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Os livros de Magia 1- O convite, Notas de estudo de Administração Empresarial

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Tipologia: Notas de estudo

Antes de 2010

Compartilhado em 14/12/2007

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Carla Jablonski
Criação de
Neil Gaiman e John Bolton
Título original: The Books of Magic 1
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Carla Jablonski

Criação de

Neil Gaiman e John Bolton

Título original: The Books of Magic 1 —

Para Carol e Margot, minhas parceiras na busca de um corpo melhor por meio da magia...

Introdução

Por Neil Gaiman

Quando eu ainda era adolescente, poucos anos mais velho que Tim Hunter neste livro que você tem nas mãos, resolvi que estava na hora de escrever meu primeiro livro. Ia se chamar Wild Magic (algo como Magia Maluca), e seria ambientado em uma escola particular britânica não muito importante, igual àquelas de que eu recentemente escapa- ra. Mas seria uma escola particular britânica não muito importante que ensinava magia. Tinha um jovem herói chamado Richard Grenville e um par de vilões maravilho- sos que se chamavam Mister Croup e Mister Vandemar. Ia ser uma mistura de A Wizard of Earthsea (Um Mago de Terramar, um livro de ficção científica para jovens), de Ursula K. Le Guin, A Espada na Pedra , de T. H. White, e, bom, eu mesmo, acho. Essa era a idéia. Parecia que a- prender magia era uma história perfeita, e eu tinha toda a certeza de que poderia ser bem convincente escrevendo sobre a escola. Tinha escrito umas cinco páginas do livro quando percebi que não tinha a mínima idéia do que estava fazen- do e parei. (Mais tarde, aprendi que a maior parte dos li-

se com todas aquelas pessoas estranhas... e aprendesse tudo a respeito da magia... Talvez não fosse tão ridículo assim... Então dei um suspiro, com a certeza de que, se eu me deixasse levar pelo sono, de manhã já teria esquecido tudo. Saí da cama e me arrastei pela casa até meu escritó- rio, tentando não acordar ninguém com minha pressa de anotar todas as idéias que fervilhavam na minha cabeça. Um menino. Isso. Precisava ter um menino. Alguém inteligente e engraçado, um cara que não se encaixa direi- to, que ficaria sabendo que tem o potencial de ser o maior mago que o mundo já viu — mais poderoso que Merlin. E quatro guias, que o conduziriam pelo passado, pelo pre- sente, por outros mundos e pelo futuro, com a mesma função dos espíritos que acompanham Ebenezer Scrooge em Um Conto de Natal , de Charles Dickens. Por um instante, pensei em chamá-lo de Richard Grenville, como o herói do livro-que-eu-nunca-escrevi , mas aquele me pareceu um nome heróico demais (afinal, o Sir Richard Grenville original era um capitão de barco, aven- tureiro e explorador). Então dei a ele o nome de Tim, possivelmente porque a turma do Monty Python tinha de- monstrado que Tim era um nome pouco adequado para um feiticeiro, ou talvez por me lembrar vagamente do he- rói do livro infantil de magia de Margareth Storey, Timothy and Two Witches (Timothy e Duas Bruxas). Achei que tal- vez o sobrenome dele poderia ser Seekings, e foi, no pri- meiro projeto que mandei para Karen — uma pequena homenagem ao conto assustador de magia e contrabandis- tas de John Masefield, “ The Midnight Folk ” (O Pessoal da Meia-noite). Mas Karen achou que era literal demais (por- que Seekings pode ser traduzido como alguém que está

procurando algo). Então, com um golpe de caneta, ele se transformou em Tim Hunter (Hunter quer dizer “caça- dor” em inglês). E como Tim Hunter ele se sentou, piscou, limpou os óculos na camiseta e se preparou para enfrentar o mundo. (Na verdade, nunca cheguei a usar uma escola parti- cular britânica não muito importante que só ensinava ma- gia em história nenhuma, e agora acho que nunca mais vou usar. Mas fiquei muito feliz quando Mister Croup e Mister Vandemar afinal apareceram em uma história sobre os subterrâneos de Londres, em um livro chamado Never- where .) John Bolton, o primeiro ilustrador a desenhar Tim, tinha um filho chamado James que tinha exatamente a idade certa, que serviu de modelo para Tim, com cabelos desgrenhados e óculos. Em 1990, foram publicados os primeiros quatro gibis que virariam a primeira Graphic Novel de Os Livros da Magia. Parecia que logo Tim teria um gibi mensal, que con- taria suas aventuras e desventuras e o lento processo de aprendizado pelo qual ele precisaria passar, conforme pla- nejara inicialmente o roteirista Ney Reiber, que deu a Tim várias coisas — entre elas, a mais importante foi Molly. Nessa nova série de histórias-sem-desenhos , Carla Ja- blonski tomou para si uma tarefa desafiadora: não apenas adaptar as aventuras de Tim, mas também inventar outras novas e, por todo o trajeto, lançar luz sobre a saga de um jovem que simplesmente pode crescer até se transformar no maior mago do mundo. Se, é claro, ele conseguir viver tanto assim... Neil Gaiman Maio de 2002

mens comuns. O próprio ar em volta deles era carregado, parecia que até a poeira se recusava a pousar sobre os ca- sacos escuros. Mas ali não haveria nenhum observador distraído. Aqueles homens eram muito espertos para isso. Fazia décadas que ninguém descia até ali, e ninguém que passasse na rua poderia imaginar a opulência esmaeci- da naquela sala subterrânea. O edifício tinha passado por diversas mãos. Era bem provável que o atual proprietário nunca tivesse visto o porão. A loja no piso superior tinha janelas e porta fechadas com tábuas havia muitos anos, abandonada para apodrecer. Ninguém perdia tempo espi- ando através das janelas, ninguém tentava ver o que havia atrás das grades. O lugar tinha sido esquecido. Ou talvez estivesse escondido, disfarçado. Com certeza aqueles se- nhores sabiam se mover na escuridão. Alguém acendeu um fósforo. O homem loiro, encos- tado em uma parede, levou a pequena chama até a ponta do cigarro e deu uma tragada profunda. Dos quatro, ele era o mais ambíguo, o mais hesitante — embora tivesse muitas responsabilidades. — Não quero ter nada a ver com isso — exalou as palavras com uma nuvem de fumaça. Deixou o fósforo se consumir até quase queimar seus dedos e ficou observan- do enquanto a chama se apagava. Aponta do cigarro brilhou quando o homem deu ou- tra tragada vagarosa. Era a única luz na sala além do sol fraco de fim de tarde, que já esmaecia enquanto tentava penetrar pelas manchas de sujeira. Mas aqueles homens não precisavam se ver para se comunicar. Tinham passado tempo mais que suficiente em companhia da escuridão. Além disso, cada um tinha uma habilidade diferente de enxergar.

— Constantine — o homem conhecido apenas co- mo o Estranho disse na direção do cigarro. A voz dele res- soava de autoridade, mas não revelava nenhuma impaci- ência, porque sabia que John Constantine sempre repre- sentava um desafio. Principalmente à autoridade. Era uma qualidade que lhe agregava muito valor. — Achei que ti- vesse sido bem claro. Não temos escolha. — Por que não? — Constantine quis saber. — E não comece a falar da porcaria do livre-arbítrio de novo, por- que podemos ficar uma semana discutindo isso. Dr. Oculto, que estava observando a rua através das janelas imundas, virou-se e pigarreou. — Acho que o nosso amigo quer dizer que... Constantine o cortou abruptamente. — Meu amigo não, cara. Não hoje em dia — o tom de sua voz poderia afiar uma lâmina. O Estranho e Dr. Oculto trocaram um olhar. — Se me permite terminar, senhor Constantine... o que o nosso amigo está tentando dizer é muito simples: o garoto é uma força natural, para o bem ou para o mal. E só depende de nós canalizar essa força para o bem e, quem sabe, para a magia. Quando acabou de falar, Dr. Oculto lançou outro o- lhar para o Estranho, perguntando a si mesmo como suas palavras seriam recebidas. Constantine deu mais uma lon- ga tragada no cigarro e não disse nada. Os outros sabiam que não adiantava tentar prever a reação de Constantine, nem esperar lealdade por parte dele. Nunca era inteligente esperar nada quando se tratava de Constantine. O quarto homem surgiu do meio das sombras, com os olhos cegos escondidos atrás de óculos escuros.

— disse o Estranho. Ele sabia que Constantine tinha consciência disso. Ainda assim, essa afirmação se fazia necessária. — Ele precisa conhecer o labirinto bem o sufi- ciente para percorrer o caminho verdadeiro dentro dele. — E também tem o pessoal que desejaria mostrar a ele um outro caminho — avisou Dr. Oculto. — A Chama Fria já sabe da existência dele. Minhas fontes disseram que ainda estão discutindo o que fazer. — Como é que você sabe disso, Oculto? — pergun- tou Mister Io. A desconfiança fazia seus olhos cegos se contorcerem atrás dos óculos. — Você se comunica com as forças da escuridão? Dr. Oculto não se ofendeu. Já estava acostumado com Mister Io. — Você vê um traidor em cada sombra, Io — disse sem rancor. — Tenho as minhas fontes. Prefiro não fazer comentários sobre esse assunto por enquanto. Constantine ergueu o corpo, sentou-se sobre o bal- cão e ficou com os pés balançando, como uma criança. — A única coisa de que temos certeza é que não te- mos certeza de nada. Para o Estranho, a atitude infantil de Constantine se refletia na afirmação adolescente. — Esse foi um comentário particularmente estúpido, John Constantine — o Estranho estava começando a ficar cansado daquela discussão. — Luz e escuridão, vida e morte. Essas coisas são eternamente invariáveis. Constantine suspirou. — Tudo bem. Não vou mais discutir com você, che- fe. Qual é o seu plano? O Estranho quase sorriu. Constantine costumava ser petulante quando tinha que se render.

— Vamos iluminar o menino — disse o Estranho. — Mostraremos a ele o que a magia é de verdade, o que era e o que pode ser. Ele tem potencial para se transfor- mar no humano versado mais poderoso de seu tempo. Está em nossas mãos assegurar que ele escolha seu cami- nho com sabedoria. Essa é a nossa missão e o nosso fardo — e deixou a afirmação ressoar na obscuridade. — Estamos de acordo? — virou-se para onde Dr. Oculto estava parado, perto das janelas. — Doutor? — Concordo — respondeu Dr. Oculto com um ace- no de cabeça brusco. — Vou mostrar a ele a Terra das Fadas. — Mister Io? — Se vocês são molengas demais para despachar o menino, então acho que devo educá-lo. Se ele chegar as- sim tão longe, então eu o conduzirei até o fim. — Constantine? Constantine inclinou-se para a frente, apoiou os co- tovelos nos joelhos e deixou a cabeça cair para o lado. Lançou um olhar oblíquo para o Estranho e disse: — É, está certo — e, de um salto, desceu do balcão. — Darei uma visão geral para ele. Vou apresentá-lo aos competidores, para ele ter uma idéia do quanto custa começar. — Então estamos combinados — afirmou o Estra- nho. — Começa por mim. Vou mostrar as origens e a his- tória da magia. Um estalar de ansiedade elétrica tomou os quatro homens. — Vamos embora.

Capítulo Um

Para que serve essa porcaria de produto interno bruto? O que me importa o principal produto de exportação do Chile? Tem umas coisas que eu gostaria de exportar para o Chile, o Bobby Saunders para começar, mas ninguém pergunta o que eu acho, não é mesmo? Ninguém nunca pergunta. Será que a escola precisa mesmo ser tão chata? Seria uma exi- gência do conselho de educação? Deve ter alguma coisa levemente interessante dentro de todos aqueles livros. Alguém se interessou bas- tante, tanto que os escreveu. A Molly também está de saco cheio, dá para ver pelo jeito que ela fica rodando o lápis de um lado para o outro — deve estar desenhando na margem do caderno, como sempre faz. Por que a gente nunca aprende nada de interessante, como as respostas para as questões importantes de verdade, como por que as coisas são tão aleatórias, ou como é que se decide quem nasce pobre e quem nasce rico? E por que são sempre as pessoas erradas que dão as ordens? Mas a escola não é lugar para fazer perguntas assim tão perigosas.


Timothy Hunter ajeitou os óculos em cima do nariz e tentou prestar atenção. Mas não teve muita sorte. Os Es- tudos Sociais realmente não conseguiam segurar seu inte- resse. Não quando havia tantas coisas interessantes bem ali, do lado de fora da janela. “Talvez não”, pensou, com o olhar deslizando pelo pátio vazio da escola, o alambrado, a lâmpada quebrada no poste da esquina.

“O que será que a Molly está fazendo agora?”, Tim olhou para trás quando o professor Carstairs começou a desenhar um gráfico na lousa. Molly tinha um sorriso dos mais estranhos no rosto, por isso Tim sabia que ela não estava anotando os fatos e números que o professor dita- va com aquela voz monótona. “Claro, eu também não”, pensou, virando algumas páginas do caderno para encon- trar uma folha em branco. Se o professor resolvesse cami- nhar pelo meio das fileiras, Tim não iria querer que ele visse o que tinha escrito. Tim inclinou a cabeça, como se estivesse escrevendo com muita atenção, e deu mais uma olhada em Molly por baixo da dobra do cotovelo. Neste ano, havia algo diferen- te em Molly. Eles se conheciam a vida inteira e ele tinha passado muitos anos tentando se esconder dela, mas ulti- mamente ela já não o irritava mais tanto quanto as outras pessoas. Ultimamente, ela era a única pessoa com quem ele tinha vontade de conversar, e uma das poucas que ele deixava entrar no apartamento quando seu pai estava em casa. O que ocorria na maior parte do tempo, já que ele nunca se levantava de sua poltrona reclinável. “Talvez a Molly não tenha mudado”, Tim refletiu. “Talvez seja eu.” Nada parecia se encaixar ultimamente. E não era só porque seu tênis tinha ficado pequeno e ele ainda não ti- nha conseguido pedir um novo para o pai. Tim se sentia irrequieto o tempo todo, como se tivesse crescido por dentro e a parte de fora não tivesse espaço para acomodar seu novo tamanho. Mas às vezes ele sentia exatamente o oposto: que por fora tinha chegado à adolescência oficial (afinal, ele estava com 13 anos!), mas por dentro se sentia

Tim pegou os livros e se levantou com um salto. — Vamos explodir a barraquinha de soda — disse, repetindo o que ouvira em um filme de gângsteres que o pai tinha visto na TV na noite anterior. — O que é barraquinha de soda? — Molly pergun- tou, enquanto desciam a escada da escola. — Sei lá — Tim admitiu. — Acho que só quer dizer “vamos dar o fora daqui”. — Tô nessa! — Molly respondeu com entusiasmo. — Tem algum plano para o fim de semana? — per- guntou Tim. A família de Molly era grande, então ela sempre esta- va ocupada em casa. — Bom, deixe-me ver. Acho que primeiro tenho um discurso marcado no Parlamento, para tratar de algumas leis novas. Depois tenho um baile com Vossa Majestade, a rainha. E depois, acho que vou ter que levar os menores ao médico enquanto a minha mãe e o meu pai cuidam dos maiores e fazem compras. — Que vida social — Tim disse, rindo. Tirou o ioiô do bolso e fez a manobra do cachorrinho passeando, de- pois a volta ao mundo, enquanto os dois caminhavam pa- ra casa. Como Molly morava alguns quarteirões adiante, chegaram primeiro à casa de Tim. — E você? — perguntou Molly na entrada do prédio de Tim. Estava torcendo a ponta de seus longos cabelos com os dedos. Tim deu de ombros. — Você sabe. O de sempre. Vou ficar vendo a grama crescer. A poeira juntar em cima do meu pai.

— Se quiser, me liga — disse Molly. — Adoraria ver se a grama cresce em cima do seu pai e se a poeira junta em cima do gramado! Tim riu. — Isso sim seria interessante. — Ah, não — Molly discordou com um sorriso tra- vesso. — Interessante mesmo seria escapar da morte por tédio. — Tédio é uma palavra que nem passa pela minha cabeça quando eu penso em você, Mol — afirmou Tim. — É mesmo? — perguntou Molly. — É — respondeu Tim. Molly sempre tinha as idéias mais malucas e mais le- gais para as aventuras. A maioria era apenas sua imagina- ção, mas eram animadas, divertidas. Tim gostava de se refugiar nas idéias malucas de Molly junto com ela. Um leve rubor se instalou em suas bochechas bran- cas. — A gente se fala — disse, apressada, e continuou seu caminho. — É, a gente se fala — gritou Tim atrás dela. Guardou o ioiô de volta no bolso, respirou fundo e se preparou para entrar em casa. Fazia três anos que sua mãe tinha morrido em um a- cidente de carro, o mesmo em que seu pai perdera um dos braços. Desde então, este tinha uma relação profunda com a bebida e a melancolia. Ainda assim, Tim sempre torcia para encontrar alguma coisa diferente quando abria a porta de casa, ou cada vez que descia a escada. Mas seu pai nunca mudava, e isso sempre o fazia se sentir um idio- ta. O que seria preciso para tirar o pai do mundo em que atualmente vivia? Um milagre. Ou magia.

— Não demoro — respondeu Tim, e deixou a porta bater atrás de si. Respirou fundo. O ar de outono, fresco e claro, en- cheu seus pulmões. Olhou para os dois lados da rua. Ne- nhum sinal de Molly. Será que ele devia ir até a casa dela? Resolveu que não. Não queria companhia naquele mo- mento. Só queria se movimentar. Colocou o skate no chão e foi dando impulso lenta- mente, com um pé. Essa região de Londres não era muito mais colorida que sua casa: a sujeira empilhada em terre- nos baldios abandonados, o cinza das calçadas, as cores institucionais dos conjuntos habitacionais, o rosto cinzen- to e cansado dos desempregados com roupas lavadas tan- tas vezes que toda a cor já tinha ido embora. Havia man- chas pretas para quebrar a monotonia (piche, grades, bar- ras de ferro e portões), mas em geral era um mundo cin- zento de cimento, poluição e sonhos despedaçados. De realidade. Pelo menos ele podia fugir em cima de seu skate. Tim pegou velocidade e se abaixou bastante, andan- do junto ao meio-fio. Sentiu a brisa bater no rosto, bagun- çando o cabelo escuro. O mundo virou um borrão, e en- tão algumas manchas coloridas se destacaram da paisagem cinzenta: a samambaia verde da senhora Waltham, alguns maços de cigarro e pacotes de salgadinho jogados no chão, um carro vermelho, um carro amarelo estacionado na frente do bingo. Na velocidade em que estava, dava para imaginar um mundo bonito. Tim foi na direção sul, passando por seu terreno bal- dio preferido. Ele conhecia todos os melhores lugares: ruas vazias e semidestruídas onde não teria que se preocu- par nem com carros nem com pedestres, onde podia pe-

gar velocidade e testar novas manobras. Parou, abriu os braços e gritou: — Demais! — com o melhor (ou o pior) sotaque americano que conseguiu, imaginando as ondas molhando seu rosto. Rindo, feliz por não ter ninguém ali para ver, parou para calcular o ângulo exato para subir na rampa. Ele ia fazer um aéreo! De repente, ouviu um tamborilar estranho e olhou em volta. Não dava para saber de onde vinha, e achou que devia ser alguma coisa batendo contra uma construção. Ajeitou o skate e subiu na rampa, executando uma mano- bra perfeita quando voltou ao chão. — Legal! — gritou, socando o ar. Pena que não tinha convidado Molly para vir junto. Ela teria ficado impres- sionada. Feliz da vida, rodou mais um pouco até parar e pu- xou a ponta da camiseta para enxugar o suor do rosto. Àquela altura, já estava com a respiração acelerada. Ergueu a cabeça de repente. Lá estava o tamborilar de novo, cada vez mais alto. Isso não é nenhum galho de árvore, pensou. Estava chegando mais perto. Sem ter muita certeza do que estava fazendo, Tim lentamente deu impulso no skate. O som agora parecia vir de todo lugar, ecoando à sua volta. Mas não tinha como saber exatamente de onde vinha. Parou de novo, com uma estranha sensação de temor. De repente, uma mão lhe agarrou o ombro. Virou-se para trás e viu um cego de bengala se debruçando sobre ele. Seu cabelo era grisalho nas têmporas. — Você acredita em magia? — perguntou o homem, com muita ênfase.