus pontos de vista na hora de traçar estratégias e políticas.
1.1. A mulher nos meios de comunicação e na cultura As telenovelas, na sociedade brasileira contemporânea, são fundamentais para construção de um sistema de valores, o qual exerce influência com seus discursos sobre certas questões sociais. “Assim é que o caráter constitutivo da mídia, que não apenas representa, mas também constitui a realidade, reforça exclusões e influi na subjetividade dos indivíduos” (FERNANDES; SIQUEIRA, 2010). Para compreender a influência das mensagens veiculadas nas telenovelas, é necessário estudar a recepção dessas produções. A posição feminina na sociedade cria debates e contradições permanentes, já que há enormes diferenças nas conquistas e na situação da mulher entre as diversas classes sociais, regiões, países e culturas. A preocupação em investigar a telenovela na conformação da identidade feminina deve-se ao entendimento de que esse referente afeta profundamente a socialização e a formação dos indivíduos. De acordo com Sifuentes e Ronsini (2011), o
18
positivas só aconteceram por causa da raiva. Além da raiva, também tenho esperança, porque acredito profundamente na capacidade de os seres humanos evoluírem. (ADICHIE, 2014, p. 103) Além de estarem em nítida desvantagem no mercado de trabalho e de acumularem funções, as mulheres ainda são vistas como objetos sexuais. Até 2017, por exemplo, diversas marcas de cervejas brasileiras conhecidas – e muitas outras publicidades do mundo inteiro – usavam mulheres seminuas em suas propagandas, como se elas estivessem em determinados lugares apenas para satisfazer os olhos e os desejos masculinos. Esse modo de enxergar as mulheres teve como consequência diversos casos de abusos sexuais e até mesmo estupros, pois, com todo esse estímulo da grande mídia na “coisificação” das mulheres, fica fácil as enxergarem apenas objetos de desejo e satisfação do homem, e não um ser com vontades, medos, inseguranças e objetivos próprios. Recentemente, nos Estados Unidos, diversas campanhas e hashtags foram lançadas com o intuito de denunciar e escancarar para o mundo os casos de assédio, que são apenas uma consequência de tudo o que já foi citado acima. Muitas mulheres denunciaram seus abusadores, tanto garotas anônimas quanto atrizes famosas de Hollywood. Este último grupo, claro, teve uma enorme repercussão, revelando nomes de abusadores e estupradores que, se antes eram aclamados pelo público, hoje são investigados pela polícia. Estes poderosos nomes da indústria do entretenimento eram, normalmente, homens hierarquicamente superiores, que usavam de seu poder para as envergonhar, abusar, silenciar e, muitas vezes, até estuprar. A mobilização em Hollywood também deu origem à hashtag “MeToo” , lançada por Alyssa Milano, que incentivou outras mulheres a expor os seus abusos e abusadores no Twitter. Essa onda nos EUA ocorreu no segundo semestre de 2017 e continua se desdobrando. No Brasil, com a hashtag “MeuPrimeiroAssédio”, no final de 2015, meninas e meninos contaram seus casos e deixaram pessoas perplexas com a idade precoce que tinham quando sofreram seu primeiro assédio, além da proximidade do abusador, que normalmente era um amigo dos pais ou algum parente próximo. [...] enquanto mulheres, não temos o controle da nossa vida sexual. Somos iniciadas por meio de um ritual bárbaro e sádico - e grande parte dos crimes, 65%, são cometidos por conhecidos. Ou seja, aqueles em que mais deveríamos confiar. Adentramos, então, nessa área tão delicada da vida de forma totalmente despreparada, cheias de dores, traumas e ansiedades. (OLGA, 2015) Mas não são todos os países que aceitam essas hashtags e esses tipos de denúncia. A China, por exemplo, censurou mulheres que incentivaram o uso da “MeToo” sob a acusação de as mesmas estarem em complô com nações estrangeiras para manchar a moralidade dos chineses.
19
Portanto, pode-se afirmar que ainda hoje o movimento feminista se faz presente e é necessário na nossa sociedade, mesmo ainda existindo muitos caminhos a serem trilhados e vencidos. Segundo QG Feminista (2018), estudos acadêmicos já afirmam existir uma quarta onda do feminismo, caracterizada principalmente pelo uso maciço das redes sociais para organização, conscientização e propagação dos ideais feministas. Apesar de não haver uma coesão teórica, são apontadas como pautas frequentes a cultura do estupro, a representação da mulher na mídia, os abusos vivenciados no ambiente de trabalho e nas universidades, e a postura de denúncia e de recusa ao silenciamento. As palavras-chave da quarta onda são “liberdade” e “igualdade”, independentemente do que isso signifique. De qualquer forma, as mulheres de hoje estão vivendo num mundo em que expressões como “feminismo” e “igualdade de gênero” estão pouco a pouco deixando de ser palavrões para serem jargões midiáticos, iscas para consumo, e a forma como a próxima onda de feministas vai responder a tudo isso é decisiva para o futuro do próprio movimento feminista.