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Guias e Dicas
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Civilização face ao direito, Esquemas de Direito Penal

Fontes de direito público e privado

Tipologia: Esquemas

2025

Compartilhado em 06/07/2025

constantino-jose-wandalica
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FUNDAMENTOS TEOLÓGICOS DO DIREITO
Perguntar hoje sobre os fundamentos teológicos do direito pode parecer, à primeira vista, uma
questão puramente religiosa, sem perspectivas, na prática, de ciências de direito.
Mas olhando para “o grau de aceitação, respeito e cumprimento dos direitos, na realidade da
vida social e cultural dos nossos dias, nos leva à investigação do fundamento teológico do direito, para
encontrar na “experiência quotidiana do que está acontecendo com o homem e seus direitos mais
elementares ao longo do processo geopolítico do planeta. Tal processo é de tal gravidade que obriga a
consciência moral da sociedade e dos indivíduos, particularmente daqueles que têm qualquer tipo de
responsabilidade social, pública ou privada, a interrogar-se sobre as razões profundas do que está a
acontecer à pessoa
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A percepção que se tem é que “todos estes fenómenos revelam uma imoralidade e uma
desumanidade radicais: a do desprezo pelo próprio homem e a da negação brutal da dignidade das
pessoas, que encontra a sua expressão mais perversa e odiosa em vários actos terroficos
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e que resulta
do esquecimento de Deus e até o seu desprezo; e na “negação sistemática dos direitos do homem o que
leva a humanidade a um abismo sem retorno
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a) Os ensinamentos e princípios cristãos, como a lei natural
Neste ponto, dirigimos o nosso olhar para o pensamento do Card. Antonio Rouco Varela, que
no seu artigo sobre Los Fundamentos de los Derechos Humanos: Una cuestión urgente, nos
apresente um contributo valioso para a compreensão dos ensinamentos e princípios cristãos sobre os
fundamentos dos direitos e sua relação com a lei natural.
O sucesso do direito natural é confirmado, em primeiro lugar, na literatura filosófico-jurídica e
no contexto da teoria geral do direito. Entretanto, afirma-se que o seu estudo também encontra um
novo eco na teologia
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A teologia católica do direito natural se tornar a chave da construção sistemática da doutrina
social da Igreja na nova etapa iniciada pelo abundante Magistério Pontifício de Pio XII, caracterizada
pela confluência de problemas de direitos humanos e de democracia
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O Magistério de João XXIII, com as suas duas Encíclicas Mater et Magistra (1991) e Pacem
in Terris (1993), deu forma histórica actualizada àquela doutrina social integral que culminou nos
ensinamentos do Concílio Vaticano II, especialmente na Declaração Dignitatis humanae (1965), sobre
a liberdade religiosa, e na Constituição pastoral Gaudium et Spes (1965), sobre a Igreja no mundo de
hoje.
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VARELA, Antonio Maria Rouco, Teología y Derecho, Ed. Cristiandad, Madrid, 2002
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FUNDAMENTOS TEOLÓGICOS DO DIREITO

Perguntar hoje sobre os fundamentos teológicos do direito pode parecer, à primeira vista, uma questão puramente religiosa, sem perspectivas, na prática, de ciências de direito.

Mas olhando para “o grau de aceitação, respeito e cumprimento dos direitos, na realidade da vida social e cultural dos nossos dias, nos leva à investigação do fundamento teológico do direito, para encontrar na “experiência quotidiana do que está acontecendo com o homem e seus direitos mais elementares ao longo do processo geopolítico do planeta. Tal processo é de tal gravidade que obriga a consciência moral da sociedade e dos indivíduos, particularmente daqueles que têm qualquer tipo de responsabilidade social, pública ou privada, a interrogar-se sobre as razões profundas do que está a acontecer à pessoa”^1.

A percepção que se tem é que “todos estes fenómenos revelam uma imoralidade e uma desumanidade radicais: a do desprezo pelo próprio homem e a da negação brutal da dignidade das pessoas, que encontra a sua expressão mais perversa e odiosa em vários actos terroríficos”^2 e que resulta do esquecimento de Deus e até o seu desprezo; e na “negação sistemática dos direitos do homem o que leva a humanidade a um abismo sem retorno”^3.

a) Os ensinamentos e princípios cristãos, como a lei natural Neste ponto, dirigimos o nosso olhar para o pensamento do Card. Antonio Rouco Varela, que no seu artigo sobre “ Los Fundamentos de los Derechos Humanos: Una cuestión urgente ”, nos apresente um contributo valioso para a compreensão dos ensinamentos e princípios cristãos sobre os fundamentos dos direitos e sua relação com a lei natural.

O sucesso do direito natural é confirmado, em primeiro lugar, na literatura filosófico-jurídica e no contexto da teoria geral do direito. Entretanto, afirma-se que o seu estudo também encontra um novo eco na teologia^4.

A teologia católica do direito natural se tornar a chave da construção sistemática da doutrina social da Igreja na nova etapa iniciada pelo abundante Magistério Pontifício de Pio XII, caracterizada pela confluência de problemas de direitos humanos e de democracia^5.

O Magistério de João XXIII, com as suas duas Encíclicas Mater et Magistra (1991) e Pacem in Terris (1993), deu forma histórica actualizada àquela doutrina social integral que culminou nos ensinamentos do Concílio Vaticano II, especialmente na Declaração Dignitatis humanae (1965), sobre a liberdade religiosa, e na Constituição pastoral Gaudium et Spes (1965), sobre a Igreja no mundo de hoje.^6

(^1) VARELA, Antonio Maria Rouco, Teología y Derecho , Ed. Cristiandad, Madrid, 2002 (^2) Idem (^3) Idem (^4) Idem (^5) Idem (^6) Idem

A doutrina do Concilio Vaticano II é, sobretudo, definitivamente clara sobre qual é o fundamento filosófico-teológico dos direitos humanos, ao explicar as raízes transcendentais da dignidade da pessoa humana, os seus componentes antropológicos e as suas exigências éticas no social e no jurídico.

A categoria da dignidade da pessoa humana constitui a mesma essência da Declaração sobre a liberdade religiosa e da sua tese primordial, quando diz: “todos os homens, em conformidade com a sua dignidade, ao serem pessoas, isto é, dotados de razão e vontade livre, e sujeitos à responsabilidade pessoal, são sujeitos de direito para liberdade religiosa que deve ser reconhecida na ordem jurídica da sociedade, na forma que se converte em direito civil”^7. E a iluminação da mais profunda dignidade da pessoa humana, como criatura feita à imagem de Deus, salva por Cristo, e o desenvolvimento das suas implicações sócio-jurídicas constituem o objecto central da Constituição conciliar Gaudium et spes.

O Concílio não hesitou em afirmar que “na realidade, o mistério do ser humano só se esclarece no mistério do Verbo encarnado, e que a ordem social e o progresso devem estar subordinados ao bem das pessoas, já que a ordenação das coisas deve ser análoga à ordem pessoal e não o contrário, porque o princípio, o sujeito e o fim de todas as instituições sociais são e devem ser a pessoa humana”.^8

b) Os Dez Mandamentos e sua influência na formação do direito ocidental Os fundamentos teológicos dos direitos estão vinculados aos dez mandamentos. A necessidade do homem conviver com o outro, levou-o a fazer do direito um a realidade natural do mesmo. Disto resulta que o ser humano é por natureza social e em consequentemente ser jurídico.

Mas o orgulho humano o levou a usurpar o direito do outro, a maltratá-lo, a submete-lo e a exercer sobre o outro um domínio insuportável e desumanizante. É nesta circunstância que surge a necessidade reflexão sobre estes actos, e reconhecer a autoridade divina, que esta acima de todos os homens, e que afinal todos nós somos suas obras. Por isso, o nosso proceder deve ser equivalente e merecedor dos mesmos direitos e deveres.

Desta feita, os primeiros direitos com este pendor procuram busca a fonte das suas leis na lei natural e na lei divina.

É prova desta afirmação a existência do direito hebraico, cujas características são: sua referência religiosa, as leis são dadas directamente por Deus, a imutalibilidade das leis e a possiblidade de interpretação.

E no seu conteúdo, nos encontramos as leis fundamentais: em Êx. 20, 1- 17 , se faz a apresentação solene da fonte legal do direito hebraico.

1. Então Deus pronunciou todas estas palavras: 2. "Eu sou Javé seu Deus, que fiz você sair da terra do Egito, da casa da escravidão. 3. Não tenha outros deuses diante de mim. 4. Não faça para você ídolos, nenhuma representação daquilo que existe no céu e na terra, ou nas águas que estão debaixo da terra. 5. Não se prostre diante desses deuses, nem sirva a eles, porque eu, Javé seu Deus, sou um Deus ciumento: quando me odeiam, castigo a culpa dos pais nos filhos, netos e bisnetos;

(^7) Dignitatis Huamanae (^8) Gaudium et spes , n.

essenciais e, por conseguinte, indirectamente, os direitos fundamentais inerentes à natureza da pessoa humana. O Decálogo encerra uma expressão privilegiada da «lei natural»:

No princípio, Deus admoestou os homens com os preceitos da lei natural, que tinha enraizado nos seus corações, isto é, pelo Decálogo. Se alguém não os cumprisse, não se salvaria. E Deus não exigiu mais nada aos homens».

Embora acessíveis à simples razão, os preceitos do Decálogo foram revelados. Para atingir um conhecimento completo e certo das exigências da lei natural, a humanidade pecadora precisava desta revelação:

«Uma explicação completa dos mandamentos do Decálogo tornou-se necessária no estado de pecado, por causa do obscurecimento da lei da razão e do desvio da vontade» (21)

Nós conhecemos os mandamentos de Deus pela revelação divina que nos é proposta na Igreja e pela voz da consciência moral.

A obrigação do decálogo

Uma vez que exprimem os deveres fundamentais do homem para com Deus e para com o próximo, os Dez Mandamentos revelam, no seu conteúdo primordial, obrigações graves. São basicamente imutáveis e a sua obrigação impõe-se sempre e em toda a parte. Ninguém pode dispensar-se dela. Os Dez Mandamentos foram gravados por Deus no coração do ser humano.

Mas a obediência aos mandamentos também implica obrigações cuja matéria, em si mesma, é leve. Assim, a injúria por palavras é proibida pelo quinto mandamento, mas só poderá ser falta grave em razão das circunstâncias ou da intenção de quem a profere.^11

Em conclusão, os dez mandamentos ao exprimirem os direitos fundamentais do homem, terão uma influência muito forte na evolução histórica da compreensão dos direitos, sobretudo, os direitos humanos que vão atingir a sua máxima exibição na Declaração Universal dos Direitos Humanos, os quais perfazendo os 30 artigos, serão postos ao alcance de todas as nações desde o dia 10 de Dezembro de 1948, na Assembleia Geral da ONU.

Deste este ponto, o cristianismo forjou uma “chamada civilização ocidental ainda é conhecida como civilização cristã. Os valores sobre os quais ela se erigiu são aqueles fornecidos pelo Cristianismo, nutrido em sólida tradição judaica”^12.

(^11) Idem, nn. 2070 -2074. (^12) Nalini (2015, págs. 131-132), in Revista Jus Navigandi , As influências do Cristianismo na Ética e no Direito Brasileiro:breves reflexões.

c) A fraternidade universal Lembremos que o próprio lema da Revolução Francesa – Liberdade, Igualdade e Fraternidade

  • albergava, além do valor da autonomia humana (liberdade), de inspiração clássica, os valores da igualdade e da fraternidade universal, cuja inspiração é inegavelmente cristã. [...] Desse modo, a fraternidade, isto é, o “reconhecimento do outro como semelhante, ainda que diferente”, acaba por ser afirmada, conforme ensina José Luiz Borges Horta,

como o novo valor central do Estado de direito, inaugurando a era da cidadania mundial, o que exigia, pois, sua universalização, estendendo, por conseguinte, os seus valores a toda humanidade. (RAMOS, 2010, p. 70)

Assim, com inspiração em valores cristãos, a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão significou um grande avanço para a sociedade francesa, já que garantia direitos sociais, igualdade, liberdade e fraternidade a todos os cidadãos, conferindo, ainda, uma maior participação política para o povo.

d) A dignidade da pessoa humana A defesa da dignidade da pessoa humana, sempre teve a intenção da promoção da paz, da solidariedade, igualdade, fraternidade, perdão, tolerância. E sobre estes valores consolidados na esfera jurídica, objetiva-se demonstrar que todos são oriundos do Cristianismo, constituindo-se um desmembramento do maior mandamento cristão de amar a Deus e ao próximo.

A palavra "pessoa" vem do latino persona, que significa ressonante; personare é equivalente a "som alto", faça-se ouvir. O que parece relacionar esta palavra ao prosopon grego, que significava "rosto" e também "máscara" (trágica ou cômica) que os actores de teatro colocavam, e - ao mesmo tempo que os disfarçava como a personagem que representavam -, servia eles de amplificador de voz. A concavidade da máscara reforçava a voz, escondia o actor, e através da máscara o actor também "re- apresentava" um personagem. Pois bem, em latim, a palavra "personare" ao indica um som que tem a força necessária para se destacar, acaba significando efectivamente a coisa mais marcante do universo: o ser inteligente, com entendimento racional. Por outro lado, a palavra "dignidade" também significa, fundamental e principalmente, "preeminência", "excelência" (excellere, destacar-se). Digno é aquilo pelo qual algo se destaca entre outros seres, por causa de seu próprio valor. Portanto, a rigor, falar em "dignidade da pessoa" é um pleonasmo, ou talvez uma redundância intencional, para destacar ou sublinhar a altura do posto que esse tipo de ser ocupa na ordem do universo. "Digno" é aquilo que deve ser tratado com "respeito", isto é, "com consideração" (respectus), com veneração.

Sucesso e crise de Dignidade Pessoal

Hoje quase ninguém nega em teoria que todo homem é uma "pessoa". Houve tempo em que se discutiu se a mulher era; ou se negros, índios e escravos em geral tivessem "alma". Tratava-se de elucidar - ou confundir, dependendo do caso - a igualdade ou desigualdade radical entre todos os seres humanos. Hoje, as expressões "dignidade humana", "dignidade pessoal", "direitos humanos" estão sendo amplamente utilizadas, e isso é bom.

E embora eu não pense que a dignidade da pessoa não possa ser percebida à parte da fé cristã, é facto é que a perda do sentido dessa dignidade coincide com a perda do sentido cristão da vida e do amor, com a ou prática de Deus o Criador.

" Hipostasia" e "Substância "

Vale ressaltar que, quando os autores cristãos abordaram filosoficamente o estudo da pessoa, não tomaram como ponto de referência as expressões latinas e gregas a que nos referimos acima. A noção de pessoa na filosofia cristã é incomparavelmente superior à dos clássicos. Os cristãos usavam o termo grego hypostasis, que se traduz como "substância" ou "propriedade". A famosa definição de Boécio, tão influente - pessoa é uma substância individual de natureza racional -, parte da noção aristotélica de "ousia", "substância", destinada principalmente às coisas em geral. Uma substância é um ser que subjaz e sustenta um conjunto de modalidades ou "acidentes" que lhe são inerentes, mas não é inerente a nada, mas ela mesma é ou pode ser objeto de integração de outras realidades como quantidade e qualidades. de vários tipos. Por "pessoa" entende-se na filosofia medieval uma hipóstase ou supositum, que como tal é indistinguível de outras substâncias, mas cuja natureza é racional. O que torna a pessoa um ser superior não é o facto de ser uma substância, um sujeito subsistente (em si e não em outro), mas a racionalidade. A pessoa é uma substância individual de natureza racional. A racionalidade é entendida como uma qualificação da substância que a eleva acima de todas as outras e lhe confere uma excelência que merece uma “consideração” particular.

A Filosofia Cristã dá um Passo de Gigante

O cristianismo não foi apenas a área em que o estudo da pessoa, como tal, avançou extraordinariamente, mas foi também onde se descobriu em profundidade o seu valor excelente, a sua dignidade incomparável. Quando se vê a racionalidade irrompendo na natureza, descobre-se um ser de tal categoria, que pode constituir um ponto de partida para melhor compreender o Ser de Deus. Deus se revela como um Ser pessoal: três Pessoas em uma única natureza, ele é o mistério supremo e fonte do cristianismo. Isso não significa que a ideia cristã de Deus parta de uma ideia anterior de homem. Ao contrário, uma característica diferencial da cosmovisão cristã se deve ao fato de que Deus se revelou como o Absoluto, infinitamente transcendente a tudo o que existe, a tudo o que é visto e compreendido no universo. Deus é infinito, omnipotente, omnisciente. Deus é O QUE É: a plenitude do Ser, um mar de infinitas perfeições, cada uma delas de grau infinito. Ou seja, Deus não é semelhante a nenhuma criatura, sempre limitado e contingente. No entanto, a revelação divina contém o maravilhoso ensinamento de que Deus criou o homem à sua imagem e semelhança. Além disso, Deus não teve nenhum problema em se tornar homem assumindo uma natureza humana perfeita. O cristão não pensa que o homem é semelhante àqueles deuses que foram inventados no mundo pagão - Zeus, Júpiter, etc. - à imagem e semelhança do homem, com paixões semelhantes ou até mais exorbitantes que as dos humanos; mas o Deus de Moisés, o Deus dos israelitas e dos cristãos diz que criou o homem à sua imagem, à imagem do único Deus, que é puro Espírito.

Essas noções, de alguma forma correlatas, de Deus transcendente e imagem de Deus do homem, fornecem uma avaliação radicalmente diferente do homem e superior a qualquer outra noção meramente racional. O sujeito humano, à luz superior da Revelação divina, aparece com uma dignidade que se eleva acima de todo o universo material. Quando o homem percebe que é uma imagem feita à semelhança da Trindade, é lógico para ele exclamar como Ernest Psichari: "Recebi a formidável permissão de ser homem". Ser homem, ser pessoa, ser, enfim, racional, por mais que a "animalidade" implique, é um dom que nos convida a imitar Deus como seus filhos mais queridos (como diz São Paulo). É compreensível que, com a difusão e o enraizamento do cristianismo pelo mundo, tudo o que contraria a dignidade que se descobre na pessoa tenha desaparecido, ou pelo menos atenuado: os sacrifícios humanos foram desaparecendo (tanto nas religiões do Oriente como naquelas da América antiga), infanticídio, escravidão e muitas formas de injustiça. Em vez disso, multiplicam-se as formas de viver a misericórdia com os mais necessitados e o respeito pela intimidade das consciências. Ao contrário, quando o cristianismo regrediu e a sociedade se paganizou, todas aquelas barbaridades antigas ressurgiram, embora cobertas de novos rótulos de civilização e progresso: dos campos de extermínio nazistas à legalização do aborto forçado..., como se eram ações humanitárias. Essa comparação irrita os abortistas, mas falta-lhes premissas para desqualificá-la. Estamos em um momento difícil, em que ao lado de conquistas óbvias em alguns aspectos e relações sociais, há retrocessos trágicos que não só nos levam de volta às formas bárbaras de exploração do homem pelo homem, mas também afundam e rebaixam a pessoa a limites incríveis .: A manipulação genética -já mencionada- e o tráfico de drogas são exemplos eloquentes da absurda tolerância prática do horrível dentro da sociedade civilizada, vestida de sofisticados formalismos. Digo que todos esses abusos coincidem de forma suspeita com a perda do sentido cristão da vida. Ao negar ou ignorar Deus, você perde de vista o norte, o ponto de referência, o modelo de conduta. E corruptio optimi pessima, a corrupção dos melhores termina na pior das corrupções. A urgência de fazer todo o possível para deter essa onda de degradação do homem, de desprezo prático pela dignidade da pessoa, é óbvia. E um dos meios mais eficazes - embora não seja suficiente

  • é aquele que Schelling apontou em sua juventude: "... o homem cresce na medida em que conhece a si mesmo e a sua própria força. ele realmente é e aprenderá de uma vez por todas o que tem que ser; respeite-o teoricamente, e o respeito prático será uma consequência imediata (...) O homem tem que ser bom teoricamente para se tornar bom também na prática". O homem, por ser pessoa, possui uma excelência verdadeira e insondável, cujos fundamentos pretendemos ver em nosso estudo. E ele tem excelência ou dignidade independentemente de ter ou não consciência disso, e do julgamento que se formou sobre o assunto, porque não é o julgamento do homem que faz a realidade, mas a realidade que fertiliza o pensamento e empresta a verdade aos seus julgamentos. Mas, paradoxalmente, o homem não se conduz tanto pelo que é, mas pela ideia que formou de si mesmo. O homem é de certa forma "causa sui", no sentido de que é ele mesmo, a partir de si mesmo, que tem que desenvolver ativamente suas potencialidades nativas. O homem moderno - apesar das proclamações expressas e repetidas de sua própria dignidade
  • costuma ter um conceito muito baixo de si mesmo e, consequentemente, muitas vezes se comporta com uma vileza inédita. Mas também é verdade que o colapso clamoroso de um determinado ser constitui uma prova irrefutável de sua possível nobreza, tanto maior quanto maior foi sua queda. "Ninguém quer ofender, mas quem pode". Uma pedra não é "cega", pela mesma razão que exclui em