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ECONOMIA DOS PENSADORES, Esquemas de Economia Global

PENSAMENTO DOS ECONOMISTAS RICARDO

Tipologia: Esquemas

2022

Compartilhado em 03/01/2023

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joao-paulo-franco-8 🇧🇷

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OS ECONOMISTAS

D AVID R ICARDO

PRINCÍPIOS DE E CONOMIA

P OLÍTICA E T RIBUTAÇÃO

Tradução de Paulo Henrique Ribeiro Sandroni

APRESENTAÇÃO

1. Ricardo — Um dos fundadores da Economia Política Clássica

U m dos maiores economistas de seu tempo, David Ricardo foi

considerado ainda em vida o legítimo sucessor de Adam Smith no papel de difusor da jovem ciência conhecida como Economia Política. Sua obra abrange uma vasta amplitude de temas como, dentre outros, po- lítica monetária, teoria dos lucros, da renda fundiária e da distribuição, teoria do valor e do comércio internacional, tendo muitas de suas con- tribuições estabelecido as bases de um debate que se prolonga até os dias atuais. Sua obra mais conhecida, On The Principles of Political Economy and Taxation , apresentada ao público brasileiro neste volume, foi pu- blicada pela primeira vez em 1817, tendo obtido imediato reconheci- mento e recebendo mais três reedições somente em vida do autor (a edição definitiva veio à luz em 1823, ano da morte de Ricardo). Mais do que em Smith, o método de exposição de Ricardo estabeleceu uma referência para a nova ciência que perdura até os dias atuais: Ricardo mantinha-se em altos níveis de abstração e procurava dar aos argu- mentos um rigor científico próprio de um investigador que está em busca de leis gerais. O rigor lógico e o raciocínio dedutivo (alinhando premissas gerais antes das conclusões) davam consistência aos argu- mentos, os quais, mesmo dificultando às vezes, desnecessariamente, a clareza da exposição, colocavam Ricardo em enorme vantagem nos de- bates de seu tempo. Principles é, ao lado da Riqueza das Nações , de Smith, de O Capital , de Marx, e da Teoria Geral , de Keynes, uma das obras mais lidas de economia de todos os tempos. Com sua estrutura lógica e consistência interna, pode-se dizer também que é a obra que marca o aparecimento da economia como ciência plenamente consti- tuída de objeto e método.

2. A época em que viveu Ricardo

David Ricardo nasceu em Londres em 18 de abril de 1772, filho de um abastado comerciante de origem judaica que havia emigrado da Holanda. Ricardo cresceu no mundo “prático” dos negócios, tornou-se operador da bolsa de valores londrina e, ainda jovem, já era dono de considerável fortuna, além de mover-se com familiaridade no mundo dos negócios e das finanças do capitalismo mais avançado de sua época. A Inglaterra acabava de completar a que ficaria conhecida como a Primeira Revolução Industrial, um formidável processo combinado de avanço tecnológico e de transformações sociais que tornara autônoma a produção industrial, livrando-a do controle dos produtores diretos (transformando em proletários os antigos artesãos) e do jugo dos in- termediários do comércio. O tear mecânico, a tecnologia a vapor, as estradas de ferro e o avanço da mineração e da siderurgia — as ino- vações mais importantes do período — permitiram centralizar a pro- dução das manufaturas, reunindo nas primeiras fábricas modernas os produtores antes dispersos e mudando radicalmente o equilíbrio entre campo e cidade na Inglaterra. Completava-se o processo de cercamento no campo (os enclousures ), com a expulsão dos camponeses das antigas terras comunais e sua migração em massa para os centros urbanos, à procura de trabalho, sob duríssimas condições e ganhando muitas vezes o estritamente necessário para subsistir. O ciclo econômico, nesta nova fase do capitalismo inglês, tinha vindo para ficar e, de tempos em tempos, crises comerciais arrochavam a lucratividade dos empre- sários e traziam o aumento do desemprego, que piorava mais ainda as condições das massas urbanas. É claro que tal transformação radical nos modos de vida não deixaria de produzir muitas revoltas e agitação social entre os trabalhadores ingleses. Um dos grandes temas em debate na época de Ricardo era a miséria e o aumento da mortalidade entre classes trabalhadoras da Inglaterra. Do ponto de vista ideológico, a época de Ricardo também foi mar- cada por uma outra grande revolução — os acontecimentos que resul- taram na Revolução Francesa de 1789. A bandeira da “Igualdade, Li- berdade e Fraternidade”, lema do movimento francês que culminou na tomada da Bastilha, tinha-se enraizado fundo na mentalidade das elites ilustradas européias. As conquistas do exército profissional montado por Napoleão em toda a Europa eram vistas com simpatia pelas elites liberais, que ali enxergavam uma luta das novas idéias constituciona- listas contra o passado absolutista e aristocrático. A extensão e a igual- dade dos direitos políticos e civis eram vistas agora por estas elites como condição fundamental para a organização da vida social. O libe- ralismo político, sob a forma de democracias constitucionais e parla- mentares, era a forma de organização social mais adequada ao regime

OS ECONOMISTAS

inflação. As conclusões de Ricardo, melhor expressas em uma nova intervenção sob o título de Propostas para um Numerário Seguro , de 1910, serviram de base para a formação do Bullion Comittee , que en- dossaria suas propostas e recomendaria a volta da conversibilidade da moeda — o que ocorreu em 1821. O regime de padrão-ouro serviria de base para os sistemas mo- netários europeus até a eclosão da Primeira Guerra Mundial. Ricardo afirmava que, sob o padrão-ouro, a estabilidade monetária e os fluxos de capitais entre os países poderiam ser regulados automaticamente, sem a intervenção dos governos nacionais, apenas se fossem deixadas operando as forças de livre mercado. Imagine-se um país em que por qualquer razão os preços internos estivessem em elevação em relação ao ouro (poderia ser, por exemplo, pela ocorrência sistemática de su- perávit na balança comercial, com acúmulo do metal e sua desvalori- zação ante os demais bens). Nesta situação, a livre concorrência pro- piciaria um fluxo de oferta de bens estrangeiros naquele país, fazendo escoar-se o excesso de ouro através das importações e reequilibrando os preços internos. A situação oposta, de diminuição de preços internos pela escassez de ouro, seria resolvida pelo aumento das exportações e recuperação do lastro metálico.

4. O debate sobre as leis do trigo — Ricardo escreve os Princípios

Outro importante debate foi marcado pela participação de Ricardo — e nasceu daí a redação dos Princípios de Economia Política e Tri- butação. A discussão era sobre as “Corn Laws”, leis inglesas que so- bretaxavam os cereais importados abaixo de determinado nível de pre- ços. O objetivo destas leis era proteger os produtores domésticos de cereais da concorrência externa, fazendo, no entanto, com que os preços de importantes produtos da subsistência dos trabalhadores ingleses ficassem mais caros. A polêmica antepunha os industriais e populações urbanas, de um lado, aos produtores agrícolas e proprietários de terras, de outro, e Ricardo, ferrenho defensor dos interesses industriais, passou a atacar as “Corn Laws”. Em seu texto de 1815 intitulado Um Ensaio Sobre a Influência do Baixo Preço do Trigo Sobre os Lucros do Capital, Mostrando a Inconveniência das Restrições à Importação , Ricardo de- monstrava que a proteção aos produtores nacionais de cerais menos eficientes fazia aumentar a proporção da renda da terra e dos salários (que deveriam ser maiores em relação aos preços dos demais bens para acomodar os preços maiores dos bens da cesta básica) em relação aos lucros. Esta transferência de renda dos setores dinâmicos para os menos eficientes fazia diminuir a intensidade da acumulação e do crescimento da economia. A superioridade da argumentação lógica de Ricardo, ainda que não tenha convencido seus opositores (os grandes debates de eco-

OS ECONOMISTAS

nomia dificilmente produzem consensos), reforçou a notoriedade do au- tor e o colocou em contato estreito com importantes economistas da época, tais como James Mill e Malthus, que o incentivaram decisiva- mente a escrever uma obra que reunisse todo o seu pensamento eco- nômico. Esta obra, uma reelaboração do Ensaio sobre as “Corn Laws”, transformou-se nos Princípios , a primeira grande sistematização teórica em economia após A Riqueza das Nações , de Adam Smith.

5. Os Princípios de Economia Política e Tributação — A obra-mestra de Ricardo

Já no prefácio de Princípios , Ricardo aponta qual era o problema central da economia política: “determinar as leis que regem a distri- buição do produto total da terra entre as três classes, o proprietário da terra, o dono do capital necessário para seu cultivo e os trabalha- dores, que entram com o trabalho para o cultivo da terra”. Notamos já neste ponto que o problema central de Ricardo divergia do de Adam Smith na Riqueza das Nações. Para este, a questão central estava em investigar as causas do crescimento das nações, que era a fonte de onde provinham os estímulos à acumulação de capital. Para Ricardo, a acumulação era um problema relativamente simples, já que era deter- minada pela manutenção das taxas de lucros em determinados patamares, garantindo a reinversão. O problema central era da distribuição do produto total entre as três categorias. E os lucros eram vistos como resíduos, formados após a dedução dos custos de produção (aí incluídos os salários) e da renda da terra. Como se dava a distribuição? O esquema de Ricardo utilizava-se da produção agrícola porque existiam aí, segundo ele, características especiais que levavam a de- terminar a distribuição nos outros setores. Os salários eram fixados pelo nível mínimo necessário para garantir a subsistência dos traba- lhadores. Ricardo adotava a teoria de Malthus segundo a qual o salário apontava para a subsistência, porque se se elevasse, induziria ao apa- recimento de um número maior de trabalhadores (pelo aumento do número de filhos dos operários), que faria, através da concorrência, o nível dos salários baixar novamente até a subsistência. Do contrário, um nível abaixo da subsistência faria os salários retornarem ao patamar natural, pela escassez de trabalhadores que seria causada. E quanto à formação da renda da terra? Para Ricardo, a renda da terra devia-se à escassez de terras e à diferenciação das produtividades entre elas. Em uma situação ideal, em que todas as terras cultivadas obtivessem a mesma produtividade, não haveria, de acordo com o autor, a formação de uma renda diferenciada na terra. Os lucros seriam simplesmente o resíduo do produto após a dedução dos custos (para simplificar, conside- remos como custos somente a parcela dos salários). Ocorre que, em uma situação real, a pressão populacional exige a ocupação de terras menos

RICARDO

nômicos. Em sua visão, as trocas internacionais seriam vantajosas mesmo em uma situação em que um determinado país tivesse maior produtividade que o outro na produção de todas as mercadorias. Ele criou o famoso exemplo do comércio de tecidos e vinhos entre a Inglaterra e Portugal. Nesta ilustração, Portugal necessitava de menos horas de trabalho-homem para produzir vinho e tecidos do que a Inglaterra. Mas em Portugal, o custo de oportunidade para abrir mão da produção de uma unidade de vinho a fim de produzir tecidos era maior do que especializar-se na pro- dução de vinho e comprar os tecidos da Inglaterra. Na Inglaterra, o mesmo raciocínio funcionava de maneira simétrica: abrir mão de uma unidade de produção de tecidos era menos eficiente que especializar-se na produção de tecidos e comprar o vinho de Portugal. Assim, o comércio internacional sob condições de livre concorrência faria ambos os países especializarem-se na produção dos bens em que tinham maiores vantagens comparativas, e aumentaria o potencial de acumulação em ambos. A teoria das Vantagens Comparativas de Ricardo foi a base para a construção de toda uma vertente de teorias de comércio internacional que dominou por muito tempo o debate econômico. O atraente esquema lógico ricardiano fornecia o substrato para a defesa de um sistema de comércio mundial ancorado no padrão-ouro e no livre-cambismo. Se o sistema do padrão-ouro recebeu abalo definitivo após a Primeira Guerra Mundial, a teoria das vantagens comparativas ainda tinha muita força entre os economistas da maioria dos países na entrada dos anos 50, quando se iniciava a etapa da rápida industrialização nos países sub- desenvolvidos. E foi com ela que tiveram de dialogar os defensores da industrialização latino-americana, quando se tratava de demonstrar que seus países necessitavam industrializar-se — ainda que daí resul- tasse uma produção menos eficiente que a das indústrias congêneres dos países mais avançados. Para demonstrar o desacerto das proposi- ções retiradas do esquema ricardiano de vantagens comparativas, os economistas latino-americanos diziam que o universo ricardiano não podia funcionar perfeitamente nas condições que se apresentavam nas trocas entre os países centrais e a periferia, porque os pressupostos do livre-cambismo não ocorriam de maneira perfeita — nem os ganhos de produtividade ocorridos nos países centrais eram repassados aos preços dos produtos (a organização dos trabalhadores e o monopólio das novas tecnologias faziam reter estes lucros sob a forma de salários maiores, lucros extraordinários ou de repasses ao Estado de Bem-Es- tar), nem na periferia os ganhos de produtividade podiam ser retidos em função da desorganização do mercado de trabalho, pela heteroge- neidade entre os setores econômicos, etc. Ainda assim, veja-se que era tão hegemônico o esquema ricardiano, que suas críticas mais contun- dentes eram formuladas a partir de dentro da teoria, como “casos es- peciais” para os quais o universo ricardiano deixava de operar como esperado.

RICARDO

7. A teoria do Valor-Trabalho de Ricardo

Um último ponto do qual nos resta a falar nesta apresentação sobre a obra de Ricardo diz respeito à sua teoria do valor. Na tradição de Smith, Ricardo defendia a teoria do valor-trabalho, segundo a qual o valor de todas as mercadorias é determinado pela quantidade de trabalho incorporada nelas. É o trabalho e não a utilidade ou escassez, segundo a outra vertente de teoria do valor existente na época, que pode aquilatar o quanto uma mercadoria vale em comparação com as demais. Não é a utilidade, segundo Ricardo, porque este atributo deve existir em toda mercadoria, e a escassez também não pode ser o fator explicativo, pelo fato de que só é importante para definir o preço de alguns bens raros — como quadros, jóias e determinados vinhos —; no caso das mercadorias produzidas industrialmente, não existirá a escassez, desde que se arque com os custos de produzi-las. O trabalho é a contribuição efetivamente social do homem sobre as dádivas da natureza e, portanto, a única fonte real de todo o valor. Determinado este ponto, restava a Ricardo resolver algumas im- portantes objeções à teoria do valor-trabalho que haviam sido enfren- tadas de maneira insuficiente por Adam Smith. A primeira delas dizia respeito à incorporação de trabalhos de diferente qualificação e dife- rentes intensidades, tendo que ser reduzidos a um mesmo parâmetro de valor. Ricardo apontou para esta questão a engenhosa solução do trabalho incorporado, segundo a qual o capital (aqui entendido como máquinas e equipamentos) nada mais é do que um somatório de tra- balhos passados, e que o trabalho qualificado pode ser reduzido a um múltiplo do trabalho simples, se considerarmos que em sua formação entra também trabalho próprio e de outros. A segunda objeção, mais grave, dizia respeito à determinação dos preços relativos a partir do esquema do valor-trabalho. Numa situação em que, por exemplo, flutuasse o valor dos salários, teríamos uma modificação nas relações de troca, mesmo que as quantidades de trabalho permanecessem invariáveis. Ri- cardo respondia a esta objeção com o argumento de que poderia ser pensada uma mercadoria média que manteria seu valor, ainda que se modificasse o valor dos salários. Na média, o sistema manteria inalterada a partição entre salários e lucros pelo princípio da concorrência. É claro que tal resposta funcionou de maneira insatisfatória, pois introduzia na teoria uma circularidade: os valores como determinantes últimos da taxa de lucro e os valores como dependentes da taxa de lucro. Esta dificuldade seria enfrentada com sucesso por Marx em O Capital , ao demonstrar que o trabalho também era ele próprio uma mercadoria, mas uma mercadoria de tipo especial, adicionando seu valor integral às mercadorias, mas sendo vendido exatamente por seu valor de mercado — a quantidade de valor- trabalho necessária para reproduzi-lo.

OS ECONOMISTAS

BIBLIOGRAFIA

COUTINHO, Maurício C. (1993) Lições de Economia Política Clássica. Editora Hucitec/Editora da UNICAMP, Campinas, São Paulo. DOBB, Maurice (1973) Theories of Value and Distribution Since Adam Smith. Cambridge, Cambridge University Press. HUNT , E. K. (1984) História do Pensamento Econômico — Uma Pers- pectiva Crítica. Rio de Janeiro. Editora Campus. MARX , Karl (1983) O Capital. São Paulo, Editora Nova Fronteira. NAPOLEONI, Cláudio (1978) Smith, Ricardo e Marx. 2 ª edição. Rio de Janeiro, Edições Graal. RICARDO, David (1988) On The Principles of Political Economy and Taxation. The Works and Correspondence of David Ricardo (vol. I). Cambridge, Cambridge University Press. SINGER, Paul (1982) “Apresentação” in Ricardo — Princípios de Eco- nomia Política e Tributação. São Paulo. Editora Abril. SMITH, Adam (1983) A Riqueza das Nações. São Paulo. Editora Abril. SZMRECSÁNYI, Tamás (Org) (1982). Malthus. São Paulo. Editora Ática.

PRINCÍPIOS DE E CONOMIA

P OLÍTICA E T RIBUTAÇÃO*

Tradução de Paulo Henrique Ribeiro Sandroni

***** (^) Traduzido de RICARDO, David. On The Principles of Political Economy and Taxation. Edited by Piero Sraffa, with the collaboration of M. H. Dobb. In: The Works and Correspondence of David Ricardo. Cambridge, At the University Press for the Royal Economic Society, 1970. v. I. (Reimpressão da 1ª edição, 1951.) (N. do E.)

obras dos autores citados e após a valiosa experiência que os últimos anos, ricos em acontecimentos, proporcionaram à presente geração —, não se lhe atribuirá presunção, assim ele espera, por formular seus pontos de vista sobre as leis que regem os lucros e os salários, assim como sobre a incidência dos impostos. Se os princípios que ele considera corretos assim se confirmarem, caberá a outros mais capazes desen- volvê-los em todas as suas conseqüências importantes. Para combater opiniões aceitas, o autor julgou necessário assi- nalar mais particularmente aquelas passagens das obras de Adam Smith com as quais não está de acordo. Mas espera que não se pense, por esse motivo, que ele não participe, juntamente com todos aqueles que reconhecem a importância da Economia Política, da admiração que com justiça desperta a profunda obra desse celebrado autor. A mesma observação pode ser feita em relação aos excelentes trabalhos de Say, que, não apenas foi o primeiro, ou um dos primeiros autores continentais que corretamente examinaram e aplicaram os princípios de Smith, e que fez mais que todos os outros escritores continentais reunidos para recomendar às nações da Europa os prin- cípios daquele esclarecido e benéfico sistema; mas que, além disso, conseguiu também ordenar a ciência de modo mais lógico e instrutivo, enriquecendo-a ainda com várias contribuições originais, precisas e pro- fundas.^1 No entanto, o respeito que inspiram ao autor os escritos desse cavalheiro não o impediu de comentar, com a liberdade que considera necessária aos interesses da ciência, as passagens da Économie Poli- tique divergentes de suas idéias.

OS ECONOMISTAS

1 O capítulo XV, Parte Primeira, “Des débouchés”, contém, em particular, alguns princípios muito importantes, que eu creio terem sido pela primeira vez explicados por esse destacado autor. *** *** A referência é a 2ª edição, de 1814, do Traité d’Économie Politique de J. B. Say; o capítulo “Des débouchés” constava já na 1ª edição, de 1803 (Livro Primeiro. Cap. XXII). (N. da Ed. Inglesa.)

A DVERTÊNCIA À

TERCEIRA E DIÇÃO

N esta edição, procurei explicar mais detalhadamente do que na

anterior minha opinião sobre o difícil tema do “Valor”, e, com esse propósito, fiz algumas adições ao capítulo I. Introduzi também um novo capítulo sobre o tema “Maquinaria” e sobre os efeitos de seu aperfeiçoamento nos interesses das diferentes classes do Estado. No capítulo relativo às “Propriedades Distintivas do Valor e da Riqueza”, examinei as doutrinas de Say a respeito dessa importante questão, tais como aparecem corrigidas na quarta e última edição de sua obra. No último capítulo tentei formular, de acordo com um ponto de vista mais firme que antes, a doutrina da capacidade que tem um país de pagar impostos monetários adicionais, embora o valor monetário agre- gado da massa de suas mercadorias deva decrescer, quer em conse- qüência da redução da quantidade de trabalho necessária para a pro- dução nacional de cereais — como resultado de melhoramentos em seus cultivos —, quer da compra no exterior de um parte de seus cereais, a um preço mais baixo, mediante a exportação de seus manu- faturados. Essa questão tem grande importância, por associar-se ao tema de uma política que tende a manter livre a importação de cereais estrangeiros, especialmente num país sobrecarregado por elevado im- posto monetário fixo, resultante de uma imensa Dívida Nacional. Es- forcei-me para mostrar que a capacidade de pagar impostos depende não do valor monetário bruto da massa de mercadorias, nem do valor monetário líquido dos rendimentos dos capitalistas e dos proprietários de terras, mas do valor monetário do rendimento de cada homem, comparado com o valor monetário das mercadorias que ele habitual- mente consome.

26 de março de 1821

maneira para a nossa satisfação —, seria destituído de valor de troca, por mais escasso que pudesse ser, ou fosse qual fosse a quantidade de trabalho necessária para produzi-lo. Possuindo utilidade, as mercadorias derivam seu valor de troca de duas fontes: de sua escassez e da quantidade de trabalho necessária para obtê-las. Algumas mercadorias têm seu valor determinado somente pela es- cassez. Nenhum trabalho pode aumentar a quantidade de tais bens, e, portanto, seu valor não pode ser reduzido pelo aumento da oferta. Algumas estátuas e quadros famosos, livros e moedas raras, vinhos de qualidade peculiar, que só podem ser feitos com uvas cultivadas em terras especiais das quais existe uma quantidade muito limitada, são todos desta espécie. Seu valor é totalmente independente da quantidade de trabalho original- mente necessária para produzi-los, e oscila com a modificação da riqueza e das preferências daqueles que desejam possuí-los. Essas mercadorias, no entanto, são uma parte muito pequena da massa de artigos diariamente trocados no mercado. Sem dúvida, a maioria dos bens que são demandados é produzida pelo trabalho. E esses bens podem ser multiplicados não apenas num país, mas em vários, quase ilimitadamente, se estivermos dispostos a dedicar-lhes o trabalho necessário para obtê-los. Ao falar, portanto, das mercadorias, de seu valor de troca e das leis que regulam seus preços relativos, sempre nos referiremos somente àque- las mercadorias cuja quantidade pode ser aumentada pelo exercício da atividade humana, e em cuja produção a concorrência atua sem obstáculos. Nas etapas primitivas da sociedade, o valor de troca de tais mer- cadorias, ou a regra que determina que quantidade de uma deve ser dada em troca de outra, depende quase exclusivamente da quantidade comparativa de trabalho empregada a cada uma.

“O preço real de qualquer coisa”, diz Adam Smith, “o que realmente custa ao homem que deseja obtê-la, é a fadiga e o esforço de adquiri-la. O que qualquer coisa realmente vale para quem a obteve, e que deseja dispor dela ou trocá-la por qualquer outra, é a fadiga e o esforço que ela pode poupar-lhe, e que ele pode impor a outras pessoas. O trabalho foi o primeiro preço — a moeda original que serviu para comprar e pagar todas as coi- sas.”^3 Mais ainda, “Naquele primitivo e rude estado da sociedade que precede a acumulação do capital e a apropriação da terra, a proporção entre as quantidades de trabalho necessárias para adquirir diferentes objetos parece a única circunstância capaz de fornecer uma regra para trocá-los um por outro. Se numa nação de caçadores, por exemplo, caçar um castor custa geralmente o

OS ECONOMISTAS

3 Id., ibid. Livro Primeiro. Cap. V.

dobro do trabalho de abater um gamo, um castor deveria natu- ralmente ser trocado por, ou valer, dois gamos. É natural que aquilo que é habitualmente o produto do trabalho de dois dias ou de duas horas deva valer o dobro daquilo que é habitualmente o produto do trabalho de um dia ou de uma hora”.^4

Que este é realmente o fundamento do valor de troca de todas as coisas, à exceção daquelas que não podem ser multiplicadas pela atividade humana, eis uma doutrina de extrema importância na Eco- nomia Política; pois de nenhuma outra fonte brotam tantos erros nem tanta diferença de opinião, nesta ciência, quanto das idéias confusas que estão associadas à palavra valor. Se a quantidade de trabalho contida nas mercadorias determina o seu valor de troca, todo acréscimo nessa quantidade de trabalho deve aumentar o valor da mercadoria sobre a qual ela foi aplicada, assim como toda diminuição deve reduzi-lo. Adam Smith, que definiu com tanta exatidão a fonte original do valor de troca, e que coerentemente teve de sustentar que todas as coisas se tornam mais ou menos valiosas na proporção do trabalho empregado para produzi-las, estabeleceu também uma outra medida- padrão de valor, e se refere a coisas que são mais ou menos valiosas segundo sejam trocadas por maior ou menor quantidade dessa medi- da-padrão. Como medida-padrão ele se refere algumas vezes ao trigo, outras ao trabalho; não à quantidade de trabalho empregada na pro- dução de cada objeto, mas à quantidade que este pode comprar no mercado, como se ambas fossem expressões equivalentes e como se, em virtude de se haver tornado duas vezes mais eficiente o trabalho de um homem, podendo este produzir, portanto, o dobro da quantidade de uma mercadoria, devesse esse homem receber, em troca, o dobro da quantidade que antes recebia. Se isso fosse verdadeiro, se a remuneração do trabalhador fosse sempre proporcional ao que ele produz, a quantidade de trabalho em- pregada numa mercadoria e a quantidade de trabalho que essa mer- cadoria compraria seriam iguais e qualquer delas poderia medir com precisão a variação de outras coisas. Mas não são iguais. A primeira é, sob muitas circunstâncias, um padrão invariável, que mostra corre- tamente as variações nas demais coisas. A segunda é sujeita a tantas flutuações quanto as mercadorias que a ela sejam comparadas. Adam Smith, após haver mostrado habilmente a insuficiência de um meio variável, como o ouro e a prata, para a determinação do valor variável das outras coisas, acabou escolhendo uma medida não menos variável, ao eleger o trigo ou o trabalho. O ouro e a prata, indubitavelmente, estão sujeitos a flutuações

RICARDO

4 2d., ibid., Cap. VI