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Tipologia: Notas de estudo
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Revista Brasileira de Ensino de F´ısica, v. 29, n. 1, p. 19-24, (2007) www.sbfisica.org.br
(Relativistic kinematics: twin paradox)
Centro Brasileiro de Pesquisas F´ısicas, Coordena¸c˜ao de Cosmologia, Relatividade e Astrof´ısica, Rio de Janeiro, RJ, Brasil Recebido em 7/8/2006; Aceito em 19/9/
O paradoxo dos gˆemeos foi formulado h´a quase 100 anos atr´as mas ainda hoje ´e um dos meios mais eficazes para compreendermos a essˆencia da dependˆencia no estado de movimento do observador das no¸c˜oes espa¸co e de tempo. Nesta releitura abordamos o paradoxo dos gˆemeos em sua formula¸c˜ao convencional salientando os seus pontos chaves e uma vers˜ao modificada onde consideraremos um universo com dimens˜oes espaciais com- pactificadas. Neste ´ultimo caso ´e poss´ıvel fazer com que os gˆemeos se reencontrem sem que nenhum deles sofra nenhuma acelera¸c˜ao retirando assim a assimetria que convencionalmente ´e atribuida `a resolu¸c˜ao do paradoxo. Em seguida aproveitamos para analisar qual o verdadeiro papel da acelera¸c˜ao e conclu´ımos com uma reflex˜ao sobre a sincroniza¸c˜ao de rel´ogios e com a relevˆancia dos verdadeiros observ´aveis em relatividade restrita. Palavras-chave: epistemologia relativ´ıstica, cinem´atica relativ´ıstica.
The twin paradox was first formulated almost 100 years ago but still nowadays is one of the best ways to present the dependence on the definition of space and time of the state of motion of the observer. In this paper we present the conventional formulation of the twin paradox pointing out some of its key concepts and analyse one of its modification in which we compactify one of the spatial dimensions. Given the compactification, it is no more necessary to accelerate one of the twins to rejoin them. In this way, we circunvent the conventional explanation to the asymmetry between the twins. Following this reasoning, we move to clarify the fundamental role played by acceleration and conclude with some comments on synchronization of clocks and observables in special relativity. Keywords: relativistic epistemology, relativistic kinematics.
O pressuposto newtoniano da possibilidade de se esta- belecer um tempo global ao universo e assim ser ca- paz de descrever a sua evolu¸c˜ao (sua hist´oria) a partir da dicotomia antes/depois ´e uma hip´otese geralmente aceita com facilidade devido a nossa experiˆencia coti- diana de mundo. No entanto, na teoria da gravita¸c˜ao einsteiniana esta hip´otese n˜ao ´e em geral verdadeira para todas as poss´ıveis solu¸c˜oes. Nesta teoria podemos inclusive obter solu¸c˜oes matematicamente corretas mas de dif´ıcil interpreta¸c˜ao f´ısica, como ´e o caso do modelo cosmol´ogico de G¨odel. Em G¨odel existem curvas tipo- tempo fechadas que representam voltas ao passado le- vando a diversos tipos de paradoxos como, por exemplo, a possibilidade de algu´em viajar ao seu passado e matar o seu pr´oprio avˆo. Caso isto fosse poss´ıvel n˜ao conse- guir´ıamos explicar causalmente os eventos subseq¨uen- tes, inclusive o seu pr´oprio nascimento! Mas se por outro lado ele n˜ao nasceu, quem matou o seu avˆo? A teoria da relatividade geral (TRG) foi constru´ıda
por Einstein para compatibilizar a gravita¸c˜ao newto- niana com a sua recente teoria da relatividade, que passou a ser chamada de restrita (TRR) com o advento da TRG. Por´em esse rompimento com o conceito de um tempo global absoluto, caracterizado pelo estabe- lecimento de um agora em todos os pontos do uni- verso independente do observador, j´a se apresenta na pr´opria TRR. Fundamentalmente, o avan¸co alcan¸cado por Einstein e seus contemporˆaneos como Lorentz e Poincar´e se deve ao reconhecimento do papel do obser- vador na descri¸c˜ao f´ısica dos fenˆomenos. A formula¸c˜ao da TRR se deu a partir da modifica¸c˜ao da cinem´atica da teoria mecˆanica para sua concilia¸c˜ao com o eletro- magnetismo. E um fato observacional que a veloci-´ dade da luz no v´acuo em uma regi˜ao onde podemos desprezar efeitos gravitacionais ´e uma constante uni- versal para todos observadores inerciais. Isto quer di- zer que qualquer observador inercial sempre medir´a a velocidade da luz igual a c.^2 Note por´em que isso se torna incompat´ıvel com a hip´otese de que a rela¸c˜ao que conecta dois observadores inerciais seja dada pelas (^1) E-mail: ftovar@cbpf.br. (^2) velocidade da luz c = 2.99792458 x 10 (^10) cm.s− (^1) [1].
Copyright by the Sociedade Brasileira de F´ısica. Printed in Brazil.
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transforma¸c˜oes de Galileu (r′^ = r + Vt) uma vez que a velocidade teria necessariamente que se transformar como u′^ = u + V. Desta forma s´o poderia haver um ´unico referencial onde a velocidade da luz valesse c. Du- rante algum tempo estudou-se a possibilidade de existir um referencial imut´avel chamado ´eter no qual a luz via- jasse com velocidade c. Ao final da an´alise, com a ajuda de dados observacionais como o resultado negativo do experimento de Michelson-Morey [2], a linha argumen- tativa da necessidade de se rever as transforma¸c˜oes de Galileu se mostrou mais condizente e seus avan¸cos de- sembocaram na TRR. A formula¸c˜ao da TRR baseia-se exclusivamente na tentativa de acomodar o fato experimental da constˆancia da velocidade da luz com a equivalˆencia entre observadores inerciais.^3 Note que a ´unica mo- difica¸c˜ao necess´aria para a revolu¸c˜ao mecanicista ´e a maneira pela qual associamos dois observadores iner- ciais, sendo deixados intactos toda a dinˆamica newto- niana, a lei da in´ercia e o papel privilegiado dos obser- vadores inerciais. Por´em o simples fato da dependˆencia de quantidades f´ısicas com o estado de movimento do observador, manifestado nas novas transforma¸c˜oes, ge- rou modifica¸c˜oes dr´asticas nas no¸c˜oes de espa¸co e de tempo. Na vis˜ao newtoniana temos o espa¸co como um ente pleno imut´avel sobre o qual todos os fenˆomenos f´ısicos se desenrolariam. Este espa¸co absoluto seria cont´ınuo e infinito, por´em observadores inerciais seriam incapa- zes de determinar se est˜ao parados ou se movendo com velocidade constante em rela¸c˜ao a este referencial. A ar- gumenta¸c˜ao newtoniana de sua existˆencia se d´a em mo- vimentos circulares onde aparecem naturalmente for¸cas n˜ao-inerciais associadas `a manifesta¸c˜ao emp´ırica de mo- vimentos em rela¸c˜ao ao espa¸co absoluto. Contudo outra linha argumentativa desaprova esta vis˜ao considerando- a excessivamente metaf´ısica. Um dos mais ilustres opo- sitores a esta no¸c˜ao absolutista foi Ernst Mach.[3] Sua vis˜ao relacional considera fisicamente relevante apenas movimentos com rela¸c˜ao a outros corpos materiais, ou seja, a ´unica no¸c˜ao satisfat´oria seria a de movimen- tos relativos. Assim como o espa¸co, o tempo tamb´em assume um papel absolutista na teoria newtoniana. Postula-se que o tempo ´e um fluxo cont´ınuo e cons- tante independente de qualquer outro elemento natu- ral. Nada ´e capaz de alterar a passagem deste fluxo perfeito. Este tempo ´e definido globalmente de forma que possamos atribuir um agora a todos os pontos do espa¸co univocamente a todos observadores inerciais. De acordo com a TRR [4, 5], para compararmos nossas medidas espa¸co-temporais com as de um outro
observador (B) que viaja com velocidade constante em rela¸c˜ao a n´os devemos utilizar as transforma¸c˜oes de Lo- rentz. Sem perda de generalidade podemos assumir que o observador B possuiu velocidade v apenas na dire¸c˜ao ˆx de forma que as transforma¸c˜oes de Lorentz se es- crevem
x′^ = γ
x −
v c t
; y′^ = y ; z′^ = z
t′^ = γ
t −
v c^2 x
; γ =
1 − v 2 c^2
A partir destas transforma¸c˜oes uma s´erie de proprie- dades podem ser demonstradas: nenhum corpo mate- rial pode atingir a velocidade da luz pois para tal seria necess´aria uma quantidade infinita de energia; sendo |v| < c, o fator de contra¸c˜ao de Lorentz definido por γ = ^1 1 − v c^22
´e sempre maior ou igual a 1; devido ao
fator de contra¸c˜ao, o comprimento espacial entre dois eventos^4 depender´a da velocidade do observador sendo menor quanto maior for a sua velocidade;^5 em contra- posi¸c˜ao a contra¸c˜ao espacial, o intervalo de tempo entre dois tiques de um rel´ogio (δt) tamb´em depender´a de sua velocidade por´em neste caso haver´a uma dilata¸c˜ao tem- poral, ou seja, quanto maior a velocidade, maior ser´a o intervalo de tempo entre dois tiques. Estes resultados nos mostram que as pr´oprias de- fini¸c˜oes de espa¸co e de tempo dependem do observa- dor. O que um dado observador chama de espa¸co e de tempo ´e diferente do espa¸co e de tempo de um ou- tro observador que se move com rela¸c˜ao a este. Ade- mais, a no¸c˜ao de simultaneidade, o estabelecimento de um agora, tamb´em depende do estado de movimento do observador, uma vez que a sua constru¸c˜ao deve ser estabelecida atrav´es da sincroniza¸c˜ao de rel´ogios de um mesmo referencial, sendo assim necess´ario abando- nar a no¸c˜ao newtoniana de tempo absoluto. De fato, a constˆancia da velocidade da luz nos imp˜oe o rom- pimento com as no¸c˜oes newtonianas de espa¸co abso- luto e tempo absoluto para uma nova no¸c˜ao quadri- dimensional de um espa¸co-tempo absoluto.
As transforma¸c˜oes de Lorentz possuem uma sime- tria com rela¸c˜ao `a dire¸c˜ao da velocidade do observador. Se invertermos apenas o sentido da velocidade, i.e. con- siderarmos v → −v, as transforma¸c˜oes de Lorentz n˜ao se alteram. Este fato est´a associado com a equivalˆencia entre observadores inerciais. Descrever o afastamento (^3) O termo equivalˆencia aqui ´e usado para dizer que dois observadores inerciais sempre concordar˜ao com a descri¸c˜ao de um dado fenˆomeno. (^4) Evento ´e definido como um conjunto de 4 n´umeros reais designando o tempo e a posi¸c˜ao espacial com rela¸c˜ao a um sistema de referˆencia. Os eventos s˜ao em geral utilizados para especificar algum fenˆomeno f´ısico como por exemplo o choque entre duas part´ıculas. (^5) Por causa da contra¸c˜ao de Lorentz a for¸ca de empuxo depende da velocidade do objeto. Assim poder´ıamos pensar que enquanto para um observador o objeto pode estar em equil´ıbrio com o meio que o permeia para um outro observador se movendo com rela¸c˜ao a este o objeto poderia parecer afundar. Este ´e mais um exemplo de pseudo-paradoxos em relatividade [6, 7].
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diferente sendo menor quanto maior a velocidade do observador. Note que neste caso a simetria entre os observadores ´e mantida ao longo de toda a viagem uma vez que cada um deles permanece em um ´unico referen- cial e pode assim concluir que o outro envelhece mais devagar. Haver´a no reencontro um gˆemeo mais velho do que o outro, ou as transforma¸c˜oes de Lorentz de fato geram paradoxos para universos compactos? Assumamos que o comprimento da circunferˆencia da dimens˜ao compacta seja D. Para o gˆemeo terrestre o tempo de retorno do gˆemeo viajante medido por seu rel´ogio ser´a simplesmente t = D v , onde v ´e a velocidade do gˆemeo viajante. Pelas transforma¸c˜oes de Lorentz, o rel´ogio do gˆemeo viajante dever´a medir t′^ = (^) vγD de modo que o gˆemeo viajante estar´a mais novo por um fator γ. Para calcularmos os mesmos tempos a par- tir da perspectiva do gˆemeo viajante notemos primeiro a diferen¸ca entre a identifica¸c˜ao dos pontos iniciais e finais (Fig. 2).
t
çèæ^ ,÷øö çèæ^ , ÷øö
t’
÷÷ø ö ççè æ (^) , ÷÷ø ö ççè æ (^) ,
G (^) v
(0,0) (0,D)
G (^) v
(0,0)
D v^0
G (^) T
D v D^
D v g 0
D x g D
x’
( v D, D g g)
D v g g D
G (^) T
Figura 2 - Representa¸c˜ao gr´afica das descri¸c˜oes de cada um dos gˆemeos. A figura da esquerda representa a descri¸c˜ao do gˆemeo terrestre com rela¸c˜ao ao seu sistema de coordenadas, enquanto que a figura da direita representa o gˆemeo viajante e sua pr´opria descri¸c˜ao no seu sistema de coordenadas.
Para o gˆemeo terrestre os seus pontos inicial e final assim como de seu gˆemeo s˜ao respectiva- mente [Gti = (0, 0), Gtf = ( D v , 0)
e [Gvi = (0, 0), Gvf = ( D v , D)
, enquanto que para o outro gˆemeo os pontos inicial e final s˜ao [G′ ti = (−Dvγ, Dγ),
G′ tf = ( (^) vγD , 0)
e [G′ vi = (0, 0), G′ vf = ( (^) vγD , 0)
; esse
resultado ´e derivado diretamente das transforma¸c˜oes de Lorentz lembrando-se que estamos considerando uma dimens˜ao compacta com identifica¸c˜ao a cada espa¸camento D. O tempo pr´oprio do gˆemeo viajante ser´a simplesmente (^) vγD enquanto que, devido ao deslo- camento espacial do gˆemeo terrestre, o gˆemeo viajante dir´a que o tempo para o gˆemeo terrestre ser´a √( D vγ
− (D γ)^2 =
v
concordando com o esperado pelo gˆemeo terrestre.
Uma outra maneira de entendermos a assimetria entre os gˆemeos ´e observarmos que, embora ainda haja invariˆancia de Lorentz local, ela ´e globalmente que- brada. Isto ´e f´acil de percebermos pela condi¸c˜ao de identifica¸c˜ao entre os pontos da dimens˜ao compacta. Para o gˆemeo terrestre essas identifica¸c˜oes s˜ao lidas como
(t, x, y, z) ∼ (t, x + nD, y, z) ,
onde n ´e um inteiro. Por´em pelas transforma¸c˜oes de Lorentz para o gˆemeo viajante essas mesmas identi- fica¸c˜oes resultam em
(t′, x′, y′, z′) ∼
t′^ − n
vγD c^2
, x′^ + nγD, y′, z′
o que mostra que os pontos que devem ser identificados no referencial do gˆemeo viajante ocorrem em tempos diferentes. Esta diferen¸ca entre os observadores pode ser medida de maneira absoluta mandando simultane- amente pulsos de luz em ambas as dire¸c˜oes. Apenas um ´unico observador, caracterizado por n˜ao estar se movendo (v = 0), receber´a os dois pulsos simultanea- mente. Qualquer outro observador receber´a primeiro o pulso enviado em sentido contr´ario e depois o emitido no mesmo sentido de sua velocidade. Atrav´es deste exerc´ıcio o observador pode medir a sua velocidade como sendo dada por
v = τ (S+) − τ (S−) τ (S+) + τ (S−)
c ,
onde τ (S+) e τ (S−) s˜ao respectivamente o tempo pr´oprio medido pelo observador entre o momento da emiss˜ao e da recep¸c˜ao dos sinais no sentido de sua ve- locidade e no sentido contr´ario.^10 Este ´e um exemplo interessante de como proprie- dades globais do espa¸co-tempo podem interferir na f´ısica local. Neste caso a compactifica¸c˜ao acarreta a sele¸c˜ao de um referencial especial, a saber, aquele no qual o comprimento da dimens˜ao compacta ´e o maior poss´ıvel. Mesmo mantendo a invariˆancia local das transforma¸c˜oes de Lorentz, referenciais que se movem com velocidade constante com rela¸c˜ao a este referencial privilegiado n˜ao s˜ao equivalentes e de fato ´e poss´ıvel, experimentalmente, distingu´ı-los.
O intuito deste trabalho ´e realizar o aprendizado que os pseudo-paradoxos associados a cinem´atica rela- tiv´ıstica nos ensinam. J´a vimos como situa¸c˜oes
a pri- meira vista equivalentes podem apresentar diferen¸cas sutis, por´em fundamentais entre dois observadores. (^10) Embora correto, na pr´atica este procedimento ´e invi´avel uma vez que poderia ser necess´ario esperar um tempo da idade do uni- verso para o retorno do sinal emitido. No entanto, existe experimentos locais poss´ıveis para a determina¸c˜ao da velocidade absoluta do observador [9].
Cinem´atica relativ´ıstica: paradoxo dos gˆemeos 23
Nesta se¸c˜ao o enfoque ´e tentar esclarecer qual o ver- dadeiro papel da acelera¸c˜ao na diferen¸ca do envelheci- mento entre os dois gˆemeos.
Relembrando o paradoxo original, as explica¸c˜oes da inequivalˆencia entre os dois gˆemeos s˜ao em geral atribu´ıdas ao fato de que enquanto um dos gˆemeos per- manece no mesmo referencial, a saber o terrestre, seu irm˜ao ´e for¸cado, atrav´es da acelera¸c˜ao necess´aria para possibilitar o seu retorno, a uma mudan¸ca cont´ınua de referenciais inerciais. Devido `a equivalˆencia entre refe- renciais inerciais, a percep¸c˜ao da passagem do tempo assim como toda descri¸c˜ao f´ısica ´e indistingu´ıvel para ambos os gˆemeos. Todavia, poder´ıamos nos perguntar em que instante, ou melhor, durante qual per´ıodo da viagem os gˆemeos envelhecem de maneira diferente.
Uma resposta ingˆenua e imediata seria atribuir a acelera¸c˜ao a responsabilidade do envelhecimento d´ıspar. Na literatura, principalmente em livros-texto para n˜ao- especialistas, ainda ´e frequente tal erro. Um argumento simples rompe com tal interpreta¸c˜ao. Considere duas situa¸c˜oes: a primeira, o gˆemeo viajante viaja com velo- cidade constante durante 1 ano marcado em seu rel´ogio at´e o momento em que ´e acelerado e em seguida re- torna. Na segunda situa¸c˜ao, o gˆemeo viajante viaja com a mesma velocidade que a anterior por´em por apenas 1 dia marcado em seu rel´ogio, e em seguida, sofrendo a mesma acelera¸c˜ao, retorna
a Terra. E claro que no´ segundo caso a diferen¸ca de idade ser´a menor. Um c´alculo rigoroso, por´em simples, nos mostra que a di- feren¸ca de idade ´e proporcional ao tempo de viagem despendido com velocidade constante, e n˜ao ao per´ıodo de acelera¸c˜ao.
Na literatura [11-14] pode-se encontrar diversos exemplos muito instrutivos do ponto de vista acadˆemico tentando justamente tirar da acelera¸c˜ao a causa do en- velhecimento. Como exemplo citamos o caso onde dois gˆemeos s˜ao ambos acelerados cada um em sua espa¸co- nave as quais s˜ao completamente equivalentes inclusive na quantidade de combust´ıvel. Na condi¸c˜ao inicial am- bos est˜ao vinculados a um mesmo referencial com seus rel´ogios sincronizados da maneira convencional de Eins- tein sendo a ´unica diferen¸ca entre eles as suas posi¸c˜oes iniciais. Um observador que permane¸ca neste mesmo referencial inercial descrever´a de forma equivalente a viagem de ambos, concluindo que a distˆancia que os separa ´e igual
a diferen¸ca inicial e que n˜ao houve dife- ren¸ca de envelhecimento. Contudo para os gˆemeos, ao t´ermino do combust´ıvel, quando ambos viajam com a mesma velocidade constante, o gˆemeo posicionado mais a frente com rela¸c˜ao
a dire¸c˜ao da acelera¸c˜ao estar´a mais velho! Neste caso fica claro que n˜ao pode ter sido a acelera¸c˜ao a causa do envelhecimento visto que ambos sofrem a mesma acelera¸c˜ao. Sabemos que observado- res n˜ao-inerciais, ao contr´ario dos inerciais, n˜ao con- seguem sincronizar rel´ogios em posi¸c˜oes diferentes, de forma que, embora os r´elogios dos gˆemeos estivessem sincronizados antes do come¸co da viagem, ao serem ace-
lerados, a separa¸c˜ao espacial dos gˆemeos nos impossibi- lita de continuarmos considerando seus rel´ogios sincro- nizados. Para novamente compararmos seus rel´ogios precisamos fazer com que os gˆemeos se reencontrem num mesmo ponto, ou seja, ´e preciso levarmos um dos gˆemeos ao encontro do outro. Esta ´ultima etapa res- ponde pela assimetria entre os gˆemeos.
A concep¸c˜ao espa¸co-temporal sens´ıvel das pessoas ´e constru´ıda a partir das suas experiˆencias cotidianas. As no¸c˜oes assim desenvolvidas condizem com a f´ısica pr´e-relativ´ıstica justamente por ser esta a sua faixa de aplicabilidade. Um dos obst´aculos mais altos a serem ultrapassados no entendimento da TRR ´e deixarmos de pensar de um modo cl´assico. A epistemologia da TRR nos ensinou a relatividade de conceitos antes to- mados como globais e absolutos. Uma das quest˜oes mais importantes ´e a dependˆencia no estado de movi- mento do observador das no¸c˜oes de tempo e espa¸co. Ademais, o processo de sincroniza¸c˜ao de rel´ogios pas- sou a ser um ponto crucial. Considero pessoalmente que este ponto ´e a quest˜ao chave para entendermos uma s´erie de pseudo-paradoxos temporais. Primeira- mente devemos novamente destacar que observadores n˜ao-inerciais n˜ao s˜ao capazes de sincronizar rel´ogios em pontos diferentes do espa¸co, ou seja, para estes obser- vadores, rel´ogios inicialmente sincronizados por´em em pontos diferentes do espa¸co perder˜ao gradativamente a sincroniza¸c˜ao [13-17]. A outra quest˜ao diz respeito ao m´etodo de sin- croniza¸c˜ao [18, 19]. Ainda ´e debate na comuni- dade cient´ıfica se de um ponto de vista experimental ´e poss´ıvel verificar a isotropia da velocidade da luz [20-25]. Suponha um experimento onde um raio de luz ´e emitido em uma dada dire¸c˜ao e que haja um anteparo que reflita a luz de volta a origem. A quest˜ao ´e saber se ´e poss´ıvel afirmar que a luz leva o mesmo tempo para a viagem de ida quanto para a de volta, ou se isto nada mais ´e do que uma mera conven¸c˜ao e como tal n˜ao carrega nenhum significado f´ısico. Com rela¸c˜ao
a formula¸c˜ao original do paradoxo dos gˆemeos, Debs e Redhead [26] demonstraram que ´e poss´ıvel escolher v´arios poss´ıveis m´etodos de sincro- niza¸c˜ao que nos fornecem corretamente a mesma res- posta ao paradoxo. Esse trabalho ´e de especial im- portˆancia pois demonstra a inadequa¸c˜ao de perguntas como: durante qual momento da viagem o gˆemeo ter- restre envelheceu mais r´apido? Este tipo de pergunta n˜ao faz sentido pois n˜ao carrega em si nenhum signi- ficado f´ısico. Existe mais de uma resposta consistente com a f´ısica do problema. Esta liberdade possui uma analogia com a liberdade de calibre. Em teorias de cali- bre a quantidade de vari´aveis dinˆamicas utilizada para a descri¸c˜ao de um sistema f´ısico est˜ao em excesso, sendo