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Texto Introdução a farmacologia
Tipologia: Trabalhos
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Prof. Ezio T. Iff
A Farmacologia (do grego pharmakon = medicamento + logos = estudo) pode ser definida como a ciência que estuda os medicamentos. Embora uma visão mais rigorosa possa apontar diferenças entre os conceitos de medicamento, fármaco e droga, estes termos são usualmente empregados como sinônimos. No presente estudo, enfocaremos duas importantes divisões da Farmacologia: a Farmacocinética e a Farmacodinâmica. A Farmacocinética tem por objetivo estudar os fenômenos relacionados à absorção, à distribuição, à biotransformação e à excreção das drogas, cabendo à Farmacodinâmica estudar os mecanismos pelos quais elas são capazes de exercer suas ações e efeitos sobre o organismo. Acreditamos que este conjunto de conhecimentos formará a base necessária à compreensão da utilidade clínica e dos efeitos adversos que elas são capazes de provocar.
A Farmacocinética é a parte da Farmacologia que estuda a absorção, a distribuição, a biotransformação e a excreção dos medicamentos. Estes fenômenos, representados de forma esquemática na figura 1.1, estão descritos no texto seguinte. Fig. 1.1. – Representação esquemática dos fenômenos farmacocinéticos. Após a aplicação por uma determinada via, a droga (D) passa à corrente circulatória, na medida em que seja capaz de transpor um conjunto de estruturas, cuja complexidade depende
da via utilizada. Este fenômeno é denominado absorção e, na maioria dos casos, é resultado de um processo de difusão passiva, que obedece a um gradiente de concentração. Na corrente circulatória, as moléculas da droga podem estar livres (D) ou ligadas a proteínas plasmáticas (DP), geralmente de uma forma facilmente reversível. A forma livre é distribuída, quase sempre por difusão passiva, para os diferentes locais do organismo, sendo a responsável pela ação farmacológica. Assim sendo, a fração ligada a essas proteínas constitui uma espécie de “depósito” da droga na corrente circulatória. No organismo, a droga (D) pode ser alterada quimicamente como resultado de reações de biotransformação, promovidas por sistemas enzimáticos (E) que a transformam em um ou mais produtos (D’), geralmente inativos ou de menor atividade. Ocasionalmente, uma substância inativa pode adquirir atividade após ser biotransformada. Usa-se o termo “prodroga” para designar este tipo de substância. A maioria das reações de biotransformação ocorre a nível intracelular. A droga (D) ou seus produtos de biotransformação (D’) são excretados por determinados órgãos. Este processo pode, com freqüência, envolver a participação de mecanismos de transporte ativo. À proporção que a concentração sanguínea da droga diminui, seja por biotransformação ou excreção, as moléculas da mesma que se encontram presentes nos locais de ação e de depósito vão retornando à corrente circulatória, até que ocorra a sua completa eliminação pelo organismo.
O comportamento cinético das drogas no organismo está condicionado à transferência das mesmas através de dois tipos de estruturas, que são o endotélio capilar e as membranas celulares, o que, por sua vez, depende do seu grau de hidro ou de lipossolubilidade. A transferência através do endotélio vascular é um processo passivo, que depende da dimensão molecular das drogas, que é quase sempre compatível com as fenestrações existentes nos capilares. Uma vez que essa movimentação é feita de uma fase aquosa para outra, ela ocorrerá mais facilmente com as drogas de maior nível de hidrossolubilidade. A passagem através das membranas celulares pode ocorrer por difusão passiva, que é dependente da facilidade com que a droga atravessa a bicamada fosfolipídica da membrana, o que está condicionado ao seu grau de lipofilia (ou seja, sua lipossolubilidade). Dependendo da afinidade por proteínas carreadoras presentes nessas membranas, certas drogas poderão transpô-las através de processos de transporte ativo, que dependerão de gasto de energia e que poderão ocorrer mesmo contra um gradiente de concentração. Drogas de elevada polaridade, por serem hidrossolúveis, são geralmente absorvidas fácil e rapidamente, quando administradas pela via intramuscular. Grande parte das suas moléculas deve estar presente em forma livre na corrente sangüínea e, via de regra, são excretadas facilmente através da urina. Como têm dificuldade de difundir-se passivamente através de membranas celulares, não costumam ser absorvidas com facilidade quando administradas pela via oral. Em função do seu nível de polaridade, podem dissolver-se facilmente no plasma sanguíneo. Não devem alcançar altas concentrações intracelulares, a não ser através de processos de transporte ativo. Em contrapartida, drogas de polaridade extremamente baixa, portanto altamente lipossolúveis, costumam ser absorvidas com facilidade, quando aplicadas pela via oral, mas
elevação do pH (ou seja, o aumento da concentração de aceptor de prótons) resultará em aumento da proporção de moléculas ionizadas de ácido, ocorrendo o contrário se o pH baixar. Na medida em que se entenda que a proporção entre as moléculas ionizadas e não- ionizadas de um eletrólito fraco pode variar de acordo com o pH do meio, fica fácil deduzir que deve existir, para cada eletrólito, um valor de pH do meio, em presença do qual metade das suas moléculas estará na forma ionizada (I) e a outra metade na forma não-ionizada (N). Em outras palavras, deve existir um valor de pH no qual as concentrações de I e N sejam iguais. Esse valor de pH é o que costuma designar como pKa, sendo constante para cada eletrólito. Nesta ordem de idéias, o pKa de um eletrólito pode ser definido como o nível de pH do meio em presença do qual as concentrações de forma ionizada e não-ionizada deste eletrólito são iguais. Exemplos de valores de pKa de algumas drogas são apresentados na Tabela 1.1. Assim, por exemplo, as concentrações da forma ionizada [I] e da forma não-ionizada [N] de uma base de pKa = 5 serão iguais quando ela estiver num meio de pH = 5, ou seja, num meio em que a concentração de prótons seja de 10−5. Se o pH do meio for 6 (ou seja, se a concentração de H+^ for de 10−6, portanto 10 vezes menor), será mais difícil a ionização da base, que terá então a [I] 10 vezes menor que a [N]. Pela mesma razão, num meio de pH = 7 (o que equivale a uma [H+] = 10−7), a [I] dessa base será 100 vezes menor que a [N]. Por outro lado, como a elevação do pH favorece a ionização de ácidos, um ácido de pKa igual a 5 teria [I] = [N] num meio de pH = 5. A concentração da forma ionizada (I) deste ácido será 10 vezes maior que [N] num pH = 6 e 100 vezes maior num pH = 7. Tabela 1. Valores de pKa de algumas drogas Drogas ácidas Drogas básicas Ácido 5-nitrosalicílico 2,3 Acetanililida 0, Probenecida 3,4 Antipirina 1, Ácido acetilsalicílico 3,5 Aminopiridina 5, Fenilbutazona 4,4 Quinina 8, Tiopental 7,6 Tolazolina 10, Barbital 7,8 Mecamilamina 11, Com base no que foi exposto acima, pode-se concluir que procedimentos capazes de provocar alterações do pH do meio poderão alterar substancialmente o comportamento farmacinético das drogas que se comportam como eletrólitos fracos, uma vez que poderão resultar em alterações significativas da solubilidade dos mesmos. Assim, por exemplo, a absorção de um ácido fraco pela mucosa gástrica poderá ser consideravelmente reduzida, se adotarmos um procedimento capaz de elevar o pH do conteúdo do estômago, uma vez que isto implicaria no aumento da fração ionizada desse ácido, que por ser mais polar que a não- ionizada, teria dificuldade de transpor a mucosa do órgão. Na mesma linha de raciocínio, pode-se entender que uma base fraca presente no fluido tubular renal terá sua proporção de moléculas não-ionizadas aumentada se o pH do meio for
elevado, o que acarretará maior reabsorção tubular da mesma e, por conseqüência, a diminuição da sua excreção urinária. A proporção entre as formas ionizada e não-ionizada das moléculas de uma droga pode ser calculada através de variantes da Equação de Henderson-Hasselbach usada para sistemas-tampão, as quais são representadas abaixo:
ou
A título de exemplo, vamos calcular as proporções de forma ionizada e não-ionizada de uma base de pKa = 5,3, quando colocada num meio de pH = 6,5. Usando a equação adequada para a base, teremos:
ou seja:
O resultado acima mostra uma proporção de 1 molécula ionizada para 15,9 moléculas não-ionizadas, o que permite constatar que, nestas condições, predominam as moléculas que se encontram na forma não-ionizada, ou seja, a forma que apresenta maior nível de lipossolubilidade. Exemplo de aplicação prática Um cão que havia sido tratado com barbital (um ácido orgânico dotado de efeito depressor do sistema nervoso central), apresentava sinais de depressão excessiva, com risco de vida. Para corrigir a situação, foi feita uma aplicação intravenosa de bicarbonato de sódio, o que resultou em melhora do animal. Para entender o resultado, admitamos que o pH normal da urina desse cão fosse 5,5. Usando a variante da equação de Henderson-Hasselbalch adequada a ácidos, e tomando o valor de pKa do barbital, apresentado na Tabela 1.1, poderíamos constatar que neste pH urinário, teríamos:
O gráfico da direita é do tipo observado quando se empregam vias extravasculares (oral, retal, subcutânea, intramuscular e outras), nas quais as drogas atingem a circulação somente depois de terem sofrido absorção. Neste caso, uma parte das moléculas poderá ser biotransformada ou excretada antes que haja uma absorção completa das mesmas. Em outras palavras, somente uma fração da dose poderá ser efetivamente aproveitada pelo organismo. A biodisponibilidade de uma droga é um parâmetro que indica o grau de aproveitamento da mesma, quando administrada por uma determinada via. Em outras palavras, representa a fração da dose administrada que é realmente aproveitada pelo organismo. A avaliação deste parâmetro é feita por comparação da curva de concentração plasmática × tempo rerefente à administração da droga pela via em questão (via x), com a curva obtida após a administração da mesma pela via venosa, esta última servindo como referência do aproveitamento total da dose, ou seja, 100% de biodisponibilidade. O valor da biodisponibilidade (aqui representado por F) é calculado pela expressão abaixo: = ܨ ܥܵܣ (^) ௩ ௫ ܥܵܣ (^) ௩ ௩௦ 100 onde as variáveis ASC representam valores relativos das áreas sob as curvas de concentração plasmática × tempo referentes às vias mencionadas. Na figura 1.3 estão representadas as curvas de concentração plasmática × tempo usadas para a avaliação da biodisponibiidade de uma droga adminstrada por via oral. Os valores relativos das áreas sob as curvas indicados na figura foram calculados através da regra trapezóide.
Fig. 1.3 – Curvas de concentração plasmática × tempo, referentes à administração da mesma dose de uma droga hipotética pelas vias mencionadas, a um mesmo grupo de animais. As áreas sob curvas (ASC) indicadas são valores aproximados. Pela regra trapezóide, a área sob cada curva é calculada pelo somatório das áreas dos trapézios formados no gráfico, nos quais as bases são os valores de concentrações e a altura é o intervalo de tempo entre elas. Por exemplo, o valor correspondente à área do trapézio indicado no gráfico da via venosa pode ser calculada usando-se as concentrações obtidas nos tempos de 2 e 3 horas como bases do trapézio (18 e 12,5 respectivamente) e o intervalo de 1 hora como altura. A área relativa deste (A) trapézio será: ܣ = ଵ଼ ାଵଶ,ହ ଶ ×1^ ou seja^ A = 15,
Com base nos dados acima, a biodisponibilidade da droga em questão pela via oral será calculada da forma seguinte: = ࡲ ૠ ૢૠ 100 ou seja, ࡲ = ૠ%
Formulações farmacêuticas contendo a mesma dose de uma única droga ativa, e que se destinam à administração pela mesma via, podem ser significativamente diferentes quanto ao comportamento farmacocinético e, por conseguinte, quanto à intensidade e à duração dos efeitos que seriam capazes de provocar. Este fato pode resultar de diferenças nas propriedades fisicoquímicas dos ingredientes supostamente inativos presentes nessas formulações ou, até mesmo, nas características físicas da matéria-prima em que a droga ativa está contida. Assim, para assegurar que duas ou mais formulações sejam potencialmente idênticas quanto aos seus efeitos, ou seja, que haja bioequivalênciaentre elas, é necessária a realização de um conjunto de testes por meio dos quais são comparadas as suas curvas de concentração plasmática × tempo. Assim, duas ou mais formulações da mesma droga são consideradas bioequivalentes quando essas curvas não diferem significativamente quanto a três parâmetros: a concentração plasmática máxima obtida (cmax); o tempo em que essa concentração é
diferenças significativas quanto a um desses valores é suficiente para demonstrar que não existe bioequivalência entre tais formulações. É oportuno lembrar que os testes de bioequivalência são realizados em indivíduos da espécie a que essas formulações se destinam (animais ou voluntários humanos), obedecendo a protocolos de grande rigor ético e científico. A Figura 1.4 apresenta resultados obtidos em um teste desse tipo, realizado com dois produtos comerciais que contem a mesma droga. Por uma questão de ética, os nomes e a composição dos mesmos foram omitidos. Fig. 1.4 – Representação gráfica das curvas de concentração plasmática × tempo de duas formulações A e B de uma mesma droga, mostrando a ausência de bioequivalência entre elas.
Figura 1.5. As drogas ligadas permanecem no vaso, sendo liberadas à medida que a concentração de moléculas livres vai diminuindo. Na maioria dos casos, a ligação droga- proteína é facilmente reversível e essa liberação pode ocorrer com relativa rapidez, possibilitando a produção de efeitos praticamente instantâneos. Em alguns casos, o grau de reversibilidade dessa ligação é baixa, o que pode explicar a presença de quantidades significativas da droga no sangue durante longos períodos. Dentre as proteínas plasmáticas capazes de transportar drogas, a albumina é quantitativamente a mais importante, estando envolvida principalmente no transporte de drogas
A proporção entre droga livre e droga ligada pode ser alterada em algumas situações. Assim por exemplo, uma droga que normalmente se liga em alta proporção a proteínas plasmáticas poderá ter maior quantidade de moléculas livres (o que pode resultar em intensificação dos seus efeitos), quando administrada a animais como hipoproteínemia ou quando empregada em associação com doses relativamente altas de outras drogas que tenham afinidade pelos mesmos sítios de ligação que ela. Volume Aparente de Distribuição O volume aparente de distribuição (Vd) de uma droga é um parâmetro usado como uma estimativa do volume de água corporal em que ela seria capaz de se distribuir. Conforme está representado na Figura 1.6, o valor do Vd é calculado pela expressão abaixo, onde m é massa
obtida ao final da distribuição da mesma pelos compartimentos aquosos que consegue atingir. O critério usado para avaliar esta concentração é demonstrado juntamente com a avaliação da meia-vida, no gráfico respectivo. ܸ ௗ = ݉ ܿ Costuma-se considerar a existência de três importantes compartimentos aquosos no organismo: o plasma sanguíneo; o líquido extracelular e a água total, cujos volumes são Fig. 1.5 - Representação esquemática de um segmento de capilar sanguíneo, mostrando a interação de proteínas plasmáticas com uma droga. É visualizada a passagem das moléculas de droga livre através das fenestrações e a permanência dos complexos droga-proteína no sangue.
avaliados através do Vd de substâncias que se dissolvem de forma seletiva nos mesmos, as quais são usadas como marcadores. Valores aproximados desses volumes são indicados na Figura 1.6, juntamente com exemplos de substâncias empregadas como marcadores na avaliação dos mesmos.
Com base no valor de ܸௗ de uma droga, pode-se entender se ela ficou restrita ao compartimento plasmático, se foi capaz de distribuir-se da forma homogênea no liquido extracelular ou se conseguiu penetrar em quantidades expressivas no interior de células, o que pode fornecer informações importantes sobre as suas características farmacocinéticas. Vale lembrar que um valor de ܸ ௗ maior que o volume da água total evidencia a presença de quantidades significativas da droga em compartimentos não-aquosos. Este fato pode ocorrer com drogas lipossolúveis capazes de atingir altas concentrações no tecido adiposo. Barreiras farmacológicas De um modo geral, as moléculas das drogas passam livremente através dos leitos capilares do organismo. No entanto, em determinadas estruturas esses capilares apresentam características que dificultam a passagem das mesmas através de seus endotélios, constituindo o que se costuma denominar barreira farmacológica. As mais importantes delas são a barreira hematoencefálica e a barreira placentária. A barreira hematoencefálica caracteriza-se pelo fato dos capilares cerebrais serem desprovidos de fenestrações, uma vez que as junções entre as células endoteliais são intimamente unidas (junções soldadas) e, mais ainda, pelo fato desses vasos estarem Fig.1.6 - Representação esquemática do processo de avaliação do ࢂࢊ de uma droga, com indicação dos volumes dos compartimentos aquosos em que ela pode se distribuir e exemplos de substâncias usadas como marcadores na avaliação dos mesmos. O critério usado para avaliação da concentração plasmática de equilíbrio está representado na figura referente à avaliação da meia-vida.
Assim, quando uma droga é administrada pela via venosa, sua concentração num órgão altamente vascularizado (A) tende a atingir rapidamente um equilíbrio com a concentração plasmática. Contudo, à medida que ela vai sendo distribuída para os órgãos menos irrigados (B e C), sua concentração plasmática vai diminuindo progressivamente, o que resulta num gradativo retorno da mesma, do órgão A para o plasma. Por conseguinte, se o órgão A é o alvo da ação da droga, a intensidade dos seus efeitos diminuirá significativamente, independentemente de biotransformação ou de excreção. Este fenômeno, denominado redistribuição, pode explicar a curta duração dos efeitos de várias drogas cujos sítios de ação estão presentes em órgãos da elevada irrigação sanguínea. Um exemplo bem representativo da importância da redistribuição pode ser encontrado entre os anestésicos intravenosos do tipo do tiopental sódico. A injeção venosa desta droga produz uma anestesia praticamente instantânea, que dura cerca de 20 minutos. A curta duração deste efeito não pode ser atribuída à relativa lentidão com que ele é biotransformado ou excretado, mas sim à velocidade com que é redistribuído, de órgãos altamente vascularizados, como o cérebro, para locais de menor irrigação sanguínea, como o músculo esquelético e o tecido adiposo. Com o objetivo de facilitar a compreensão desse fenômeno, a Figura 1.9 mostra uma representação esquemática da redistribuição de um anestésico intravenoso hipotético do grupo dos tiobarbitúricos. Biotransformação Uma vez absorvidas, as drogas ficam expostas à ação de ação de enzimas capazes de alterá-las quimicamente. Algumas dessas biotransformações podem ocorrer no próprio sangue, como é o caso da hidrólise de certos anestésicos locais por esterases plasmáticas. No entanto, a maioria delas resulta da ação de enzimas teciduais, presentes a nível intracelular. Como Fig. 1.9 – Representação gráfica das concentrações de um tiobarbitúrico hipotético no plasma (vermelho), cérebro (azul), músculo esquelético (cinza) e tecido adiposo (laranja), após a injeção intravenosa. A linha tracejada indica a concentração cerebral mínima capaz de manter o animal anestesiado.
regra geral, essas reações dão origem a produtos mais polares, de mais fácil excreção, cuja atividade farmacológica é reduzida ou até mesmo abolida. A maioria das biotransformações das drogas depende da ação de um sistema bioquímico denominado “sistema microsomal”, localizado no reticulo endoplasmático liso, principalmente nos hepatócitos, e também em células de outros órgãos. Em função da sua grande importância, a atuação deste sistema será discutida em detalhe mais adiante. Tipos de cinética de biotransformação De acordo com a velocidade de formação dos produtos, definem-se dois tipos de cinética de biotransformação: a “cinética de 1ª ordem” e a “cinética de ordem zero”. As condições que as definem estão representadas esquematicamente na figura abaixo: Na cinética de 1ª ordem, a velocidade de formação dos produtos é diretamente proporcional à concentração de droga, uma vez que as enzimas capazes de atuar sobre elas estão disponíveis em alta concentração. Assim sendo, a quantidade de produto formado dependerá da quantidade de droga disponível. Este é o tipo de cinética característico da maioria das drogas usadas, cujos efeitos são obtidos em níveis de doses incapazes de saturar os sistemas enzimáticos envolvidos na sua biotransformação. Na cinética de ordem zero, a disponibilidade de enzimas é baixa em relação às concentrações de droga presentes. Portanto a velocidade de formação do produto é constante, uma vez que dependerá da quantidade de enzima disponível. Este tipo de cinética, também denominado “cinética de saturação”, é comum às drogas que, por serem pouco ativas, dependem do emprego de doses elevadas. Tipos de reações de biotransformação Com freqüência, as reações de biotransformação costumam ocorrer de forma seqüencial, o que justifica os termos reações de fase I ou reações de fase II, com que são designadas. As reações de fase I consistem na introdução de grupos funcionais polares, como hidroxila (-OH), carboxila (-COOH) e sulfidrila (-SH), ou na exposição de grupos polares que se encontravam mascarados pela ligação com grupos apolares (por exemplo, a exposição de uma hidroxila resultante de uma O-demetilação). A maior parte dessas reações é de natureza oxidativa, embora ocorram com menor freqüência hidrólise ou redução. Fig. 1- 10 - Representação esquemática das condições que definem o tipo de cinética de drogas. A figura da esquerda refere-se à cinética de 1ª ordem e a da direita à cinética de ordem zero. As formas em azul representam moléculas de enzima e as vermelhas as moléculas de droga. Ver texto para explicações.
Partindo da concentração plasmática atual (CA) de uma droga e conhecendo a sua meia-vida, é possível fazer-se uma estimativa da concentração (CF) em que ela estará presente no plasma, ao final de um tempo correspondente a um número (n) de múltipos da sua meia- vida. Para isto, pode-se usar a expressão: ܥி = ಲ ଶ Deste modo, sabendo que a meia-vida de uma droga é de 3 horas e que sua concentração plasmática atual é de 80 mg/L podemos prever que, ao final de 18 horas (portanto 6 múltiplos da sua meia-vida), a concentração plasmática será: ܥி = ଼ ଶల^ ܥி = ଼ ଵଶ଼ ܥி = 0,625 mg/L É importante assinalar que a definição de meia-vida e os cálculos acima são válidos apenas para drogas que seguem uma cinética de 1ª ordem, uma vez que as drogas cuja cinética é de ordem zero podem ter diferentes valores de meia-vida, dependendo do nível das concentrações plasmática presentes a cada momento. Avaliações da Meia-vida e do Volume Aparente de Distribuição As relações entre as concentrações plasmáticas e seus respectivos tempos são geralmente traduzidas por curvas exponenciais, que podem ser transformadas em retas, se as concentrações forem representadas em escala logarítmica. Este critério foi usado na construção do gráfico da Figura. 1.12, onde são explicadas as avaliações da meia-vida e do volume aparente de distribuição de uma droga, cujas condições estão descritas a seguir: Um cão de 12 kg de peso foi tratado com uma droga, por via venosa, na dose de 2 mg/kg. A intervalos de 1 hora após a aplicação foram coletadas amostras de sangue, usadas Fig. 1.12 - Curva de concentração plasmática × tempo referente à aplicação venosa de uma droga, na dose de 2 mg/kg num cão de 12 kg de peso. Os valores de ordenadas representam os logaritmos das concentrações plasmáticas, expressas em mg/L.
para determinação das concentrações plasmáticas da mesma, usadas em escala logarítimica, para representar graficamente a relação. Como se pode constatar, foram obtidas duas retas, sendo uma referente à fase de distribuição e outra à fase de eliminação, cada uma delas representando uma função exponencial. O cálculo desses parâmetros foi feito com base na reta referente à fase de eliminação. Avaliação do volume aparente de distribuição Como foi informado acima, a dose aplicada foi de 2 mg/kg. Como o animal pesa 12 kg,
ao final da fase distribuição. Como se pode entender, quando esta concentração é alcançada, uma parte da massa administrada já se perdeu, seja por biotransformação e/ou excreção. Esta perda pode ser “corrigida” se admitirmos que, caso a distribuição pudesse ser completada instantaneamente, a reta relativa à fase de eliminação começaria no tempo zero (conforme indicado pela linha em cor vermelha) e, deste modo, o log dessa
droga será: ܸ ௗ = ܸ ௗ^ = ଶସ ,ଷ ܸ ௗ^ = 5,7 litros Como se pode ver, este volume corresponde a cerca de 48 por cento do peso do animal, indicando que a droga foi distribuída por grande parte da água corporal total, cujo volume deve ser da ordem de 6,6 a 7 litros. Portanto, ela penetrou em quantidades significativas no compartimento intracelular, o que seria compatível com um alto nível de lipossolubilidade ou com um transporte ativo por proteínas carreadoras. Avaliação da meia-vida Como foi visto anteriormente, a meia-vida corresponde ao tempo em que a concentração plasmática é reduzida à metade do valor tomado como referência, podendo ser avaliada em qualquer momento da fase de eliminação. Assim, tomou-se como base o log de concentração 0,6, que corresponde à dose de 4 mg/L. Portanto, para calcular a meia-vida deve-se localizar o ponto referente à concentração de 2 mg/L, cujo log é aproximadamente 0,3. Como se pode ver pelas linhas representadas em azul, essas concentrações correspondem aos tempos de 2,6 e 6,6 horas aproximadamente. Portanto, a meia vida será calculada pela diferença entre eles, ou seja 4 horas. Sistema microssomal de biotransformação Este sistema é constituído por enzimas de baixa seletividade de ação, que são responsáveis por grande parte das reações de biotransformação que ocorrem com as drogas, a maioria das quais é produto de síntese em laboratório e, portanto, completamente estranha ao organismo. Os constituintes ativos deste sistema estão presentes no reticulo endoplasmático liso, principalmente nos hepatócitos, embora sejam encontrados em outros tipos de células. O sistema microssomal pode ser isolado através de técnicas de centrifugação fracionada, estando presente no sedimento obtido por ultracentrifugação, que se denomina fração microssomal, daí o nome pelo qual é conhecido. O isolamento deste sistema, a partir de um homogenato de fígado, está representado esquematicamente na figura 1.13.
mostrado na Tabela 1.2. Cada uma dessas isoenzimas é capaz de biotransformar várias drogas quimicamente diferentes, sendo também possível a biotransformação de uma mesma droga por duas ou mais dessas isoenzimas. Drogas inibidoras e indutoras de isoenzimas microssomais A biotransformação microssomal pode ser influenciada por muitas drogas. Assim, uma droga inibidora de um certo tipo de isoenzima poderá intensificar os efeitos das drogas que esse tipo de isoenzima é capaz de inativar. Por outro lado, uma droga indutora, capaz de aumentar a biossíntese de uma ou mais dessas isoenzimas, será capaz de acelerar a biotransformação das drogas que essas isoenzimas poderiam inativar. Estes fatos são de grande importância farmacológica, uma vez que explicam a ocorrência de muitos casos de interações medicamentosas observadas clinicamente. Alguns exemplos desses fatos podem ser encontrados na tabela 1.2. Tabela 1. Exemplos de isoenzimas do citocromo P450, com indicação de drogas que elas podem metabolizar ou que são capazes de atuar como indutoras ou inibidoras das suas ações Isoenzimas CYP1A2^ CYP2D6^ CYP2C9^ CYP2C19^ CYP3A drogas metabolizadas Cafeína Clozapina Fenacetina Imipramina Propranolol Teofilina Captopril Difenidramina Haloperidol Imipramina Ioimbina Propranolol Diclofenaco Fenitoína Fluvastatina Imipramina Piroxicam Tolbutamida Diazepam Fenitoína Hexobarbital Imipramina Omeprazol Propranolol Amiodarona Diazepam Imipramina Nifedipina Sinvastatina Verapamil drogas indutoras Barbitúricos Omeprazol Fenitoína ? Barbitúricos Rifampicina ? Barbitúricos Carbamazepina Fenitoína drogas inibidoras Cimetidina Ciprofloxacina Enoxacina Haloperidol Quinidina Sertralina Fluconazol Ritonavir Fluoxetina Fluoxetina Omeprazol Fluvoxamina Cimetidina Eritromicina Cetoconazol Excreção A excreção é um processo que tem início a partir momento que as primeiras moléculas da droga chegam ao sangue e são levadas a órgãos capazes de promover a sua eliminação. O rim e o fígado excretam drogas através da urina e da bile, respectivamente. Substâncias gasosas ou voláteis são excretadas preferencialmente através do ar expirado. As glândulas exócrinas também constituem vias de eliminação de drogas. A excreção de drogas pela glândula mamária é particularmente importante, seja pelos efeitos que o leite pode exercer sobre quem o ingere, seja pelos prejuízos que a presença de drogas no mesmo pode causar à produção de lacticínios. Excreção renal A filtração glomerular e a secreção tubular são os processos envolvidos na excreção urinária das drogas. A filtração glomerular é dependente da pressão sanguínea, por meio da qual as drogas passam do sangue para os túbulos renais, através dos capilares glomerulares.
Estes vasos são altamente permeáveis, permitindo a passagem de quase todas as moléculas de drogas que se encontram livres no plasma. Como se trata de um processo passivo, a quantidade de droga filtrada é diretamente proporcional à sua concentração plasmática. A secreção tubular é um processo de transporte ativo, dependente de proteínas carreadoras, o que envolve gasto de energia. Trata-se de um processo altamente eficiente, através do qual podem ser excretadas drogas em quantidades nitidamente mais altas que as eliminadas por filtração glomerular. O túbulo proximal é o segmento onde ocorre a maior parte deste processo, sendo que a secreção de drogas de caráter ácido é mais eficiente que a de drogas básicas. A ocorrência de secreção tubular de uma droga pode ser evidenciada através do valor do clearance (depuração) renal da mesma. Vale lembrar que o clearance renal (Cl) de uma substância representa o volume de plasma do qual foi removida a quantidade dessa substância eliminada na urina por unidade de tempo (em mL/min), podendo ser calculado pela expressão abaixo, onde U e P são, respectivamente, as concentrações urinária e plasmática da mesma (em mg/mL) e V é o volume de urina excretada, em mL/min. =
Tendo em conta que a inulina é uma substância cuja excreção urinária depende apenas da filtração glomerular, pode-se afirmar que qualquer droga que tenha um clearance renal maior que o dela sofre secreção tubular. Vale lembrar que este processo depende de um transporte ativo, promovido por proteínas carreadoras presentes nas células tubulares. Isto nos permite entender que duas drogas cuja excreção dependa de um mesmo tipo de proteína carreadora poderão competir entre si com relação a essa proteína e, desta forma, uma delas reduzirá a secreção tubular da outra. Um exemplo deste fato é a ação inibidora que a probenecida é capaz de exercer sobre a secreção tubular da penicilina. Uma certa proporção das moléculas presentes no fluido tubular pode retornar à circulação, como conseqüência de sua reabsorção tubular. Como regra geral, trata-se de uma difusão passiva, que depende da lipossolubilidade da droga. Por este motivo, moléculas na forma não-ionizada podem ser reabsorvidas mais facilmente que as ionizadas. Assim, por exemplo, a reabsorção tubular de barbitúricos (que são ácidos fracos) pode ser reduzida pelo tratamento do animal com bicarbonato de sódio, que eleva pH do fluido tubular, aumentando a proporção de moléculas ionizadas deste ácido e, consequentemente, intensificando a eliminação urinária dos mesmos. Excreção biliar Drogas presentes na circulação sanguínea podem ser incorporadas à bile, à medida que ela vai sendo produzida. Como regra geral, este processo é resultado de transporte ativo, exercido por carreadores presentes nos hepatócitos. Eles podem ser responsáveis pela secreção de quantidades expressivas de várias drogas e seus metabólitos que, desta forma, são lançados na luz do intestino e eliminados com as fezes. A eficiência deste processo de excreção depende da integridade funcional do órgão, o que pode justificar o acúmulo de drogas em animais com comprometimento da função hepática. Uma vez excretadas através de bile, as drogas podem ser reabsorvidas no intestino e, desta forma, retornar à circulação. Este fenômeno é conhecido como ciclo hepatoentérico (ou enterohepático) e pode explicar o aumento da meia-vida das mesmas. É particularmente