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Guias e Dicas
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conceitos de saúde e doença, Manuais, Projetos, Pesquisas de Cultura

Artigo Científico

Tipologia: Manuais, Projetos, Pesquisas

2014

Compartilhado em 24/01/2014

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Rev. enferm. UERJ, Rio de Janeiro, 2009 jan/mar; 17(1):111-7. • p.111
Backes MTS, Rosa LM, Fernandes GCM, Becker SG, Meirelles BHS, Santos SMA
Artigo de Revisão
Review Article
Artículo de Revisión
Recebido em: 06.11.2008 - Aprovado em: 18.12.2008
RESUMO: RESUMO:
RESUMO: RESUMO:
RESUMO: O presente artigo busca compreender como são abordados os conceitos e as idéias relacionados à saúde e à
doença desenvolvidos hoje e ao longo da história, fundamentados na perspectiva epidemiológica e antropológica, através
de um estudo de revisão baseado na bibliografia disponível. O modelo biomédico ainda é predominante e os profissionais
da saúde precisam superar esse modelo de assistência à saúde centrado na doença, voltado para o diagnóstico e a
terapêutica, o tecnicismo e as relações impessoais. É necessário investir em novo modelo de atenção focalizado na promo-
ção da saúde. A grande questão atual é promover a saúde, fortalecer a autonomia dos sujeitos, com respeito às diferenças,
potencializando as capacidades individuais, sociais e coletivas, levando em conta o contexto real em que as pessoas vivem,
trabalham e fazem a vida acontecer. É preciso também rever a formação dos profissionais da área, preparando-os para esse
novo modelo de atenção à saúde.
Palavras-chave: Palavras-chave:
Palavras-chave: Palavras-chave:
Palavras-chave: Saúde; doença; epidemiologia; antropologia.
ABSTRACTABSTRACT
ABSTRACTABSTRACT
ABSTRACT::
::
: This article aims at understanding health and disease-related concepts from a historical standpoint under an
epidemiological and anthropological perspective, through a revision of available literature. The biomedical model is still
predominant, and health professionals must overcome disease-focused health care, exclusively concerned with diagnosis,
therapy, techniques, and impersonal relationships. One must invest in a new model of care focused on health promotion.
The great issue today is to promote health, strengthen the autonomy of subjects, with respect for differences, empowering
individual, social, and collective capacities, and taking into account the context in which people live, work, and make life
happen. We must also rethink the education of health professionals, preparing them for this new model of health care.
Keywords:Keywords:
Keywords:Keywords:
Keywords: Health; disease, epidemiology, anthropology.
RESUMEN: RESUMEN:
RESUMEN: RESUMEN:
RESUMEN: Este artículo busca comprender como son abordados los conceptos y las ideas relacionadas a la salud y a
la enfermedad desarrollados hoy y a lo largo de la historia, fundamentados en la perspectiva antropológica y epidemiológica,
a través de un estudio de revisión, basado en la bibliografía disponible. El modelo biomédico todavía es predominante y
los profesionales de la salud necesitan superar ese modelo de asistencia a la salud centrado en la enfermedad y orientado
hacía el diagnóstico y la terapéutica, el tecnicismo y las relaciones impersonales. Es necesario invertir en un nuevo
modelo de atención focalizado en la promoción de la salud. El gran asunto actual es promover la salud, fortalecer la
autonomía de los sujetos, con respecto a las diferencias, potencializando las capacidades individuales, sociales y colectivas,
llevando en cuenta el contexto real en que las personas viven, trabajan y hacen la vida acontecer. Es preciso también
rever la formación de los profesionales de la salud, preparándolos para eso nuevo modelo de atención a la salud.
Palabras clave: Palabras clave:
Palabras clave: Palabras clave:
Palabras clave: Salud, enfermedad, epidemiología, antropología.
CONCEITOS DE SAÚDE E DOENÇA AO LONGO DA HISTÓRIA
SOB O OLHAR EPIDEMIOLÓGICO E ANTROPOLÓGICO
CONCEPTS OF HEALTH/DISEASE ALONG HISTORY UNDER THE LIGHT OF
EPIDEMIOLOGY AND ANTHROPOLOGY
CONCEPTOS DE SALUD Y ENFERMEDAD A LO LARGO DE LA HISTORIA
DESDE LA MIRADA EPIDEMIOLÓGICA Y ANTROPOLÓGICA
Marli Terezinha Stein BackesI
Luciana Martins da RosaII
Gisele Cristina Manfrini FernandesIII
Sandra Greice BeckerIV
Betina Hörner Schlindwein MeirellesV
Sílvia Maria de Azevedo dos SantosVI
IDoutoranda do Programa de Pós-Graduação em Enfermagem da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Enfermeira da Secretaria Municipal
da Saúde de Capão do Leão/RS. Membro do Grupo de Pesquisa de Administração em Enfermagem e Saúde (GEPADES) da UFSC. Florianópolis, SC,
Brasil. E-mail: marli.backes@bol.com.br.
IIDoutoranda do Programa de Pós-Graduação em Enfermagem da UFSC. Enfermeira do Centro de Pesquisas Oncológicas/SES/SC. Membro do Grupo
de Pesquisa Cuidando e Confortando – PEN/UFSC. Florianópolis, SC, Brasil. E-mail: luciana.tb@hotmail.com.
IIIDoutoranda do Programa de Pós-Graduação em Enfermagem da UFSC. Enfermeira. Bolsista do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e
Tecnológico (CNPq). Membro do Núcleo de Extensão e Pesquisa em Enfermagem e Promoção da Saúde (NEPEPS). Florianópolis, SC, Brasil. E-mail:
gisamanfrini@yahoo.com.br.
IVDoutoranda do Programa de Pós-Graduação em Enfermagem da UFSC. Enfermeira. Docente da Universidade Federal do Amazonas EEM/UFAM.
Líder do NIPES/UFAM e membro do NUPEQUIS/UFSC. Florianópolis, SC, Brasil. E-mail: sgbecker@ufam.edu.br.
VDoutora em Filosofia da Enfermagem. Enfermeira, Professora do Departamento e do Programa de Pós-Graduação em Enfermagem da UFSC. Florianópolis,
SC, Brasil. Membro do GEPADES. E-mail: betinahsm@ig.com.br.
VIDoutora em Educação. Enfermeira, Professora do Departamento e do Programa de Pós-Graduação em Enfermagem da UFSC. Membro do Grupo de
Estudos sobre cuidados em saúde de pessoas idosas (GESPI). Florianópolis, SC, Brasil. E-mail: silvia@nfr.ufsc.br.
VII Estudo produzido a partir de um dos temas abordados na Disciplina Processo de Viver e a Saúde Humana do Doutorado em Enfermagem do Programa
de Pós-Graduação em Enfermagem da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC).
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Rev. enferm. UERJ, Rio de Janeiro, 2009 jan/mar; 17(1):111-7. • p.

Artigo de Revisão Backes MTS, Rosa LM, Fernandes GCM, Becker SG, Meirelles BHS, Santos SMA Review Article Artículo de Revisión

Recebido em: 06.11.2008 - Aprovado em: 18.12.

RESUMO:RESUMO:RESUMO:RESUMO:RESUMO: O presente artigo busca compreender como são abordados os conceitos e as idéias relacionados à saúde e à doença desenvolvidos hoje e ao longo da história, fundamentados na perspectiva epidemiológica e antropológica, através de um estudo de revisão baseado na bibliografia disponível. O modelo biomédico ainda é predominante e os profissionais da saúde precisam superar esse modelo de assistência à saúde centrado na doença, voltado para o diagnóstico e a terapêutica, o tecnicismo e as relações impessoais. É necessário investir em novo modelo de atenção focalizado na promo- ção da saúde. A grande questão atual é promover a saúde, fortalecer a autonomia dos sujeitos, com respeito às diferenças, potencializando as capacidades individuais, sociais e coletivas, levando em conta o contexto real em que as pessoas vivem, trabalham e fazem a vida acontecer. É preciso também rever a formação dos profissionais da área, preparando-os para esse novo modelo de atenção à saúde. Palavras-chave:Palavras-chave:Palavras-chave:Palavras-chave:Palavras-chave: Saúde; doença; epidemiologia; antropologia.

ABSTRACTABSTRACTABSTRACTABSTRACTABSTRACT:::: This article aims at understanding health and disease-related concepts from a historical standpoint under an: epidemiological and anthropological perspective, through a revision of available literature. The biomedical model is still predominant, and health professionals must overcome disease-focused health care, exclusively concerned with diagnosis, therapy, techniques, and impersonal relationships. One must invest in a new model of care focused on health promotion. The great issue today is to promote health, strengthen the autonomy of subjects, with respect for differences, empowering individual, social, and collective capacities, and taking into account the context in which people live, work, and make life happen. We must also rethink the education of health professionals, preparing them for this new model of health care. Keywords:Keywords:Keywords:Keywords:Keywords: Health; disease, epidemiology, anthropology.

RESUMEN:RESUMEN:RESUMEN:RESUMEN:RESUMEN: Este artículo busca comprender como son abordados los conceptos y las ideas relacionadas a la salud y a la enfermedad desarrollados hoy y a lo largo de la historia, fundamentados en la perspectiva antropológica y epidemiológica, a través de un estudio de revisión, basado en la bibliografía disponible. El modelo biomédico todavía es predominante y los profesionales de la salud necesitan superar ese modelo de asistencia a la salud centrado en la enfermedad y orientado hacía el diagnóstico y la terapéutica, el tecnicismo y las relaciones impersonales. Es necesario invertir en un nuevo modelo de atención focalizado en la promoción de la salud. El gran asunto actual es promover la salud, fortalecer la autonomía de los sujetos, con respecto a las diferencias, potencializando las capacidades individuales, sociales y colectivas, llevando en cuenta el contexto real en que las personas viven, trabajan y hacen la vida acontecer. Es preciso también rever la formación de los profesionales de la salud, preparándolos para eso nuevo modelo de atención a la salud. Palabras clave:Palabras clave:Palabras clave:Palabras clave:Palabras clave: Salud, enfermedad, epidemiología, antropología.

CONCEITOS DE SAÚDE E DOENÇA AO LONGO DA HISTÓRIA

SOB O OLHAR EPIDEMIOLÓGICO E ANTROPOLÓGICO

CONCEPTS OF HEALTH/DISEASE ALONG HISTORY UNDER THE LIGHT OF

EPIDEMIOLOGY AND ANTHROPOLOGY

CONCEPTOS DE SALUD Y ENFERMEDAD A LO LARGO DE LA HISTORIA

DESDE LA MIRADA EPIDEMIOLÓGICA Y ANTROPOLÓGICA

Marli Terezinha Stein BackesI Luciana Martins da RosaII Gisele Cristina Manfrini FernandesIII Sandra Greice BeckerIV Betina Hörner Schlindwein MeirellesV Sílvia Maria de Azevedo dos SantosVI

IDoutoranda do Programa de Pós-Graduação em Enfermagem da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Enfermeira da Secretaria Municipal da Saúde de Capão do Leão/RS. Membro do Grupo de Pesquisa de Administração em Enfermagem e Saúde (GEPADES) da UFSC. Florianópolis, SC, Brasil. E-mail: marli.backes@bol.com.br. IIDoutoranda do Programa de Pós-Graduação em Enfermagem da UFSC. Enfermeira do Centro de Pesquisas Oncológicas/SES/SC. Membro do Grupo de Pesquisa Cuidando e Confortando – PEN/UFSC. Florianópolis, SC, Brasil. E-mail: luciana.tb@hotmail.com. IIIDoutoranda do Programa de Pós-Graduação em Enfermagem da UFSC. Enfermeira. Bolsista do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Membro do Núcleo de Extensão e Pesquisa em Enfermagem e Promoção da Saúde (NEPEPS). Florianópolis, SC, Brasil. E-mail: gisamanfrini@yahoo.com.br. IVDoutoranda do Programa de Pós-Graduação em Enfermagem da UFSC. Enfermeira. Docente da Universidade Federal do Amazonas EEM/UFAM. Líder do NIPES/UFAM e membro do NUPEQUIS/UFSC. Florianópolis, SC, Brasil. E-mail: sgbecker@ufam.edu.br. VDoutora em Filosofia da Enfermagem. Enfermeira, Professora do Departamento e do Programa de Pós-Graduação em Enfermagem da UFSC. Florianópolis, SC, Brasil. Membro do GEPADES. E-mail: betinahsm@ig.com.br. VIDoutora em Educação. Enfermeira, Professora do Departamento e do Programa de Pós-Graduação em Enfermagem da UFSC. Membro do Grupo de Estudos sobre cuidados em saúde de pessoas idosas (GESPI). Florianópolis, SC, Brasil. E-mail: silvia@nfr.ufsc.br. VII (^) Estudo produzido a partir de um dos temas abordados na Disciplina Processo de Viver e a Saúde Humana do Doutorado em Enfermagem do Programa de Pós-Graduação em Enfermagem da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC).

ArtigosArtigosArtigosArtigosArtigos dedededede R e v i s ã oR e v i s ã oR e v i s ã oR e v i s ã oR e v i s ã o

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Conceitos de saúde/doença na história Artigo de Revisão Review Article Artículo de Revisión

INTRODUÇÃO

A vida se manifesta através da saúde e da doençaVII, que são formas únicas, experiências subje- tivas e que não podem ser manifestadas integralmen- te através de palavras. No entanto, a pessoa doente utiliza palavras para expressar a sua doença e os pro- fissionais da saúde, por sua vez, também fazem uso de palavras para significar as queixas dos pacientes. Des- sa maneira, surge tensão entre a subjetividade da do- ença e a objetividade dos significados atribuídos pelos profissionais às queixas do paciente e que o levam a propor intervenções para lidar com esta situação^1.

O discurso sanitário com enfoque na saúde ainda é recente. A idéia de saúde como qualidade de vida condicionada por vários fatores, tais como: paz, abrigo, alimentação, renda, educação, recursos econômicos, ecossistema estável, recursos sustentáveis, equidade e justiça social, surgiu com a Conferência Internacional sobre a Promoção da Saúde, em Ottawa, em1986.

A Carta de Ottawa^2 considera a saúde como um conceito positivo, para o qual se fazem necessários recur- sos pessoais, sociais e capacidade física. Assim, para se ter saúde, a responsabilidade vai além do setor saúde, pois exige estilo de vida saudável para atingir o bem- estar. Sob este prisma, as comunidades e os indivíduos precisam aprender a cuidar da sua saúde, para então melhorá-la. Tal fato deve demandar dos indivíduos e dos grupos a capacidade de identificar os seus problemas, satisfazer as suas necessidades, modificar ou adaptar-se ao meio e, consequentemente, atingir o bem-estar.

A Organização Mundial da Saúde define a saú- de como um completo bem-estar físico, social e men- tal e não apenas ausência de doenças, conceito esse que evoluiu^3 , pois saúde, em sua concepção amplia- da, é o resultado das condições de alimentação, mo- radia, educação, meio ambiente, trabalho e renda, transporte, lazer, liberdade e, principalmente, acesso aos serviços de saúde, conforme a VIII Conferência Nacional de Saúde, realizada no Brasil, em 1986^4.

Nesse sentido, direito à saúde significa a garan- tia, pelo Estado, de condições dignas de vida e de aces- so universal e igualitário às ações e serviços de promo- ção, proteção e recuperação da saúde, em todos os seus níveis, a todos os habitantes do território nacio- nal, levando ao desenvolvimento pleno do ser huma- no em sua individualidade^4.

Embora a conceituação positiva de saúde tenha trazido contribuições significativas tanto no plano teóri- co quanto prático, a mesma traz novas dificuldades, pois envolve a promoção da vida em suas múltiplas dimen- sões e nenhuma teoria é capaz de dar conta da totalida- de dos fenômenos da saúde e do adoecer. No entanto, sendo a vida mais complexa do que os conceitos que lhe são atribuídos, é justamente através dos conceitos que as intervenções operativas são viabilizadas^1.

Hoje, diante da necessidade de compreender- mos a saúde em suas diferentes dimensões, com o enfoque voltado para a promoção e proteção da saú- de, considerando as práticas mais integradoras em saú- de, bem como as desigualdades sociais que impedem o acesso aos serviços de saúde e à informação por par- te da população como um todo, consideramos impor- tante, como profissionais da área, uma revisão biblio- gráfica do tema proposto. Entendemos que essa compreensão nos dará sub- sídios para sermos atores transformadores da nossa pró- pria saúde e da saúde dos indivíduos, família e da po- pulação atendida através da nossa prática profissio- nal, seja como profissionais da saúde e/ou como for- madoras de novos profissionais. Assim, o objetivo do presente estudo é compreen- der como são abordados os conceitos e as idéias relaci- onados à saúde e à doença desenvolvidas hoje e ao lon- go da história, a partir das perspectivas epidemiológica e antropológica, através de um estudo de revisão. A pesquisa bibliográfica abrangeu artigos publi- cados em periódicos de saúde pública, saúde coletiva e enfermagem, a partir das palavras-chave: saúde, doença, epidemiologia e antropologia, bem como a produção do período de 1983 a 2008.

EVOLUÇÃO CONCEITUAL

Descreveremos a seguir os conceitos e as ideias de saúde e doença desenvolvidos ao longo da história e na contemporaneidade.

Saúde e Doença ao Longo da História

A natureza da saúde e da medicina representa um reflexo de muitos teóricos médicos, entre eles pode- se citar Galeno, médico grego que documentou o co- nhecimento e a especulação médica de sua época. Uma de suas idéias que permanece na humanidade desde a Antiguidade é a saúde como equilíbrio entre as partes primárias do corpo^5. Na antiguidade clássica, Galeno estabeleceu a teoria das latitudes de saúde, que se divide em saúde, estado neutro e má-saúde. Estas dimensões podem ocorrer isoladamente ou em combinação de uma com as outras. Assim, nove combinações são possíveis. Este esquema foi utilizado por mais de mil anos na medici- na ocidental^5. Ainda na Antiguidade, acreditava-se que as doenças poderiam ser causadas por elementos natu- rais ou sobrenaturais. Nesse período, a compreensão das doenças era através da filosofia religiosa. Na me- dicina hindu e chinesa, a doença é resultante do desequilíbrio do organismo humano (causas naturalizadas). As causas eram relacionadas ao ambi- ente físico, aos astros, ao clima, aos insetos e aos ani- mais. Para os gregos, fatores externos ocasionavam as

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Conceitos de saúde/doença na história Artigo de Revisão Review Article Artículo de Revisión

O OLHAR EPIDEMIOLÓGICO

O olhar central da epidemiologia foca as causas das doenças, como é estudado a seguir. Para se des- vendar as causas, faz-se necessário conhecer as con- dições concretas e a história relacionadas à existência do ser humano^6.

O ser humano possui a capacidade de reagir aos agentes agressores, mantendo a homeostase. Assim, o conceito de saúde envolve a reação aos estímulos ex- ternos de modo favorável que, ao agirem sobre os se- res vivos, abrangem aspectos físicos, psicológicos e so- ciais, de maneira interdependente^10.

Entretanto, na abordagem contemporânea sobre o adoecer, ainda há o predomínio da dimensão bioló- gica em detrimento das dimensões psíquicas e sociais, provocando uma redução na configuração do campo da saúde^8.

Embora haja o reconhecimento de que os aspec- tos psíquicos e sociais, o meio ambiente e o estilo de vida contribuam na origem das doenças, ainda se co- nhece pouco sobre a relação entre esses fatores ou eventos e a doença, que são avaliadas por meio de estudos epidemiológicos de risco^11.

A epidemiologia como instrumento de investi- gação é útil para avaliar a assistência prestada aos usu- ários nos serviços de saúde, verificar o perfil socioeconômico e de morbidade da população, anali- sar as condições de saúde do trabalhador, fornecendo subsídios para intervenções mais efetivas no processo saúde/doença^12 , entre outros.

O conhecimento epidemiológico apresenta ca- ráter nuclear na consolidação das práticas de saúde pública. No entanto, a sua elaboração conceitual está baseada na lógica mecanicista e linear relacionada ao discurso preventivo e, por este motivo, apresenta limi- tações. Por isso o grande desafio atual na saúde é bus- car integrar a epidemiologia e a promoção da saúde^1.

O conceito epidemiológico de risco hoje é moti- vo de críticas, baseadas em questionamentos que en- volvem valores e significados relacionados a determi- nados hábitos e comportamentos considerados como de risco e de agravos à saúde. Dessa maneira, é preci- so ampliar a compreensão dos limites desses concei- tos, com o objetivo de aprimorar métodos, criar novos conceitos que possam ser utilizados de forma mais apro- priada e integrada, com a finalidade de estruturar as práticas de saúde na perspectiva da promoção^1.

As ações preventivas, que têm como base o co- nhecimento epidemiológico moderno, são intervenções que visam evitar o aparecimento de doenças específi- cas, reduzindo a sua incidência e prevalência. Seu objetivo é controlar a transmissão de doenças e a re- dução do risco das doenças e os projetos de prevenção e educação em saúde estão voltados para a divulga-

ção das informações científicas e de recomendações normativas que envolvem mudanças de hábitos^1. Resumidamente, o objeto da epidemiologia está subordinado à clínica médica, que encara o sujeito com base no discurso fisiopatológico. As dimensões subjetivas do indivíduo, como a psicopatológica e psicossomática, não são consideradas relevantes, por não disporem de precisão diagnóstica, validade e confiabilidade que são alcançadas pelos componentes clínico-laboratoriais^13.

O OLHAR ANTROPOLÓGICO

As contribuições antropológicas para a compre- ensão do fenômeno saúde-doença são analisadas nes- ta seção. Enquanto para a epidemiologia clássica as idéias de risco e causalidade de doença se expressam no pla- no individual e biológico, a antropologia pode contri- buir e relativizar estes sentidos, através de estudos voltados para as relações entre saúde e condições de vida, incorporando também a visão dos usuários dos serviços de saúde^14. Os modelos de saúde, doença e cuidado resul- tam da história social e são herdados culturalmente, não podendo ser reduzidos à experiência individual, mas envolvem a coletividade, seus valores e costumes, de maneira que quando um indivíduo adoece, toda a família se envolve^15. Dessa maneira, também as crenças e as práticas de cuidado em saúde nascem e se desenvolvem no contexto social, influenciam-se mutuamente e fazem parte da dinâmica que proporciona a adaptação do ser humano ao seu entorno, através da cultura^16. Quando avaliamos o ser humano, identificamos que os estados de normalidade oscilam conforme a in- terferência de inúmeras variáveis, tais como: situações de descanso, de exercícios, relacionadas à idade, ao sexo, à raça, à cultura, ao ambiente, entre tantas ou- tras variáveis possíveis de serem vivenciadas. As oscila- ções, em muitos casos, não podem ser vistas como anor- mais, porque entre aquela realidade ou exposição, cons- tituem-se variantes normais. Então, é preciso lembrar que o incomum nem sempre é negativo ou anormal^5. Outro ponto que merece ênfase é o conceito de valor que cada indivíduo dá à saúde e à influência do próprio estado de doença, inclusive a crônica, que desencadeia mudanças de hábitos, levando a uma vida mais saudável. O conhecimento científico contribui para a caracterização da saúde e das doenças, mas suas verdades não podem ser estanques, mas devem ser analisadas entre as possíveis variabilidades^5. Além disso, precisamos ainda levar em consideração tam- bém, as práticas de cuidado e autocuidado de cada indivíduo e cultura.

Rev. enferm. UERJ, Rio de Janeiro, 2009 jan/mar; 17(1):111-7. • p.

Artigo de Revisão Backes MTS, Rosa LM, Fernandes GCM, Becker SG, Meirelles BHS, Santos SMA Review Article Artículo de Revisión

Recebido em: 06.11.2008 - Aprovado em: 18.12.

Estudo realizado em uma comunidade de Cuiabá/ MT constatou que, no que se refere ao cuidado com a saúde-doença, os moradores dessa localidade costumam adotar primeiramente os recursos que lhes são mais pró- ximos e mais condizentes com a sua realidade, geral- mente utilizando os recursos da natureza, como as plantas e a benzeção, podendo também utilizar os recursos da medicina oficial, principalmente a auto-medicação. Dessa forma, a procura por profissionais da saúde geral- mente ocorre em última instância, sem o abandono da terapêutica adotada inicialmente (plantas e/ou rituais) e todas as práticas de saúde são consideradas comple- mentares. Embora reconheçam as limitações da medi- cina popular e não confiem totalmente na medicina convencional, atribuem a esta última a obrigação de solucionar os problemas de saúde e doença que as prá- ticas populares não conseguem resolver^17.

Desde as antigas organizações sociais tem-se buscado a resolução dos agravos à saúde humana por meio de práticas, valores, crenças e recursos popula- res. Por outro lado, no contexto da saúde-doença, há também outros tipos de terapias utilizadas na preven- ção e resolução dos problemas de saúde, que são as terapias não alopáticas^18 , ou seja, as terapias alternati- vas ou o tratamento não convencional, através da homeopatia, acupuntura, reiki, cromoterapia, toque terapêutico e outros.

A doença possui caráter histórico e social, sendo que a natureza social se verifica no modo característi- co de adoecer e morrer nos grupos humanos, havendo diferenças nos perfis patológicos ao longo dos tempos, resultantes das transformações da sociedade e, tam- bém, dentro de uma mesma sociedade, as classes que a compõem mostrarão condições de saúde diversas, de acordo com o momento histórico^19.

Aspectos econômicos, políticos, socioculturais, socioepidemiológicos e históricos influenciam o pro- cesso de viver e a saúde humana e os modos de vida, de trabalho e de produção são fundamentais para se compreender os processos de saúde, adoecimento e morte da população^20.

Quando se leva em conta a relação saúde/cultu- ra, deve-se pensar não apenas na biomedicina, ou modelo biomédico, cujo enfoque é a biologia humana e a fisiopatologia, que vê a doença como um processo biológico. Há outras propostas ou modelos alternati- vos, como dos chineses, hindus ou índios. Nesse senti- do, as discussões mais recentes na antropologia ques- tionam o modelo biomédico e concebem a saúde e a doença como processos psicobiológicos e socioculturais. Nessa abordagem, a doença não é vista como um pro- cesso apenas biológico/corporal, mas também como o resultado do contexto cultural e a experiência subje- tiva de aflição^21.

No Brasil, nos últimos 15 anos, vem sendo reafir- mada a necessidade de respeito às culturas e aos sa-

beres e práticas de saúde dos povos indígenas. No en- tanto, atualmente, nas áreas indígenas ainda predo- mina a atenção massificada à saúde, sem levar em conta as suas especificidades étnicas e suas práticas de auto- atenção, e a base para a prestação de serviços é o mo- delo biomédico hegemônico, em que os profissionais da saúde, geralmente não estão capacitados para atu- ar com modelos de atenção que levam em conta as abordagens integrais^14. A formação dos profissionais da saúde, voltada para o biologicismo e o individualismo, faz com que os mesmos não levem em conta as referências socioculturais que poderiam transformar os usuários em agentes de transformação da realidade social^14. As produções culturais, especialmente as dos gru- pos sociais considerados subalternizados, geralmente são vistas como comportamentos irracionais e condutas de risco que representam obstáculos na adoção correta de cuidados biomédicos e os profissionais de saúde, quan- do se interessam em conhecer a sua cultura e seus sis- temas de doença e cura, o fazem com a finalidade de aplicar receitas para moldar comportamentos, baseado no modelo médico-científico. Além disso, esse poder e autoridade exercidos sobre essas culturas representam uma busca de adequação do modelo de assistência às necessidades do desenvolvimento capitalista^14. Dessa forma, para muitos profissionais da saúde, essas idéias podem representar avanços para os problemas de não- adesão dos usuários aos programas de saúde. Apesar de o índio aceitar e reconhecer a eficácia da biomedicina em determinadas doenças, aceitando os recursos oferecidos, principalmente no caso dos fármacos, ele não deixa as suas próprias práticas de cura. E isso é visto de forma preconceituosa pelos observado- res brancos ou não índios, que afirmam que a cultura indígena apresenta duas categorias de doenças: a do- ença dos índios, que os fazem recorrer aos especialistas nativos e a doença do branco, que precisa do remédio. Isso também reforça o velho preconceito em relação ao pensamento do índio, que é visto como incapaz de mu- dar sua visão de mundo, que resolve sua experiência de contato, mantendo sua cultura separada das outras cul- turas, o que remete a um conceito de cultura sem a possibilidade de transformação^21. Estudos voltados para uma epidemiologia sensí- vel aos aspectos antropológicos, consideram o proces- so saúde-doença como um resultado de forças bioló- gicas, econômicas, sociais e políticas^14. Diante das dificuldades dos sistemas médico-ci- entíficos em lidar com a produção social da saúde e doença, a antropologia pode nos ajudar a compreen- der os modos de vida^22 e das práticas de auto-aten- ção^23. Os profissionais da saúde e os antropólogos pre- cisam ampliar a sua compreensão a respeito da impor- tância e do significado da atenção diferenciada quando atuam com diferentes culturas^14.

Rev. enferm. UERJ, Rio de Janeiro, 2009 jan/mar; 17(1):111-7. • p.

Artigo de Revisão Backes MTS, Rosa LM, Fernandes GCM, Becker SG, Meirelles BHS, Santos SMA Review Article Artículo de Revisión

Recebido em: 06.11.2008 - Aprovado em: 18.12.

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