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DISSERTAÇÃO DE MESTRADO, Teses (TCC) de Literatura

MEMÓRIA, IDENTIDADE E REPRESENTAÇÃO SOCIAL: UMA LEITURA DE O ÚLTIMO CONHAQUE, DE CARLOS HERCULANO LOPES

Tipologia: Teses (TCC)

2018

Compartilhado em 23/05/2018

lydyane-almeida
lydyane-almeida 🇧🇷

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LYDYANE DE ALMEIDA MENZOTTI SILVA
MEMÓRIA, IDENTIDADE E REPRESENTAÇÃO SOCIAL: UMA
LEITURA DE O ÚLTIMO CONHAQUE, DE CARLOS HERCULANO
LOPES
2017
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LYDYANE DE ALMEIDA MENZOTTI SILVA

MEMÓRIA, IDENTIDADE E REPRESENTAÇÃO SOCIAL: UMA

LEITURA DE O ÚLTIMO CONHAQUE , DE CARLOS HERCULANO

LOPES

LYDYANE DE ALMEIDA MENZOTTI

SILVA

MEMÓRIA, IDENTIDADE E

REPRESENTAÇÃO SOCIAL: UMA LEITURA

DE O ÚLTIMO CONHAQUE , DE CARLOS HERCULANO

LOPES

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-

Graduação em Letras (Área de concentração:

Estudos Literários do Campus de Três Lagoas da

Universidade Federal de Mato Grosso do Sul –

UFMS, como requisito final para a obtenção do

título de Mestre em Letras.

Orientador: Prof. Dro. Ricardo Magalhães

Bulhões

TRÊS LAGOAS – MS

MARÇO – 2017

A Deus, meu guia! Ao Emerson, meu esposo e às minhas famílias. Dedico

AGRADECIMENTOS

Nesta página muito especial deste trabalho, gostaria de agradecer a algumas pessoas, dentre as muitas que ajudaram a realizá-lo. A Deus, por me guiar neste percurso e não deixar minha fé desfalecer. Ao meu esposo Emerson, meu amor, por estar sempre comigo, me apoiar e compreender minhas ausências. Reconheço sua paciência e seu amor, pois nos momentos mais difíceis, sempre esteve ao meu lado. Aos meus pais, Evandro e Noêmia; aos meus sogros, Ananias e Gizelda; ao meu enteado, Caio Vinicius, minha irmã Leyde Dayane e à minha família em geral. As amigas Nayra, Maria Izabel, Kátia, Lucas e Aline pelo companheirismo, pelas viagens acadêmicas, trocas acadêmicas e pessoais: pela nossa amizade. A minha amiga Jane que sempre me incentivou a nunca desistir. Aos meus professores, desde o ensino regular, por cada conhecimento e experiência. Ao Prof. Ricardo Magalhães Bulhões, a quem, muito além da orientação da dissertação, agradeço o apoio, a compreensão e paciência. Aos professores da Banca de Qualificação que leu atentamente este trabalho e muito contribui. Agradeço, ainda, a todos os professores do Programa de Pós-Graduação em Letras da UFMS, pelas trocas e discussões enriquecedoras, em especial ao Dr. Wagner Corsino Enedino pela companhia no estágio. A CAPES, por ter financiado parcialmente este trabalho, por meio da concessão de bolsa de estudo. Enfim, a todos aqueles que, de algum modo, contribuíram para que a realização deste fosse possível, expresso minha gratidão!

MENZOTTI, Lydyane de Almeida S. Memória, identidade e representação social: uma leitura de O último conhaque , de Carlos Herculano Lopes , Dissertação (Mestrado em Letras) - Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, Três Lagoas. 2017. RESUMO A globalização, os avanços da era tecnológica do mundo contemporâneo e o trauma de momentos históricos sociais, como a ditadura e o coronelismo no Brasil, têm provocado sentimentos de rupturas, fragmentação e tensão nos sujeitos. Esses sentimentos se refletem nas artes, e a literatura enquanto arte produz essas impressões por meio da palavra. No romance O último conhaque , do escritor mineiro Carlos Herculano Lopes, o protagonista recupera antigas lembranças que têm como cenário uma paisagem tipicamente rural em Santa Marta. Trata-se de um texto que narra a história desse homem desenraizado e atormentado pelas memórias de sua infância e que representa a metáfora do ser deslocado, em busca de identidade. Este trabalho tem como objetivo lançar um texto reflexivo abrangendo a relação entre identidade, memória, representação social, espaço, tempo, personagem, narrador e focalização, e os efeitos de sentido construídos no romance_._ As configurações estruturais do romance analisado estão intimamente ligadas aos processos de identificação do protagonista e estes, que por sua vez estão conectados a aspectos sociais, históricos e também psicológicos que constroem o enredo. A obra nos traz uma possível leitura de busca de identidade, a personagem representa uma sociedade que busca se (re)constituir enquanto sujeito. Respaldamo-nos nos autores Shøllhammer (2009), Ítalo Calvino (1998), Giorgio Aganbem (2010), Tania Pellegrinni (2001), Jaime Ginzburg (2012), Jeanne Marie Gagnebin (2006), Walter Benjamin (1994), Henri Bergson (1999), Le Goff (2003), Stuart Hall (2006), Antonio Candido (2000), Ginzburg (2010, 2012), entre outros. Foram utilizadas, obras de diferentes correntes críticas literárias. Para esta análise, elas não se contradizem, mas se completam, isso justifica o uso do ecletismo de perspectiva teórica. Nosso intuito foi o de contribuir para os estudos de literatura contemporânea, assim como às pesquisas referentes a fortuna crítica do autor Carlos Herculano Lopes. Palavras-chave: Memória; Identidade; O último conhaque; Carlos Herculano Lopes; Contemporâneo.

Resumen

La globalización, los avances en la era de la tecnología del mundo contemporáneo y el trauma social de los momentos históricos, como la dictadura y los Coroneles en Brasil han causado sentimientos de interrupción, la fragmentación y la tensión en el tema. Estos sentimientos se reflejan en las artes y la literatura como arte produce estas impresiones através de la palabra. En la novela O último conhaque , del escritor minero Carlos Herculano Lopes, el protagonista recupera viejos recuerdos que tienen como telón de fondo un paisaje rural típico en Santa Marta. Es un texto que cuenta la historia de este hombre sin raíces, atormentado por los recuerdos de su infancia y que representa la metáfora de ser desplazados en busca de la identidad. Este trabajo tiene como objetivo poner en marcha un texto reflexivo que cubre la relación entre la identidad, la memoria, la representación social, espacio, tiempo, personaje, narrador y el foco, y los efectos de los significados construidos en la novela. Las nuevas configuraciones estructurales analizadas están estrechamente vinculados al protagonista del proceso de identificación y éstos, que a su vez están conectados a social, histórico y psicológico también la construcción de la trama. El trabajo nos lleva un posible lectura de la búsqueda de la identidad, el personaje es una sociedad que busca la forma como sujeto. Nos Respaldamo en autores: Shøllhammer (2009), Ítalo Calvino (1998), Giorgio Aganbem (2010), Tania Pellegrinni (2001), Jaime Ginzburg (2012), Jeanne Marie Gagnebin (2006), Walter Benjamin (1994), Henri Bergson (1999 ), Le Goff (2003), Stuart Hall (2006), Antonio Candido (2000), Ginzburg (2010, 2012), entre otros. Fueron utilizados, obras de diferentes corrientes de la crítica literaria. Para este análisis, que no contradigan, sino que se complementan, que justifica el uso del eclecticismo perspectiva teórica. Nuestro objetivo era contribuir a los estudios de la literatura contemporánea, así como la investigación sobre la fortuna crítica del autor Carlos Herculano Lopes. Palabras clave: Memoria; Identidad; O último conhaque; Carlos Herculano Lopes; Contemporáneo.

INTRODUÇÃO

Neste espaço destinado à “introdução”, apresentaremos, primeiramente, a nossa compreensão de que seja literatura e de como tratamos a produção literária existente, para, então, assinalarmos como essa concepção contribuiu para que chegássemos até aqui e quais os caminhos trilhados durante a pesquisa. Entendemos que todo o ser humano desempenha uma função em uma determinada comunidade como sujeitos, assim formando juntos uma comunidade discursiva. Esse discurso é visto como interlocução que os sujeitos estabelecem entre si e compartilham questionamentos que variam nas diversas comunidades, situadas em tempos e espaços particulares. Segundo Antonio Candido (2000), quando tratamos do discurso literário também lidamos com o discurso de uma sociedade. Tratamos de uma lembrança que também une essa comunidade discursiva enquanto voz que se manifesta sobre o texto. Ademais, esse discurso mesmo que possa ser analisado como um objeto exclusivo de si, constitui também um diálogo com outros textos e comunidades, desencadeando um conjunto de associações diversas. O discurso literário de que aqui se fala é levado à comunidade por meio do escritor que “não é apenas o indivíduo capaz de exprimir a sua originalidade [...] mas alguém desempenhando um papel social ” (CANDIDO, 2000, p. 67). Candido (2000) aponta que a obra produzida pelo escritor caracteriza “um diálogo mais ou menos vivo entre o criador e o público”, pois: A literatura é, pois, um sistema vivo de obras, agindo umas sobre as outras e sobre os leitores; e só vive na medida em que estes a vivem, decifrando-a, aceitando-a, deformando-a. a obra não é um produto fixo, unívoco ante qualquer público; nem este é passivo, homogêneo, registrando uniformemente o seu efeito. São dois termos que atuam um sobre o outro, e aos quais se junta o autor, termo inicial desse processo de circulação literária, para configurar a realidade da literatura atuando no tempo (CANDIDO, 2000, p. 68). Os indivíduos são influenciados pelas obras que leem e no mesmo sentido influenciam a sociedade por meio das leituras e das interpretações que fazem delas. Assim, a literatura não toma a obra literária em si, nem como mero reflexo da estrutura social, mas a considera numa relação dialética: Com efeito, entendemos por literatura, neste contexto, fatos eminentemente associativos; obras e atitudes que exprimem certas relações dos homens entre si, e que, tomadas em seu conjunto, representam uma socialização dos seus impulsos íntimos. Toda obra é pessoal, única e insubstituível, na medida em que brota de uma confidência, um esforço de pensamento, um assomo de intuição, tornando-se “expressão”. A literatura, porém, é coletiva, na medida em que requer uma certa comunhão de meios expressivos (a palavra, a imagem), e mobiliza afinidades

profundas que congregam os homens de um lugar e de um momento – para chegar a uma “comunicação” (CANDIDO, 2000, p. 127). Nesse sentido, confirmamos que a literatura leva em si experiências, vivências humanas e conhecimentos da vida e do real. A sua leitura aguça tanto a consciência individual, como coletiva. Sob essa perspectiva, Todorov (2009, p.76), em Literatura em perigo salienta que “A literatura pode muito. Ela pode nos estender a mão quando estamos profundamente deprimidos, nos tornar ainda mais próximos dos outros seres humanos”. Dessa forma, acreditamos que um dos fatores transformadores na formação do cidadão é a leitura literária: “Não que ela seja, antes de tudo, uma técnica de cuidados para a alma; porém, revelação do mundo, ela pode também, em seu percurso, nos transformar a cada um de nós a partir de dentro” (TODOROV, 2009, p.76). Mais adiante, Todorov (2009) acrescenta “a literatura é pensamento e conhecimento do mundo psíquico e social em que vivemos. A realidade que a literatura aspira compreender é, simplesmente [...], a experiência humana.” (Idem, p. 77), assim corroborando com Candido (2004) sobre a literatura como fator de humanização: Entendo por humanização o processo que confirma no homem aqueles traços que reputamos essenciais, como o exercício da reflexão, a aquisição do saber, a boa disposição para com o próximo, o afinamento das emoções, a capacidade de penetrar nos problemas da vida, o senso da beleza, a percepção da complexidade do mundo e dos seres, o cultivo do humor. A literatura desenvolve em nós a quota de humanidade na medida em que nos torna mais compreensivos e abertos para a natureza, a sociedade, o semelhante (CANDIDO, 2004. p.180). Quando o homem se apoia na palavra organizada, ordena melhor sua mente e seus sentimentos e, consequentemente, pode organizar melhor a concepção de mundo que tem. Em suma, é por meio da leitura que a maior parte do conhecimento ainda é oferecida ao homem. Ler é significar, conhecer, interpretar, decifrar, distinguir, duvidar, questionar o texto, permitindo que o leitor, opte pelo que for mais representativo e sugestivo para ele, utilizando o conhecimento que lá se encontra como fonte de novas ideias e de saber. Conforme Coelho (2000, p. 10): [...] pode-se afirmar que a literatura é a mais importantes das artes, pois sua matéria é a palavra (o pensamento, as ideias, a imaginação), exatamente aquilo que distingue ou define a especificidade do humano. Além disso , sua eficácia como instrumento de formação do ser está diretamente ligada a uma das atividades básicas do indivíduo em sociedade: a leitura (grifos nossos). O leitor assimila o conhecimento por meio dos processos de busca, assimilação, retenção, crítica, verificação e comparação das informações que estão impregnados no texto sendo influenciado por ele, e ao mesmo tempo o leitor com suas experiências influencia o texto.

No subtítulo 1.2 Violência e representação social , apresentamos como é abordada a violência e como é representada socialmente no romance. Nos fundamentamos em Antonio Candido (2000), Ginzburg (2010, 2012) e para respaldo sobre o coronelismo Victor Nunes Leal (1975) e Edgard Carone (1976). Penetrar no universo romanesco de Carlos Herculano de Oliveira Lopes, sem conhecer alguns momentos de sua trajetória, seria um percurso incompleto para compreensão da análise aqui proposta. De início, para elucidarmos a questão que norteou essa parte da pesquisa, quem é o autor de O último conhaque? e para respondermos a esse questionamento abordamos no capítulo II - O escritor - um levantamento do autor, suas obras. Por se tratar de um autor não canônico, entretanto não desconhecido, há poucos materiais em que pudéssemos nos respaldar para concluir esse capítulo. Por isso, nos valemos de resumos cronológicos dos romances publicados do autor, entrevistas divulgadas na internet e na obra 21 escritores brasileiros de Suênio Campos de Lucena (2001). Como nossa proposta aqui é estabelecer relação com os temas apresentados nessa introdução e os capítulos seguintes, com os elementos estruturais componentes da narrativa coube-nos questionar como o autor utiliza esses elementos para tal. Para chegar a isso, foi preciso desmontar as unidades que compõe O último conhaque. Segundo Moises (2007, p.13), “analisar o corpo humano significa fragmentá-lo nas unidades que o compõem: cabeça, tronco e membros; a cabeça, por sua vez, apresenta orelhas, olhos, boca, nariz, testa, ossos temporais”, dessa forma, no capítulo III – A interpretação da obra: (re)construção de sentido – fragmentamos os elementos estruturais da narrativa (enredo, narrador, personagem, narrador/focalização, tempo, espaço) apoiados nos teóricos específicos de cada categoria para então concluir a leitura proposta. Nos ancoramos em autores que consideramos adequadas para nossa análise. Nos valemos de Osman Lins (1976), Gaston Bachelard (1978), Antonio Candido (1989, 2000, 2004), Gerald Genette (1972), Mendilow (1972), Jean Pouillon (1974), Benjamin (1994), entre outros. Feito esse percurso, apresentamos as reflexões na Considerações finais, mostramos como um autor contemporâneo se utiliza das regras estruturais da narrativa para amplificar os efeitos de sentido provocados na construção da memória, retratar a sociedade e a busca pela (re)construção identitária do protagonista, por meio da procura incessante imagética de seu falecido pai. Neste trabalho não existe apenas o uso de uma corrente crítica literária. Foram utilizadas, diversas obras pertencentes a correntes distintas. Para esta análise, elas não se contradizem, mas se completam, isso justifica o uso do ecletismo de perspectiva teórica.

No que trata a escolha de trabalhar com o autor Carlos Herculano Lopes temos o seguinte: o meu gosto^1 pela literatura foi aumentado conforme eu ia crescendo. Por isso mesmo, cursei Letras. No período em que graduava na Universidade Estadual do Mato Grasso, tive contato com professores que espalhavam amor pela literatura. No projeto Artset, no qual era bolsista, foi exibido o filme O vestido, direção de Paulo Thiago. A prof. Me. Shirlene Rhor de Souza, orientadora do projeto, ao apresentar a argumentação do filme e mencionar que era adaptação de um romance (baseado no poema do Carlos Drummond de Andrade) fiquei surpresa por conhecer a forma como o autor trabalhou os elementos narrativos nessa obra e veza adaptação do poema. Mais tarde, aqui no programa de pós-graduação, meu orientador me apresentou um autor, que de início pensei ser desconhecido por mim. Ele mencionou que Carlos Herculano Lopes era um autor contemporâneo e que apesar de ter obras com prêmios literários, era pouco conhecido nacionalmente e ao pesquisar sobre sua vida, fiquei feliz por constatar que o romance O vestido era do referido autor, pois já havia me esquecido. Acrescentado ao gosto de trabalhar com aquele autor, que tempos atrás havia despertado meu interesse por suas obras, mas na correria de ler as “obrigatórias” acabei não lendo e nem tendo mais contato com as obras de Carlos Herculano Lopes, seus romances provocaram em mim uma necessidade de investigar como os autores contemporâneos estruturavam suas obras e de que forma construíam a memória. Vimos então a possibilidade de contribuir para os estudos de literatura contemporânea e fortuna crítica de Carlos Herculano Lopes. Escolhemos trabalhar com O último conhaque , por ser um romance que não há registros no banco da Capes de dissertações e teses, e nem em pesquisas na internet encontramos artigos ou análises da referida obra. (^1) Foi inevitável o uso da primeira pessoa gramatical.

da comunicação, quanto os “chatos herméticos”, os que se fecham na intransitividade da própria criação: “O essencial é observar que essa escrita se guia por uma ambição de eficiência e pelo desejo de chegar a alcançar uma determinada realidade em vez de se propor como uma mera pressa ou alvoroço temporal” (SHØLLHAMMER, 2009, p. 11). Neste sentido, o “alvoroço temporal” e a insistência do tempo presente em vários escritores, mais recente da geração, transparece uma preocupação pela criação da própria presença, ou seja, a dificuldade presente é lidar com a urgência e a velocidade de tudo que acontece e que os escritores contemporâneos têm em se relacionar com a realidade histórica “[...] estando consciente, entretanto, da impossibilidade de captá-la na sua especificidade atual, em seu presente” (SHØLLHAMMER, 2009, p. 10). As novas tecnologias criam caminhos para que a exposição seja mais rápida, por exemplo os blogs que facilitam a divulgação dos textos literários, fazendo que o mercado tradicional de divulgação seja driblado. Dentre os escritores que utilizaram esse método de divulgação acelerado, primeiramente antes de seguir o modo tradicional, Karl Erick Shøllhammer (2009) cita: Ana Paula Maia, Daniel Galera, Ana Maria Gonçalves e Clarah Averbuck. Como consequências dessa urgência e rapidez, entre os escritores contemporâneos, nos vemos diante de uma literatura de formas complexas, fragmentadas, curtas e cada vez mais híbrida. Shøllhammer (2009), corrobora: De modo geral, percebe-se, nos escritores da geração mais recente, a intuição de uma impossibilidade, algo que estaria impedindo-os de intervir e recuperar a aliança com a atualidade e que coloca o desafio de reinventar as formas históricas do realismo literário numa literatura que lida com os problemas do país e que expõe as questões mais vulneráveis do crime, da violência, da corrupção e da miséria (SHØLLHAMMER, 2009, p. 14). Diante dos estudos de Shøllhammer (2009), podemos perceber as características que aproximam a produção literária brasileira, no período de 1960 ao presente, como: interesse pelo regionalismo, realismo, intimismo existencial e psicológico, experimentalismo linguístico, metaliteratura e reinvenção das formas literárias. Salientamos que essas manifestações que se configuram dentro de um novo tipo de realismo não se refere ao realismo do século IXX, mas nota-se em tais manifestações uma grande procura de referencialidade. No romance contemporâneo, o autor, ainda, retrata o passado buscando evidenciar o fato histórico ao invés dos detalhes, da fiel representação das personagens e suas ações, disseminando uma série de artimanhas ficcionais, que vão desde a ambiguidade à presença do fantástico. De acordo a autora Tania Pellegrini, em Ficção Brasileira Contemporânea: assimilação ou resistência? (2001):

Ele interpreta o fato histórico, lançando mão de uma série de artimanhas ficcionais, que vão desde a ambiguidade até a presença do fantástico, inventando situações, deformando fatos, fazendo conviver personagens reais e fictícios, subvertendo as categorias de tempo e espaço, usando meias-tintas, subtextos e intertextos – recursos da ficção e não da história - , trabalhando, enfim, não no nível do que foi, mas no daquilo que poderia ter sido (PELLEGRINI, 2001, p. 60). Segundo Esteves (1998), a questão de identidade tem sido uma preocupação recorrente na literatura latino-americana e é uma das marcas principais do novo romance histórico^2 latino- americano: A busca da identidade passa, então, pela releitura da história tradicional que aparece, muitas vezes, parodiada ou carnavalizada, numa verdadeira sinfonia onde se notam, concomitantemente, várias vozes. São vozes tidas, durante muito tempo, como dissonantes que, agora juntas, tentam dar uma visão mais completa da complexa realidade americana (ESTEVES, 1998, p. 144). Tais reflexões são úteis para percebemos outro tipo de recurso que os escritores contemporâneos utilizam para retratar a busca social pela identidade. Por meio da ambiguidade e ironia encontram uma forma para delatar momentos históricos traumáticos, como por exemplo a ditadura militar. No Brasil, muitos autores consideram o Golpe de 64, um marco na Literatura Brasileira Contemporânea. Como, por exemplo, Bastos (2000), que reflete sobre a censura e sua influência na literatura brasileira, sendo responsável, inclusive, pelo surgimento de novos gêneros literários: As diversas formas de realismo irrealista surgidas nos século XX – realismo mágico, fantástico, o maravilhoso, o absurdo, o surreal – pulverizaram esse preceito naturalista, como expressivamente foi o caso do romance hispano-americano. [...] No caso da literatura contemporânea, como tal entendida, neste trabalho, aquela produzida nos anos 60/70, é fora de dúvida que uma das linhas de forças é precisamente o aproveitamento da matéria de extração histórica, tomando o golpe de 64 e seus desdobramentos como elemento nuclear, quer se trate de vertente do romance histórico e seus correlatos (“romance de fundação”, “metaficção historiográfica”, por exemplo), quer se trate do romance político (BASTOS, 2000, p. 12 - 3). O romance histórico faz uma releitura da História, enquanto a metaficção a faz como paródia. Conforme Esteves (1998), é importante salientar que tanto a metaficção historiográfica quanto os romances históricos contemporâneos são narrativas históricas, ambas têm como base um fato histórico anterior ao momento da produção. Portanto, nem todo romance histórico (^2) Salientamos que o objeto de estudo deste trabalho não se trata de um romance histórico, no entanto, julgamos pertinente trazer essas considerações, já que nesta parte do trabalho estamos abordando de forma geral a produção literária a partir da segunda metade do século XX aos dias de hoje, ficando a parte específica nos subitens 1.1 e 1.2.

rupturas e tensões têm provocado na humanidade, resultado da globalização, seus avanços e da era tecnológica do século XX e XXI: Que impacto tem a última fase da globalização sobre as identidades nacionais? Uma de suas características principais é a "compressão espaço-tempo", a aceleração dos processos globais, de forma que se sente que o mundo é menor e as distâncias mais curtas, que os eventos em um determinado lugar têm um impacto imediato sobre pessoas e lugares situados a uma grande distância. [...] O que é importante para nosso argumento quanto ao impacto da globalização sobre a identidade é que o tempo e o espaço são também as coordenadas básicas de todos os sistemas de representação. Todo meio de representação — escrita, pintura, desenho, fotografia, simbolização através da arte on dos sistemas de telecomunicação — deve traduzir seu objeto em dimensões espaciais e temporais (HALL, 2006, p. 18-19). Percebemos que esse sentimento de ruptura tenha se refletido nas artes, e a literatura enquanto arte tem produzido essas impressões mediante a palavra. Hall (2006) faz uma reflexão que aborda a noção de identidade, em vista do contexto histórico contemporâneo e procura avaliar a possível existência de uma crise de identidade nesse momento. Segundo o teórico, o sujeito pós-moderno é um sujeito fragmentado, composto não só de uma identidade, mas de várias, que muitas vezes se contradizem: A identidade, nessa concepção sociológica, preenche o espaço entre o "interior" e o "exterior"— entre o mundo pessoal e o mundo público. O fato de que projetamos a "nós próprios" nessas identidades culturais, ao mesmo tempo que internalizamos seus significados e valores, tornando- os "parte de nós", contribui para alinhar nossos sentimentos subjetivos com os lugares objetivos que ocupamos no mundo social e cultural. A identidade, então, costura (ou, para usar uma metáfora médica, "sutura") o sujeito à estrutura. Estabiliza tanto os sujeitos quanto os mundos culturais que eles habitam, tornando ambos reciprocamente mais unificados e predizíveis (HALL, 2006, p.2). Tais ponderações nos mostram o efeito deslocador da globalização nas identidades centradas e fechadas de uma cultura nacional. Esse efeito altera as identidades fixas, tornando- as diversas. É nesse deslocamento que surge a compreensão de culturas híbridas, entre a tradição e a tradução^3 , como um dos diversos tipos de identidades destes tempos de modernidade. Hall (2006) apresenta, ainda, conceitos de David Harvey para argumentar sobre a "compressão espaço-tempo" como resultado da globalização. O aceleramento dos processos globais, trouxe a sensação que o mundo e as distâncias têm diminuído, encurtado. Os (^3) Esses conceito se referem aos abordados por Stuart Hall (2006). Outro terno que Hall (2006) usa em usa obra é o de “raízes” para estabelecer essas práticas que são passadas de geração à geração. No entanto, salientamos que o ato de perder o vínculo com a sua tradição e se dispersar da sua terra natal, Hall (2006) chama de Tradução que do latim, significando "transferir"; "transportar entre fronteiras". Esses conceitos serão retomados no decorrer no trabalho.

acontecimentos têm um grande impacto sobre as pessoas e os lugares, trazendo a representação da literatura por intermédio do tempo e do espaço. Segundo ele: O que é importante para nosso argumento quanto ao impacto da globalização sobre a identidade é que o tempo e o espaço são também as coordenadas básicas de todos os sistemas de representação. Todo meio de representação — escrita, pintura, desenho, fotografia, simbolização através da arte on dos sistemas de telecomunicação — deve traduzir seu objeto em dimensões espaciais e temporais (HALL, 2006, p. 73). Conforme explicita Stuart Hall (2006) no fragmento, todo meio de representação de arte se traduz na exposição do tempo e espaço. É nesse sentido, que a tradução cultural se configura, uma vez que o sujeito se desloca no tempo e espaço. Hall (2006) define como tradução cultural, o processo de transação entre novos e antigos costumes culturais, vivenciado por pessoas que migraram de sua terra natal. As pessoas perdem completamente suas originais identidades por não assimilarem a nova cultura que tem diante si. No entanto, precisam dialogar com as duas realidades distintas: Este conceito descreve aquelas formações de identidade que atravessam e intersectam as fronteiras naturais, compostas por pessoas que foram dispersadas para sempre de sua terra natal. Essas pessoas retêm fortes vínculos com seus lugares de origem e suas tradições, mas sem a ilusão de um retorno ao passado. Elas são obrigadas a negociar com as novas culturas em que vivem, sem simplesmente serem assimiladas por elas e sem perder completamente suas identidades. Elas carregam os traços das culturas, das tradições, das linguagens e das histórias particulares pelas quais foram marcadas. A diferença é que elas não são e nunca serão unificadas no velho sentido, porque elas são, irrevogavelmente, o produto de várias histórias e culturas interconectadas, pertencem a uma e, ao mesmo tempo, a várias "casas" (e não a uma "casa" particular). As pessoas pertencentes a essas culturas híbridas têm sitio obrigadas a renunciar ao sonho ou à ambição de redescobrir qualquer tipo de pureza cultural "perdida" ou de absolutismo étnico (HALL,2006, p.24). De acordo o pensamento exposto por Hall (2006), as identidades culturais em transformação são o resultado do encontro entre diferentes tradições culturais do mundo globalizado. Em O último conhaque, pela narração notamos essa construção identitária da personagem principal quando pela primeira vez tem contato com outra cultura: “À cidade de São Paulo que passaria também a ser sua” (LOPES, 1995, p. 89 ), estabelecendo o contato com as duas culturas: a rural^4 (Santa Marta) e a Urbana (São Paulo). Na passagem abaixo, é descrito o momento em que Juarez, companheiro de sua tia Ruth, lhe apresenta São Paulo, como é costume de quem mora na capital, mostrar a cidade aos do interior: E, uma vez, de motocicleta, o levou ao Jardim Zoológico e, na volta, de tardezinha, passaram no Monumento aos Bandeirantes e no Parque do Ibirapuera. Lá, ele lhe (^4) Caracterizamos a cidade de Santa Marta como rural por se tratar de uma cidade de interior com características campestre, pastoril. Essas descrições serão notadas no decorrer do nosso trabalho.